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G. Ciências Humanas - 5. História - 11. História
CRUZETA REVELADA: UMA LEITURA DA CIDADE NA FOTOGRAFIA DE INÁCIO RODRIGUES NAS DÉCADAS DE 1950 - 1960.
Rosenilson da Silva Santos 1
Eugênia Maria Dantas 1
(1. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN)
INTRODUÇÃO:

A cidade é uma história narrada em uma linguagem plural, em um idioma interdisciplinar; um texto “incoerente” que dissolve e materializa sonhos, páginas de arquiteturas geométricas e cartografias de subjetividades, ocultas e reveladas em suas formas e traçados. Interessados em um passeio epistemológico por este espaço de todos e de ninguém, onde o social se manifesta na sua forma mais complexa, nos direcionamos no sentido de fazer a sua leitura a partir da questão: o que é a cidade recortada na fotografia? Compreender as nuanças deste texto, como ele é dito e escrito na fotografia, seus contornos, as marcas dos indivíduos e de sua escrita é a nossa pretensão. Para tanto, nos centramos em um lugar, nos aproximamos de sujeitos e traçamos um trilha de sinuosidades e encantos. Nosso cenário é a cidade norte-rio-grandense de Cruzeta, nossa lente é a fotografia do Senhor Inácio Rodrigues, artesão que esculpiu em luz e sombra tal recanto no período de 1950 a 1960, nosso recorte temporal. A cidade revelada na fotografia, blindada por silêncios que nos coagem, por sons que nos surpreendem foi nosso banquete, regado, de observações, conquistas e problematizações. Nesta perspectiva, a cidade se constitui paulatinamente enquanto uma paisagem observável na imagem, a fotografia se sedimenta como fonte, como corpo de informação visual e social, dignos de voz e verbo a cada trabalho que a problematiza como tal.   

METODOLOGIA:

O percurso de uma pesquisa e o seu desfecho são marcados pelas sendas que se optam trilhar. Na aventura de buscar respostas às nossas inquietações, tais como a cidade supracitada é revelada na fotografia, iniciamos pela visita ao lugar que foi fotografado por Inácio Rodrigues. Fomos munidos de uma roupagem teórica que nos orientou por quais vias nosso trabalho seria viabilizado, assim, Raquel Rolnik nos disse o que era cidade além daquilo que já sabíamos, Lígia M. T. Silva, discorreu sobre a fotografia e sua monumentalidade, como também sua “documentalidade”, junto a eles, Ronald Raminelli, Armando Martins de Barros formaram nossa indumentária bibliográfica. Em campo, fizemos o contato com o fotógrafo e seu acervo, nos familiarizamos com eles, travamos diálogos, conversas, fizemos a memória aflorar, na voz de seu Inácio e no espectro estético da fotografia. Desta forma, as fotos foram provisoriamente cedidas para integrar o banco de imagens do Projeto “Fotografia e Complexidade”, do qual, nossos exercícios são fruto. O processo de digitalização aconteceu ora a passos lentos, ora não. Observar nos atava, nossas incógnitas nos incomodavam, nossos objetivos se delineavam, conforme vigiávamos as imagens.

RESULTADOS:

Repensada a postura metodológico-positivista, que privilegiava como fonte os documentos escritos e produzidos oficialmente pelo estado que relatavam a trajetória e os grandes feitos dos heróis da história de forma objetiva e irrefutável, novas maneiras de tratar as fontes e os objetos fazem com que estes últimos apareçam com novas fisionomias nas páginas da história, novos contornos nos mapas da geografia. Hoje os estudiosos lançam olhares sobre os censos, livros paroquiais, listas telefônicas, registros civis para enxergar a cidade em suas diversas faces. Tratar a fotografia como documento e considerar a informação visual como um texto é romper com a tradição historiográfica positivista de privilégio as fontes escritas e fazer a iconografia emergir dos mundos dos anexos e apêndices dos trabalhos acadêmicos. O acervo de seu Inácio Rodrigues que por nós foi vislumbrado é constituído por mais de trezentas imagens, fotos que revelam a cidade em múltiplas cores, seu desenho geográfico, os atores que fazem de seus espaços o palco da vida, os eventos de ordem religiosa, cívica e política que dão movimento ao social. A fotografia dá a impressão de guardar a cidade em sua totalidade, ao mesmo tempo em que é registro de suas partes, de suas ruas, das pessoas, suas casas, a festa, o político e seus eleitores, do desfile cívico daqueles que estudam, do agricultor que a sala de aula foi a vida, da água e da seca.

CONCLUSÕES:

A fotografia tem uma linguagem própria, segundo Silva, de natureza plástica, que modela o que retrata em um reflexo congelado, mas que guarda o movimento; tem o poder de reproduzir o que o “artesão da luz” idealiza. A cidade é percebida como superfície de inscrição das produções humanas que pode ser observada em sua complexidade, através de inúmeros primas. A poética da imagem revela informação e emoção, por meio de um prazer quase nostálgico. Cruzeta na fotografia se mostra em um mosaico, composto de formas, cores e movimentos múltiplos, retratando o novo, na arquitetura que ergue a cidade em uma “natureza fabricada”, que afirma Rolnik, ser quase perene, ainda que ameaçada pela corrosão que emana do humano, na fotografia, essa natureza é tatuada na folha amarelada, em uma eternidade sensível. A cidade é templo da fé, a procissão abre suas entranhas, as ruas são percorridas pelos atores sociais, ela é esquartejada por estradas e pontes que levam os sujeitos para outros lugares, as mesmas que permitem a volta ao seu lugar. O preto e branco comportam o verde das plantações, o azul dos “mares” de água doce, que enchia os açudes e trazia a felicidade às pessoas. Algumas ruas largas se insinuam na imagem, talvez uma tímida respiração de modernidade que soprava ali, outras se deitam estreitas, ventos da tradição que ainda pairam na paisagem. Assim a cidade é-nos revelada na fotografia, fornalha de impressões, pluralizada pelos gestos de seus homens.

Instituição de fomento: PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO - PPPG
Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: CIDADE; FOTOGRAFIA ; CRUZETA.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006