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G. Ciências Humanas - 9. Sociologia - 1. Sociologia da Saúde

A PERCEPÇÃO DO MÉDICO CLÍNICO EM RELAÇÃO AOS PACIENTES HIPOCONDRÍACOS E  POLIQUEIXOSOS QUE SÃO ATENDIDOS NO AMBULATÓRIO DO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO PROFESSOR POLYDORO ERNANI DE SÃO THIAGO

Silvia Jurema Leone Quaresma 1
(1. Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC)
INTRODUÇÃO:

Esta pesquisa se realizou no ano de 2004 e com ela foi possível analisar qual a percepção médica em relação aos pacientes hipocondríacos e poliqueixosos que transitam pelo ambulatório do Hospital Universitário Professor Polydoro Ernani de São Thiago (HU), localizado na cidade de  Florianópolis (SC).

Considerou-se relevante conhecer o processo de hipocondria e poliqueixas que se encontram presentes no HU para que no futuro possa haver um planejamento para atendimento deste tipo de paciente, pois, avalia-se que  tanto o hipocondríaco quanto  o poliqueixoso, mesmo sendo doentes atípicos, têm direito a tratamento no sistema de saúde público.

Por não haver no HU qualquer tipo de estatística ou até mesmo de triagem quanto a estes pacientes pesquisados investigou-se esses  problemas com médicos, de ambos os sexos, especializados em clínica médica, pois, são esses profissionais da saúde que, geralmente, tanto o paciente hipocondríaco quanto o poliqueixoso pedem ajuda inicialmente.

Além dos médicos clínicos optou-se por realizar a pesquisa também entre os residentes em clínica médica para que fosse possível obter dados complementares para a pesquisa, como por exemplo: em quais disciplinas do curso de Medicina são abordados esses fenômenos; a forma como os professores transmitem aos  alunos esses fenômenos; e como os futuros profissionais chegam ao mercado de trabalho enxergando estes pacientes.

METODOLOGIA:

Os objetivos desta pesquisa foram classificados em duas etapas. Na primeira etapa procuramos através de entrevistas estruturadas,  junto a todos os  9 médicos  com especialização em clínica médica que trabalham no ambulatório do HU há mais de 10 anos  e os 9 residentes que estavam, no momento da pesquisa, se especializando em clínica médica, conhecer qual a maior incidência encontrada por eles dentro do ambulatório:  pacientes hipocondríacos ou pacientes poliqueixosos e também buscamos conhecer o perfil desses pacientes e quais as suas queixas.

Na segunda etapa realizamos entrevistas semi-estruturadas com 2 médicos e 2 residentes e através delas  aprofundamos o tema e  conhecemos a visão médica  sobre os 2 fenômenos, embora o destaque maior tenha sido dado para o fenômeno de maior incidência no ambulatório do HU. Nesta etapa foi possível tornar um pouco mais visível à relação médico clínico e paciente portador de hipocondria/poliqueixas. Também conhecemos qual é a conduta atual destes profissionais  em relação a estes tipos de  pacientes  e verificamos  o que eles achavam que poderia ser realizado para minimizar o sofrimento desses pacientes dentro do ambulatório do HU.

RESULTADOS:

Identificamos que ambos transtornos partem das queixas sem fundamento científico originando muita confusão na área médica. Enquanto que uma das características do hipocondríaco é a preocupação constante em ter uma doença grave, a poliqueixa defini o comportamento de indivíduos que percorrem diversas especialidades médicas apresentando múltiplos sintomas cujos exames não revelam nada. Ambos transtornos são de alto custo para o sistema público de saúde. Os pacientes encontram-se muito sujeitos a automedicação e autoprescrição de remédios e são estigmatizados pela família e pelos médicos que desconhecem esses transtornos.

Verificamos que a freqüência maior no ambulatório do HU é de pacientes poliqueixosos. Cada um dos entrevistados atende 10 pacientes com características poliqueixosas/mês e estes retornam diversas vezes ao ambulatório. As queixas dos pacientes são variadas e também se encontram presentes na fibromialgia o que acaba gerando um diagnóstico desta doença para pacientes poliqueixosos e que são também diagnosticados como depressivos e medicados como tal.

Foi constatado que os pacientes poliqueixosos têm em média entre 41 e 50 anos. Estatisticamente a  incidência maior de poliqueixosos é do sexo feminino. Os entrevistados consideram que as queixas são provenientes de problemas psicossociais, como a violência doméstica. Foi indicado pelos entrevistados que a forma de tratamento mais eficaz para minimizar o sofrimento destes pacientes seria o tratamento multidisciplinar.

CONCLUSÕES:

Nesta pesquisa não nos coube generalizar a percepção médica sobre os transtornos investigados, mas pudemos incluí-la dentro do Estilo de Pensamento (EP) organicista/biologicista que se  encontra tão consolidado nos currículos médicos que na maioria das vezes os estudantes se formam sem ao menos ouvirem falar do transtorno poliqueixoso ou do hipocondríaco, já que estes não denotam uma doença na forma estabelecida convencionalmente.

Alguns médicos até conseguem captar, através de uma escuta mais atenta, outras dores que não são correspondentes às partes do corpo, mas sim  “da alma”. Mas por outro lado continuam sem opções na maneira de tratar este tipo de paciente dentro da instituição hospitalar o que ocasiona a prescrição de antidepressivos tentando com isso amenizar o sofrimento deles. Essa prática médica acaba acarretando uma medicalização dos problemas psicossociais e também acaba legitimando o discurso do paciente de sentir-se doente sem ter uma doença orgânica expressiva.

Para haver tratamento eficaz destes transtornos é necessário que haja uma triagem desses pacientes no HU e que eles sejam atendidos por uma equipe multidisciplinar nos seus mais variados problemas.

Dessa forma, avaliamos que a complexidade do processo saúde/doença, não permite que os médicos se baseiem em um único EP para o tratamento das mais variadas formas de adoecer.

 
Palavras-chave: clínica médica; paciente hipocondríaco/poliqueixoso; tratamento.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006