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G. Ciências Humanas - 9. Sociologia - 6. Sociologia Urbana

APONTAMENTOS PARA O ESTUDO DE SOCIABILIDADES SINGULARES EM SÃO LUÍS, INÍCIO SÉCULO XX

Paulo Roberto Pereira Câmara 1
Keyne Conceição Marques Silva 2
Renato Kerly Marques Silva 1
Inaê dos Santos Martins 1
José Silva Queiroz 1
(1. Universidade Federal do Maranhão; 2. Universidade Estadual do Maranhão)
INTRODUÇÃO:

No início do século XX, o Maranhão sentia ainda as conseqüências das transformações sofridas no período da virada do século. Compõem esse contexto, dentre outros fatores, a abolição da escravidão, a Proclamação da República e a crise da economia agro-exportadora, local, de algodão e açúcar.

A cidade de São Luís funciona como um espelho que reflete as mudanças mais importantes desse momento, representando o local das discussões, o palco das ações e o cenário das transformações empreendidas.

Esta pesquisa visa analisar o embate entre a imposição de um modelo civilizatório pela elite local e a resistência, consciente, ou não, de uma parcela da população, a tal projeto. Assim, a partir do resgate das práticas e representações sociais desses sujeitos, pretende-se refazer as trajetórias de vida, de indivíduos e grupos, que se deram no convívio/conflito pelas ruas e becos da cidade.

Outrossim, busca-se investigar o processo social de produção do discurso oficial e os mecanismos de disciplinamento e controle das formas de sociabilidades singulares. Compreende-se como tais formas, as manifestações culturais e as relações sociais da população pobre, analfabeta constituída, em sua maioria, de negros, ditos negros, quase negros.
METODOLOGIA:

Buscando compreender as práticas sociais desses sujeitos, suas formas de sociabilidades, e o discurso oficial produzido sobre os mesmos, adotamos como método de abordagem a Análise de Discurso. Corroboramos com a idéia de CHARTIER (1998), de que nenhum discurso é neutro e que este obedece sempre ao interesse de quem os forja. Dessa forma, analisamos de que modo os discursos são forjados e como estes são significados pelo corpo social. Utilizamos, para tanto, uma diversidade de fontes, a saber, jornais, obras literárias, relatórios médicos, autos de polícia, códigos de postura etc.

RESULTADOS:

Nesse momento, São Luís vive um processo de modernização urbana e de implantação de novos modos de vida. Tal projeto foi imposto pela classe dominante que pretendia adotar aqui o modelo de civilização européia, sobretudo, do Francês para adquirir foro de cidade civilizada. Com esse intuito, foi realizada uma série de melhoramentos urbanos e criado códigos de posturas visando disciplinar corpos e mentes. Contudo, tal projeto encontrou resistência da população, fato que se justifica pela quantidade de prisões, por desrespeito a essas novas regras de convívio social, tais como: embriaguez, batucada, banhos nos chafarizes públicos, entre outros.

Tomando o espaço urbano como palco de expressão de suas formas de sociabilidades, tais sujeitos sociais ganhavam uma visibilidade que foi normalmente tida como incômoda e indesejada por parte da classe dominante e, por isso, deveria ser afastada ou destruída. Ao se apropriarem de ruas, logradouros, praças e demais espaços públicos, bem como ao ocuparem locais como cortiços e baixos de sobrados, estes personagens acabavam por ser o alvo preferido das políticas disciplinares, levadas a cabo pelas autoridades estaduais e municipais no anseio de adquirir “fumos” de cidade civilizada.

CONCLUSÕES:

Houve sempre uma margem para que as classes pobres pudessem se manifestar. Assim, temos como exemplo os batuques dos negros que foram proibidos pelos Códigos de Posturas Municipais e que continuaram sendo realizados numa cena de resistência ao projeto civilizatório que pretendia silenciá-los.

Constatamos que, apesar do desejo da classe dominante de adequar os costumes locais aos padrões sócio-culturais europeus e do empenho das autoridades oficiais de fazer valer todas as leis criadas com esse propósito, tal projeto foi malogrado. Haja vista, a ineficiência da polícia em fiscalizar e garantir o cumprimento de todas as leis aprovadas pelo governo visando a manutenção da ordem pública.

Percebe-se que, a modernização dos cenários centrais da cidade - implantação dos serviços de água, esgoto, limpeza e iluminação pública - fez-se acompanhar por uma multidão indisciplinada em seus meios de vida e expressões culturais, população essa em boa parte fruto do êxodo rural provocado pelo fim da ordem escravocrata e que não se enquadrou no modelo homogeneizador da elite econômica que desejava transformar São Luís em uma cidade “civilizada”.

Dessa forma, tais sujeitos continuaram a transitar pela cidade, transgredindo regras e conflitando com a lei; por isso, foram normalmente taxados pelo discurso oficial como indisciplinados e perigosos. Assim, suas vivências e sociabilidades tornaram-se o alvo principal das políticas disciplinares do Estado.

 
Palavras-chave: Sociabilidades; São Luís; Pobres Urbanos.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006