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G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 11. Psicologia Social

IDENTIFICAÇÃO E DESCRIÇÃO DE PRÁTICAS HUMANAS E DE ORGANIZAÇÕES RELEVANTES PARA CONSTRUÇÃO DA ECONOMIA SOLIDÁRIA COMO RELAÇÕES COMPORTAMENTAIS

Ana Lucia Cortegoso 1
(1. Departamento de Psicologia da Universidade Federal de São Carlos/DPsi-UFSCar)
INTRODUÇÃO:

A Economia Solidária, como movimento que agrega diferentes atores comprometidos com a produção de novas formas de relação do homem com seu ambiente, relações estas referentes não apenas à situação de trabalho e com objetivos imediatos de geração de renda, mas à construção de uma nova cultura, pode ser compreendida como um produto agregado das práticas destes diferentes atores. O conceito de metacontingências constitui ferramenta potencialmente relevante para auxiliar na compreensão do que compõe, hoje, este movimento, bem como para identificar práticas desejáveis para alcançar os objetivos propostos para a Economia Solidária e relações significativas destas práticas entre si e com o produto final. Que comportamentos fazem ou devem fazer parte da rede de relações comportamentais cujo produto comum, e em longo prazo, é a Economia Solidária, relevantes para gerar práticas culturais relativas ao trabalho que privilegiem a cooperação, distribuição eqüitativa dos benefícios do trabalho e relação menos predatória do homem com seu ambiente, inclusive social? Identificar e descrever, como relações comportamentais, classes de comportamentos de atores relevantes no âmbito da Economia Solidária, no Brasil, e nesta etapa de organização do movimento, a partir da experiência de uma incubadora universitária de empreendimentos solidários, no seu trabalho cotidiano e na sua relação com os outros atores do movimento, constituíram objetivos para este trabalho.

METODOLOGIA:

A partir da observação de comportamentos e de relatos em situações de trabalho coletivo em uma incubadora universitária (reuniões de equipe e de membros desta equipes com membros de empreendimentos solidários), de iniciativas diversas de Economia Solidária (reuniões de incubadoras, fóruns de economia solidária etc), de supervisão e orientação de alunos, da consulta a documentos sobre atividades de alunos e da equipe (relatórios, atas de reuniões etc) e literatura, foram obtidas informações indicativas de classes de comportamentos de atores da Economia Solidária. Tais informações, registradas de modo contínuo em cadernos de campo, faziam referência a estímulos antecedentes, respostas ou estímulos subseqüentes componentes destes comportamentos. A partir delas, foram produzidas, diretamente pela autora ou por ela a partir de versões elaboradas por alunos, sob sua supervisão, descrições destas relações comportamentais evidenciadas como relevantes, com base no conceito de comportamento, implicando em explicitação de elementos da relação não indicados diretamente pelas fontes utilizadas, mas que podiam ser supostos a partir dos elementos especificamente identificados. Exames coletivos das formulações propostas para tais classes de comportamentos, com participação de membros da equipe componente da incubadora, possibilitaram conferir, completar e corrigir formulações, até chegar ao produto aqui apresentado.

RESULTADOS:

Foram descritas 16 classes de comportamentos da incubadora, representativas do método de incubação implementado no âmbito desta unidade de fomento à Economia Solidária, tais como: processar demanda apresentada por diferentes atores sociais para incubação de empreendimentos solidários, apresentar Economia Solidária como possibilidade de organização para geração de trabalho e renda, para população ou grupo em potencial para formar empreendimentos solidários, promover formação dos membros do grupo para o cooperativismo de forma contínua e permanente, de todas as maneiras possíveis, promover elaboração de normas de funcionamento do empreendimento (estatuto e regimento interno), de maneira participativa, assessorar grupo para participação em redes de cooperação e em iniciativas do movimento de Economia Solidária. Foram identificadas e descritas, também, classes de comportamentos de empreendimentos solidários, relativos à proposição, planejamento, implantação, implementação de empreendimentos solidários e sua inserção no sistema mais amplo da Economia Solidária. Deste processo resultaram, ainda, descrições de comportamentos de indivíduos, membros de empreendimentos solidários (relativos às esferas profissional, administrativa, de comunicação, motivação para o trabalho e trabalho coletivo), mediadores do processo de incubação (como agentes educativos e assessores) e de consumidores em geral, considerados como relevantes para o processo de construção da Economia Solidária.

CONCLUSÕES:

A descrição de comportamentos como relações entre o que faz um organismo e o ambiente em que a ação ocorre, corresponde a uma estratégia para operacionalização de princípios que constituem referencial para indivíduos e organizações que se comprometem com a Economia Solidária. Uma estratégia que apresenta, como benefícios importantes, a possibilidade de construção coletiva, a objetividade que torna possível avaliar impactos efetivamente alcançados da apresentação destas classes de comportamentos para os resultados pretendidos e, talvez fundamentalmente, crescente visibilidade sobre o papel do fazer humano, individual e coletivo, para a produção das mudanças necessárias para a construção de uma sociedade mais justa e equilibrada. Tanto quanto para a compreensão de que esta sociedade que se deseja mudar, por não atender às necessidades mesmo básicas de grande parte da humanidade é, também ela, resultado de condutas humanas de muitas gerações, mas mantidas por nossa própria conduta ao decidir que conhecimento produzir e a quem torná-lo acessível. O produto deste estudo, como sistematização de atividades no âmbito de uma agência universitária com estes objetivos, representa contribuição para compreensão sobre objetos de interesse para Psicologia e para Economia Solidária, constituindo ponto de partida para produzir variabilidade comportamental a partir da crítica e da investigação sistemática da pertinência das classes de comportamentos propostas.

 
Palavras-chave: economia solidária; classes de comportamentos; incubação de empreendimentos solidários.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006