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G. Ciências Humanas - 6. Ciência Política - 4. Políticas Públicas

ACCOUNTABILITY HORIZONTAL E AS POLÍTICAS DE INFRA-ESTRUTURA NA AMAZÔNIA: O CASO  DA  UHE  DE BELO-MONTE  

 

Maria da Graça Bittencourt Campagnolo 1
(1. universidade federal do pará)
INTRODUÇÃO:

O conceito de Accountability Horizontal foi a interpretação dada para as Ações Civis Públicas no Estudo de Caso do conflito judicial sobre as irregularidades ocorridas no licenciamento ambiental da UHE de Belo-Monte, que foi excluída da Agenda Pública por uma Liminar.  A pesquisa tem 2 partes: revisão da literatura para poder explicar o Caso em estudo e os casos semelhantes:o da UHE Peixe-Angical-To e do gasoduto Urucu-Porto Velho-AM ambos suspensos por irregularidades no licenciamento ambiental, donde se vislumbra na implementação de obras de infra-estrutura na Amazônia a utilização constante de práticas como as cotejadas na segunda parte: utilização paralela de práticas aparentes e submersas pela Estatal e pelos políticos locais para agilizar o início da obra ainda que isso resultasse em irregularidades quanto ao disposto na CF,art. 231,P.3º, Lei nº8666/93 e a Res.nº237/97 CONAMA. Belo Monte foi um progresso do projeto original, a UHE de Kararaô que previa um lago com 1,2 mil km2, já o atual diminuiu o reservatório para 400 km2. Quase uma usina a fio d'água, mas não haviam estudos sobre as conseqüências dessa redução.As irregularidades e a displicência levaram esses e outros projetos à apreciação do Judiciário, o que vem se tornando um fato a ser estudado de forma multidisciplinar nas áreas das políticas públicas e da sociologia jurídica. 

 

METODOLOGIA:

Trata-se de uma pesquisa de Estudo de Caso, que compreende revisão bibliográfica sobre o tema da accountability horizontal em busca de outras contribuições argumentativas além da de O’Donnell(1993 e 1998), seguida do estudo do Caso sobre a UHE de Belo-Monte e o desenvolvimento de generalizações para validar o nosso entendimento da possibilidade de Accountability Horizontal na arena judicial sobre processos de licenciamento ambiental de grandes obras de infra-estrutura.  Com relação ao Caso, dados foram coletados através de documentos constantes de periódicos, do Plano 2015 da Eletrobrás e dos autos da Ação Civil Pública de nº2001.39.000058676-6/PA. A utilização da estratégia de localizar  os eventos em arenas públicas midiática, administrativa e judicial que além de demarcar a temporalidade do conflito, colocando marcos não estanques na trajetória dos eventos, possibilitou a reconstituição,classificação e interpretação dos mesmos com base no  pressuposto de que não são arenas estanques , permitindo o fluxo de opiniões e ações coletivas em prol da inserção ou da exclusão da UHE de Belo Monte na Agenda Pública. Ademais,  com base no critério da semelhança de fato e identidade de razão, efetuamos generalizações com outros casos na região Norte, a UHE Peixe-Angical(TO) e o Gasoduto Urucu-P.Velho, nos utilizando das sentenças que suspenderam os processos de licenciamento ambiental dessas obras em virtude de irregularidades.

RESULTADOS:

Nossas hipóteses de trabalho se confirmaram.A primeira consiste no fato de que  a UHE de Belo Monte é uma continuidade do projeto de 1989 apesar da aparente preocupação com o meio-ambiente e com os povos indígenas, expressadas no Plano 2015, na diminuição da área do reservatório e nos planos de desenvolvimento e inserção regional.A continuidade se manifestou na busca da neutralização de controvérsias e exclusão de atores sociais do processo decisório, através da utilização de procedimentos irregulares e inconstitucionais, notadamente a autorização para a realização do EIA ter sido dada pela ANEEL e não pelo Congresso Nacional e a confecção do Termo de Referência ter sido feita pela Eletronorte e não pelo IBAMA, circunscrevendo a área do EIA apenas aos 6 municípios do Pará onde se dariam os impactos diretos da referida UHE, estadualizando o procedimento, que passou a ser presidido pela SECTAM de forma a sofrer total influência das preferências do Governador e da Eletronorte. Foi uma Ação Civil Pública provocada pelo Ministério Público Federal na Justiça Federal que contra-arrestou essas práticas, que vem se tornando uma constante em outras obras de infra-estrutura para a produção de energia com recursos naturais da Amazônia, donde o nosso entendimento dessas ações como meios de Accountability Horizontal visto sua interferência na Agenda Pública  ao reverter o curso da trajetória dessas obras de  infra-estrutura.

 

CONCLUSÕES:

Para O’Donnell essas inconstitucionalidades decorreriam da ausência de uma efetiva substantivização das tradições democrática, liberal e republicana do regime de 1988, que privilegiou a governabilidade em detrimento da participação. Przeworski argumentaria que esse quadro derivou da própria estrutura da relação Agente e Principal. Na pesquisa pudemos observar as potencialidades das ações civis públicas como meio de interferência do Judiciário na Agenda Pública produzindo accountability horizontal na Justiça Federal. Entretanto, coerente com o argumento de Garapon(1999), a justiça não substitui a democracia. A preocupação com a legalidade da administração e com as terras indígenas, ainda que necessárias,se ressentem da ausência de temas que questionem a oportunidade de uma UHE de grande porte a fio d’água.Segundo Lúcio Flávio Pinto o problema da UHE de Belo Monte é que, tendo reduzido sua potência, com o desmembramento do custo de transmissão, tornará necessária a construção de novas barragens a montante do Xingu, donde a necessidade de uma discussão com a sociedade sobre as UHEs tendo como pressuposto o Planejamento por bacia hidrográfica, não por territorialidade ou necessidade econômico strictu sensu, cujo Plano resultante dessa discussão pública transformariam em Lei Federal, que demarcariam os aproveitamentos possíveis das bacias , por quem e de que modo.

 

 

 
Palavras-chave: accountability horizontal; ação civil pública; hidroelétrica.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006