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H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Lingüística - 1. Lingüística Aplicada
ERROS DE ESCRITA NA ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: ESTUDO DE CASO NUMA PERSPECTIVA DE LETRAMENTO
Valdirene de Souza Ferreira Savi 1
Mariléia Reis 1
(1. Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL)
INTRODUÇÃO:

INTRODUÇÃO. Esse artigo trata da descrição de um estudo de caso sobre erros de escrita na produção textual inicial de alfabetizandos jovens e adultos do município de Jaguaruna (Santa Catarina), a partir dos pressupostos teórico-metodológicos de um modelo que firma a mediação de um conhecimento (de uma habilidade) pelo docente a partir do contexto sócio-histórico-cultural do aprendiz, aqui entendido como letramento.  Atualmente, pelo fato de as sociedades do mundo inteiro estarem cada vez mais centradas na escrita, ser alfabetizado, isto é, saber ler e escrever, tem se revelado condição insuficiente para responder adequadamente as demandas contemporâneas: é preciso ir além da simples aquisição do código escrito, é preciso fazer uso da leitura e da escrita no cotidiano, é preciso apropriar-se da função social dessas duas práticas, é preciso letrar-se. O conceito de letramento, embora ainda não registrado nos dicionários brasileiros, vem sendo empregado devido à insuficiência reconhecida do conceito de alfabetização. E, ainda que pouco mencionado, já está presente na escola, traduzido em ações pedagógicas de reorganização do ensino e reformulação dos modos de ensinar, segundo a PCSC/2005. Letramento é, então, de certa forma, o estado em que vive o indivíduo que não só sabe ler e escrever, mas exerce as práticas sociais de leitura e escrita que circulam na sociedade em que vive: é o estado do indivíduo que sabe ler e de fato lê jornais, revistas, livros, as contas de água, luz, telefone, por exemplo.

METODOLOGIA:

METODOLOGIA.  Esse artigo caracteriza-se como um estudo de caso, por tratar de uma descrição holística com análise de um único fenômeno (erros de escritas em produção textual inicial de jovens e adultos). Segundo Rauen (2006, p. 178), estudar algo pelo seu valor intrínseco implica valorizá-lo em sua unicidade e não como suporte para a generalização. É de natureza qualitativa e não quantitativa: segundo aquele autor, pesquisadores quantitativos, preocupados com a generalização, procuram diferenças numéricas entre dois grupos de pessoas, que diferem sob algum aspecto. Na pesquisa qualitativa, não se quer provar a existência de relações particulares entre variáveis. O trabalho busca uma descrição do fenômeno estudado, está interessado nas histórias dos eventos e nas suas interdependências. No município de Jaguaruna, numa região de pescadores, após seis meses de freqüência ao programa de alfabetização de jovens e adultos, foi solicitado aos alfabetizandos que produzissem um pequeno texto, a partir do estímulo A importância do saber ler, trabalhado pela professora, em sala de aula. Foi-lhes entregue uma folha individual, com três espaços distintos: num, eles deveriam escrever o nome; noutro, o auto-retrato, sob a forma de um desenho; e, por fim, o que gostariam de escrever sobre eles, em relação ao estímulo proposto em classe. O sujeitos tinham faixa etária entre 38 e 61 anos e atuavam nas seguintes profissões: pescadores, secretárias do lar, aposentados, pedreiros e comerciantes ambulantes.

RESULTADOS:

RESULTADOS. Os erros mais encontrados na produção textual dos alfabetizandos foram de natureza fonológica (troca de fonema, como em ‘faca’ no lugar de ‘vaca’) e de segmentação (os que se relacionam à separação (ou não) de vocábulos, como em ‘derepente’ no lugar de ‘de repente’). Os resultados demonstraram que cerca de 30% dos sujeitos cometeram erros de natureza fonológica e 40%, erros de natureza de segmentação. Os demais erros, em número menor, foram de natureza variada: erros decorrentes de variação lingüística, como a escrita de ‘familha’ no lugar de ‘família’; erros considerados convencionais, como, por exemplo, a troca de ‘s’ por ‘c’, ‘ç’, ‘ss’, ‘sc’, ‘sç’, ‘xc’; e, finalmente, os erros de hipercorreção, como em ‘endia’ no lugar de ‘emdia’, por exemplo. Nos erros por segmentação, ficou evidenciada a falta de clareza dos alunos no que diz respeito à diferença entre vocábulo fonológico e vocábulo morfológico (ou mórfico), na concepção de Mattoso Câmara (1977): este relaciona-se ao significado das palavras, dá-se quando um segmento fônico se individualiza em função de um significado específico que lhe é atribuído na língua; aquele está ligado ao ritmo, a elementos prosódicos, e corresponde a uma divisão espontânea na cadeia da emissão vocal: em português, depende da força de emissão das sílabas, e essa força se chama acento. Por exemplo: tanto em ‘passatempo’ quanto em ‘guarda-chuva’, há dois VF e um VM. Mas, em ‘aguardente’ e ‘planalto’, por exemplo, temos apenas um VF e um VM.

CONCLUSÕES:
CONCLUSÃO. Na aula-estímulo A importância do saber ler, trabalhamos as palavras do contexto sócio-histórico-cultural dos sujeitos, mediante a distribuição de folhetins dos supermercados e farmácias do município, em que apareciam palavras relacionadas à alimentação, vestuário e remédios por eles consumidos, o que justifica a motivação com que a testagem foi desenvolvida. Na sala de aula, também circularam textos de gêneros distintos: faturas da conta, água, luz e telefone; documento de identidade e certidão de nascimento. Uma aluna (a de 61 anos) escreveu no seu texto que considerava importante saber ler e escrever, segundo ela, porque Viajo muito e preciso pegar o ônibus, mas sempre preciso de alguém para me ajudar a ler para onde o ônibus vai, gostaria de escrever isso, mas somente sei escrever a letra ‘o’ de ônibus, o resto eu não sei, quer dizer, aiiiiiinda não sei. E é a partir de depoimentos desta natureza que nós, as pesquisadoras, do mesmo modo que Magda Soares (2005), em relação à inserção da palavra letramento no contexto escolar, no desenvolvimento e aprofundamento do saber, esperamos que essa nova palavra (letramento) tenha surgido, como muitas outras já surgiram e muitas tantas vêm surgindo na área da educação e do ensino, não propriamente para nomear um novo fenômeno, mas para designar uma nova percepção, uma nova compreensão de um processo que em si não é novo, que é o processo de aprendizagem da escrita, cujos ‘erros’ serão apenas uma questão de tempo.
 
Palavras-chave: erros de escrita ; letramento; alfabetização de jovens e adultos.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006