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G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 8. Antropologia

OS MANGAEIROS NAS FEIRAS-LIVRES DO NATAL: DESVENDANDO OS SEGREDOS DAS TRADIÇÕES.

Francisca de Paula de Oliveira  1
(1. Universidade Federal do Amapá)
INTRODUÇÃO:

Este estudo abordou a atividade cultural dos mangaeiros, investigando os significados da tradição a partir da análise dos dados coletados na pesquisa empírica em quatro feiras-livres  do município do Natal (Alecrim, Carrasco, Cidade da Esperança e Rocas). A prática da medicina popular é atribuída com regularidade a rituais desenvolvidos por mãe e pai de santo, benzedeiras, pajés etc. No entanto, uma outra categoria, a dos mangaeiros, se afirma também como portadores dos saberes desta medicina. No município do Natal, é grande o número de pessoas que se consideram praticantes da medicina popular, havendo aqueles que manipulam ervas na elaboração de remédios caseiros e ensinam receitas. Em suas práticas estão contidos elementos da tradição. Este grupo, reconhecido como mangaeiros, é composto por pessoas que desenvolvem suas atividades nas feiras-livres. Este estudo deteve-se na figura desses mangaeiros. A observação do universo cultural pesquisado nos indicou a possibilidade de descortinar diferentes visões de mundo dos interlocutores da presente pesquisa. O trabalho teve, assim, como principal objetivo compreender em que consiste a atividade dos mangaeiros enquanto produtores de remédios caseiros e identificar os sentidos que eles atribuem ao exercício desta atividade.

METODOLOGIA:

Para o desenvolvimento deste estudo tornaram-se necessário trazer à baila as discussões dos teóricos que analisam a temática sob diferentes ângulos. Assim, a base teórica consiste em reflexões de autores como Gerd Bornheim e Alfredo Bosi, Peter Berger e Thomas Luckmamn, Peter Burke, Clifford Geertz, Luiz Cláudio di Stasi, Roberto Cardoso Oliveira, Luis da Câmara Cascudo entre outros. A metodologia prioriza a etnografia, instrumentos metodológicos como imagens fotográficas, aplicação de questionários e entrevista semi-estruturada. Para obtenção dos dados empíricos, foram aplicados questionários a um universo de vinte e quatro mangaeiros. Deste total, foram selecionados quatro para serem entrevistados, tendo em vista que estes demonstraram conhecer segredos tradicionais da medicina popular. Como não foi possível promover diálogo com todos os que pertencem ao universo da pesquisa, fez-se uma etnografia densa dos espaços ocupados por estes quatro mangaeiros nas quatro feiras-livres. As entrevistas qualitativas foram baseadas em roteiro pré-estabelecido objetivando captar informações necessárias à compreensão do universo pesquisado. A realização da pesquisa empírica ocorreu no período de junho a novembro de 2003. O referencial teórico metodológico utilizado para compreender e interpretar as práticas, as experiências e os discursos que tornaram possíveis as visões de mundo dos mangaeiros foi do autor Clifford Geertz.

RESULTADOS:

Os sentidos atribuídos pelos mangaeiros as suas atividades se relacionam as próprias estratégias de sobrevivência deste grupo, a fatores subjetivos, como privilégio de saberem intuir sobre o poder das plantas medicinais e a satisfação íntima de sentirem-se portadores de saberes secretos herdados pela tradição. Esses elementos são capazes de explicarem os significados segundo os quais os mangaeiros interpretam suas práticas. Levando-se em consideração os discursos dos mangaeiros, a prática da medicina popular se dá em três níveis: num nível superior circulam práticas de cura rotuladas empíricas, reconhecidas pela sugestão de receitas como lambedor, chá garrafadas e etc; no nível intermediário circulam  práticas rotuladas mágicas – as simpatias e as superstições; por último circulam práticas de cura proclamadas religiosas, manifestadas por meio de crenças em divindades. No seu conjunto, todas essas práticas modificam a organização dos espaços das feiras que eles ocupam. Os próprios mangaeiros atribuem a estes espaços uma variedade de sentidos, tendo em vista a diversidade de fenômenos que lá ocorre. Os mangaeiros se identificam, assim, através da arte milenar de fazer remédios caseiros como  profissionais da medicina popular por terem em suas casas ou na comunidade suas próprias farmácias verdes.

CONCLUSÕES:

 

Este trabalho revelou que as ações dos mangaeiros são motivadas por valores simbólicos que foram construídos por meio de sentidos míticos que eles  atribuem à prática da medicina popular. Percebemos que a dimensão mítica da medicina popular atribuída pelos mangaeiros se assemelha a dimensão histórica  dessa medicina que mostra o nível mítico que envolve tal medicina, associado às práticas mágicas e ritualísticas. Estes elementos estão presentes nos discursos dos mangaeiros,  quando eles relatam algumas histórias de cura com ervas, a intervenção da divindade. Afirmam que o remédio feito à base dessas ervas terá melhor eficácia se os usuários acreditarem na medicina popular. Observamos nos discursos dos mangaeiros  conteúdos emocional e valorativo. No cotidiano das feiras-livres, os mangaeiros traduzem suas tradições socialmente; é, sobretudo por  meio da oralidade que transmitem seus conhecimentos aos jovens, crianças e até mesmo aos adultos interessados em conhecer os mistérios que as ervas envolvem.

Instituição de fomento: CNPq
 
Palavras-chave: Cultura; Tradição; Medicina Popular.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006