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F. Ciências Sociais Aplicadas - 4. Direito - 9. Direito Penal

ConsideraçÕes acerca da (in)constitucionalidade da Lei de Crimes Hediondos e sua necessária revisão à luz do Direito Penal Mínimo

Karla Viviane de Sousa Rego 1
Ana Mônica Medeiros Ferreira 1
Arthur Felipe Pinheiro 1
Marla Gheysa Sales Gomes 1
Marianne Bezerra Sathler 1
Fabiano André de Souza Mendonça 2
(1. Acadêmicos da Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN; 2. Prof. Dr. da Universidade Federal do Rio Grande do Norte/UFRN (orientador))
INTRODUÇÃO:

O Direito Penal é o ramo do Direito que deve tutelar apenas bens jurídicos considerados relevantes segundo os valores sociais, como meio de desencorajar ações repudiadas pelo homem médio, reprimindo-as e visando à reabilitação do agente infrator, devendo representar o mínimo de ingerência estatal sobre o corpo social. Contudo, nos últimos anos, tem-se constatado o surgimento de movimentos que têm por escopo instrumentalizar o Direito Penal tomando-o não como ultima ratio, mas antes exacerbando o alcance da jurisdição penal, considerada como meio eficaz para a resolução da problemática da criminalidade que aflige o seio da sociedade. Nesse contexto, foi editada a Lei de Crimes Hediondos (Lei n. 8.072, de 25.07.90), influenciada por um estado de profunda comoção popular, incitado em grande parte por mecanismos midiáticos e provocado pela ocorrência de casos que adquiriram relevo em âmbito nacional. O referido diploma legal trouxe em seu bojo o recrudescimento da sistemática processual já existente, suprimindo uma série de benefícios em favor do réu, afrontando, inclusive, a norma constitucional. Feitas tais considerações, o presente trabalho objetiva aprofundar a discussão sobre a constitucionalidade de certos dispositivos da lei em comento para, ao final, propor sua revisão, sendo esta relevante para a adequação do diploma à realidade de um Direito Penal minimalista e garantista, restituindo, assim, garantias constitucionais por ele usurpadas.

METODOLOGIA:

O presente estudo científico foi produzido a partir de compilação doutrinária, do cotejamento de conteúdos de cunho jornalístico e da análise sistemática e comparativa da jurisprudência, de modo a captar os princípios que informam o atual entendimento dos pretórios brasileiros, principalmente do Supremo Tribunal Federal (STF), de maneira a reunir subsídios científicos para embasar proposições adequadas ao aperfeiçoamento do aludido diploma legal.

RESULTADOS:

Sob o manto da Constituição Federal de 1988 (CF), direitos fundamentais foram estabelecidos com o intento de firmar limites para o Estado. No tocante ao Direito Penal, tais prerrogativas devem ser mais fortemente observadas, haja vista ser o ramo da Ciência Jurídica que age tolhendo um valor inerente à condição humana: a liberdade. Nesse diapasão, a criação da Lei de Crimes Hediondos, editada em meio ao clamor popular oriundo da criminalidade crescente, aboliu garantias processuais e ofendeu, em alguns de seus dispositivos, a ordem constitucional vigente. É o que se depreende da análise do § 1º do seu art. 2º, cuja inconstitucionalidade foi declarada incidentalmente pelo STF no julgamento do Habeas Corpus n. 82.959-SP por afrontar o princípio da individualização da pena (CF, art. 5º, XLVI); afora o art. 2º, I, que, ao proibir o indulto, contrariou o art. 5º, XLIII da Constituição que veda apenas a concessão de graça e anistia; e, por último, o art. 2º, II, que vedou a possibilidade de liberdade provisória, transgredindo o preceito do art. 5º, LXVI da Carta Magna bem como os princípios da presunção de inocência (CF, art. 5º, LVII) e do devido processo legal (CF, art. 5º, LIV). Desta forma, a Lei n. 8.072/90, ao estabelecer maior rigor para punir os crimes nela elencados, restou eivada de dispositivos inconstitucionais sem, contudo, ter sido capaz de diminuir os níveis de criminalidade.

CONCLUSÕES:

A Lei de Crimes Hediondos foi editada no contexto de uma sociedade leiga, comovida e passional, sob forte influência de interesses particulares encampados por determinados setores da imprensa. Tal conjuntura fez com que o legislador criasse o referido diploma legislativo com intuito paliativo, acentuando o rigorismo processual e material, a fim de diminuir a criminalidade clássica, valendo-se do Direito Penal não como o último meio de controle social ou ultima ratio, mas como panacéia para insegurança vivida no meio social. Desta sorte, ao final do presente estudo, conclui-se que a Lei n. 8.072/90 apresenta inegáveis marcas de inconstitucionalidade ao proibir a progressão do regime durante o cumprimento da pena, a concessão de indulto e de liberdade provisória. Além da patente desconformidade com a ordem constitucional, a Lei de Crimes Hediondos encontra-se situada fora da atual realidade doutrinária penal, qual seja, a do Direito Penal Mínimo e Garantista, deixando de preconizar os direitos fundamentais garantidos na Constituição Federal como limites para o Direito Penal. O que sinaliza ser mais aconselhável no momento é que o diploma legislativo ora analisado seja objeto não apenas das atuais releituras jurisprudenciais, a exemplo do Habeas Corpus n. 82.959-SP/STF, como também de uma revisão legislativa que a adeqüe à Constituição Federal, permitindo uma diminuição real da criminalidade e a ressocialização dos apenados.

Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: Direito Penal; Lei de Crimes Hediondos; Constituição Federal.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006