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F. Ciências Sociais Aplicadas - 4. Direito - 9. Direito Penal

APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA INSIGNIFICÂNCIA E DA INTERVENÇÃO MÍNIMA DO DIREITO PENAL NO CRIME DE DESCAMINHO

Larissa Fontes de Carvalho Torres 1
Alexandre José da Paz 1
Daniel Siqueira Levis 1
Flávio Henrique de Oliveira Nóbrega 1
Rochester Oliveira Araújo 1
Fabiano André de Souza Mendonça 1
(1. Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN)
INTRODUÇÃO:

O presente trabalho de pesquisa visa a conhecer e analisar a aplicação dos princípios da insignificância e da intervenção mínima, próprios do Direito Penal, em especial no que atine ao crime de descaminho previsto no art. 334 do Estatuto Punitivo, no Superior Tribunal de Justiça e nos Tribunais Regionais Federais, objetivando a identificar qual o limite considerado para que o não pagamento de tributo devido pela entrada, uso ou saída de mercadoria do território brasileiro seja considerado criminalmente relevante, observando-se, especialmente, se estes limites coincidem com aqueles balizados pelo legislador para as esferas cível ou administrativa. Desse modo, seguindo os princípios em questão, os quais prelecionam, em síntese, que a irrelevante lesão a um bem jurídico, ainda que protegido, nem sempre justifica a imposição de uma sanção penal, devendo ser excluída a tipicidade em situações que afetem de maneira ínfima um bem jurídico-penal, questiona-se se quando se tratar de crime de descaminho em que o valor do tributo que deixou de ser recolhido ao Erário for inferior àquele exigível pela Administração Fazendária por meio de execução fiscal deveria incidir a norma sancionadora penal.

METODOLOGIA:

O trabalho foi desenvolvido através de método teórico descritivo em que se analisaram posicionamentos doutrinários sobre a adequação dos princípios da insignificância e da intervenção mínima ao crime de descaminho, as mais recentes alterações legislativas no âmbito tributário, quais sejam as leis 9.469/97, 10.522/02 e 11.033/04, que dispunham sobre limites para execução, arquivamento e extinção de débitos fiscais e os seus reflexos na aplicação da lei penal pelo Superior Tribunal de Justiça e Tribunais Regionais Federais a partir de amostragem de julgados obtida em consulta jurisprudencial.

RESULTADOS:

Observaram-se divergências na aplicação pelas Cortes pátrias dos princípios penais acima consignados. Ora se entende que a fronteira para a consideração da insignificância do tributo não pago coincide com aquela em que é inexigível para fins de execução fiscal, ora que deve ser condizente com o limite em que, na esfera administrativa, pode ser suspenso o processo de cobrança, arquivando-se os autos da ação de execução fiscal e, em conseqüência, preterindo-se a possibilidade de ressarcimento ao Erário. Desse modo, enquanto esteve em vigor a lei nº 9.469/97,consideraram os tribunais como sendo mil reais o liame para aplicação do princípio da insignificância. Em seguida, com a superveniência da Lei 10.522/02, as cortes que, até então, consideravam que o simples arquivamento do processo, sem perdão da dívida pelo credor, não implicava desconsideração do fato pelo Direito Penal, aplicando o princípio da insignificância quando o valor devido não superasse cem reais, cambiaram o entendimento para considerar irrelevantes criminalmente as situações em que o Estado dispensasse a movimentação da máquina administrativa para recuperar seus créditos, fosse através do cancelamento da inscrição ou do arquivamento da ação. Por fim, a Lei nº 11.033/04 provocou, novamente, mudança de posicionamento nos Tribunais, que, considerando expressivo o novo montante, voltaram a rechaçar o princípio da intervenção mínima nos casos de descaminho em que o tributo suplantasse o montante de R$ 100,00.

CONCLUSÕES:

O atual entendimento esposado pelo STJ, quanto à redução do limite de aplicação do princípio da insignificância, confronta-se com o próprio fundamento da intervenção mínima, no sentido de que o desprezo pela esfera cível dos débitos tributários que tivessem sua execução arquivada a pedido da Fazenda Nacional implica a desnecessidade de atuação do Direito Penal, porquanto deve ser este provocado somente quando as demais esferas demonstrarem-se ineficazes. Assim, ainda que se considere elevado o valor desenhado pela norma mais recente, não há que restar outro entendimento senão o de que, não sendo necessária a movimentação da máquina administrativa para recuperar os créditos não arrecadados em virtude do crime de descaminho, este fato é igualmente irrelevante para o Direito Criminal, que só se justifica como última esfera de atuação estatal. Destarte, conclui-se pela existência de estreita vinculação entre os limites estabelecidos para a inexigibilidade do débito através de procedimento de execução fiscal, dispensados por cancelamento ou por arquivamento, e a intervenção do Estado através da tutela penal, de modo que, atualmente, com a norma insculpida na Lei nº 11.033/04, o não pagamento de tributos até o montante de dez mil reais em decorrência do crime de descaminho será fato considerado irrelevante para o estatuto punitivo, faltando-lhe a lesividade essencial à caracterização do tipo penal em comento.

 
Palavras-chave: Crime de descaminho; Princípio da intervenção mínima do Direito Penal; Princípio da insignificância.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006