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H. Artes, Letras e Lingüística - 1. Artes - 3. Cinema

LOCAL E GLOBAL NO CINEMA MATO-GROSSENSE DOS ANOS 90

Diego Baraldi de Lima 1
Mario Cezar Silva Leite 2
(1. Mestrado em Estudos de Linguagem, Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT; 2. Prof. Dr. Mestrado em Estudos de Linguagem, Inst. de Linguagens - UFMT (orientador))
INTRODUÇÃO:

Através da análise do curta-metragem “A Cilada com Cinco Morenos” (MT, Luiz Borges, 1998, 15’), esta pesquisa faz uma investigação de como elementos pertencentes ao local (aqui delimitado à cidade de Cuiabá, Mato Grosso, e seus arredores), são representados nesta obra cinematográfica. Utilizando os conceitos de função sacralizante/dessacralizante da literatura, apresentados por Zilá Bernd em “Literatura e Identidade Nacional”, para se referir às maneiras com que a busca por definição identitária são desenvolvidas na literatura brasileira, propõe-se identificar as possibilidades de diálogo e tensão entre elementos que remetem ao local e ao global, entendendo o curta-metragem analisado enquanto materializador de uma série de discursos sobre o local, que são veiculados em outras expressões culturais, como a música, as artes plásticas, o teatro, etc, porém não se fechando nestes discursos, mas sim construindo novos discursos que reelaboram o local.

METODOLOGIA:

A abordagem metodológica proposta foi baseada na pesquisa qualitativa, majoritariamente bibliográfica. A análise do curta-metragem foi desenvolvida de acordo com características formais e conteudísticas do filme. Previamente a esta análise, o filme foi assistido consecutivas vezes e, com base no que propõem Francis Vanoye e Anne Goliot-Lété, desenvolveu-se uma descrição apurada de todos os planos que compõem o filme. Cada plano foi cronometrado, tendo sido observado o enquadramento ou movimento de câmera realizado, a descrição da ação realizada no plano e de seu conteúdo sonoro. Como características formais, foram observadas as maneiras com que o filme se apresenta em sua divisão de planos, opções de enquadramento, padrões estéticos, efeitos obtidos pela montagem e som. Para tanto, foi utilizada basicamente a abordagem apresentada por Jacques Aumont em “A Estética do Filme”. Como características conteudísticas, foram utilizados alguns trechos do curta-metragem, tentando evidenciar o diálogo que este estabelece entre o local e o global, objeto da pesquisa, ou seja, os momentos em que o filme “diz coisas” sobre o local e momentos em que, mesmo tratando de temas, cores e paisagens locais, consegue transcendê-lo, colocá-lo em discussão.

RESULTADOS:

A análise formal evidenciou a intertextualidade de gêneros presentes no curta-metragem, que mistura ficção e documentário, em uma narrativa onde, apesar de ficcionalizada, a parte documental é narrada e representada por personagens que viveram as histórias contadas (neste caso, o grupo musical Cinco Morenos). A análise conteudística evidenciou a carga de elementos semióticos que se referem ao local/regional, a oposição entre a cidade (Cuiabá, lugar da urbanidade, da correria, do estrangeiro) e o interior (Chapada dos Guimarães, Souza Lima, Santo Antônio do Leverger, espaços telúricos, lugares da tradição, da valorização da cultura e do saber popular). Entender estes elementos e estas oposições é remontar a uma série de discursos desenvolvidos no campo das artes plásticas, da música e da literatura, a partir dos anos 70, que acabaram “sacralizando” uma imagem, uma idéia do “ser cuiabano”, da “cuiabania”. A trilha sonora também evidencia a tensão entre o local e o global, ao utilizar-se de músicas que misturam o rock com o rasqueado (ritmo musical tipicamente cuiabano). O filme articula ainda um discurso crítico em relação à manipulação de artistas populares locais (da região cuiabana) por políticos, que se utilizariam da valorização da cultura local para conseguir votos e aceitação popular.

CONCLUSÕES:

A análise de alguns elementos presentes no curta-metragem aponta que o cinema mato-grossense dos anos 90 procura, através de suas narrativas, pensar o local e também inserí-lo no global, de modo a cristalizar idéias que fazem parte daquilo que podemos chamar de “identidade local”, mas também de propor rupturas àquilo que se apresenta enquanto constitutivo desta identidade, rompendo paradigmas e “pensando” as próprias idéias de identidade e região. A pesquisa evidencia que, mesmo dentro de um cenário basicamente caracterizado pelas idéias de globalização e indústrias culturais, características marcantes da fase atual do capitalismo, a produção audiovisual mato-grossense caracteriza-se pelo discurso que evidencia e, em alguns casos, glorifica os elementos culturais regionais, característica que pode tanto ser entendida enquanto resistência à idéia de mundialização da cultura quanto reação às possibilidades de diálogo com outras culturas, através de discursos que negam o outro e fecham-se sobre si mesmos. 

Instituição de fomento: CAPES
 
Palavras-chave: cinema; produção cinematográfica; regionalização de conteúdos audiovisuais.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006