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G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 11. Psicologia Social
PARA ALÉM DO ÚTIL PSICOLÓGICO
Daniel Maribondo Barboza 1, 2, 3
Heliana de Barros Conde Rodrigues  1, 2, 3
Camilla Martins de Oliveira  1, 2, 3
Aline de Araújo Gonçalves da Cunha 1, 2, 3
(1. Clio-Psyché; 2. Instituto de Psicologia; 3. Universidade do Estado do Rio de Janeiro)
INTRODUÇÃO:
A História da Psicologia no Brasil costuma ser apresentada, no curso de graduação, de maneira linear: a partir da ordem cronológica da elaboração modelos do psíquico, na sua maioria estrangeiros, estabelece-se um caminho evolutivo com o qual se pretende demonstrar um progresso nos saberes “psi”. Tal abordagem acaba por desconsiderar certos aspectos mais contextuais, no que tange à institucionalização da Psicologia  principalmente tendo em foco a apropriação, por parte dos poderes público e privado, das práticas e discursos psicológicos e suas conseqüentes utilizações. A Análise Institucional (AI) apresenta três propostas teórico-práticas articuladas a esses aspectos: o rompimento da divisão do trabalho científico; a autogestão do conhecimento e a análise de implicação do sujeito com as práticas e saberes que produz. Recorrendo a AI, visa-se à abordagem de discursos não-acadêmicos, como a oralidade popular – analisadores de realidades coletivas, nas quais se encontram fortemente presentes. Tais dispositivos fazem emergir modos de subjetivar que revelam terapêuticas e pedagogias de vida de grande importância para o estudo e construção dos saberes psicológicos, uma vez que efetivam as três propostas supracitadas e incorporam os aspectos desconsiderados pelo currículo clássico em Psicologia.
METODOLOGIA:
Como metodologia, adota-se a perspectiva da História Oral. Contudo, a oralidade é tomada aqui como dispositivo de desconstrução de discursos instituídos. Isto é, os relatos orais não são encaixados nas lacunas da história oficial dos documentos escritos, corroborando-a. São, de fato, uma possibilidade de buscar descontinuidades em tais documentos, apresentando elementos de luta muitas vezes tornados invisíveis pelas pretensas objetividade e veracidade dos mesmos. As produções aqui tomadas como primeiro objeto de análise são músicas consideradas populares e provenientes das classes ditas marginalizadas ou de artistas em contato com estas. Por um lado, são trabalhados artistas do forró, estilo de música popular nordestina, como Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, João do Vale, Dominguinhos e Marinês, entre outros, abarcando o eixo rural. Por outro, são tomados representantes do samba, estilo de música popular sudestina, como Adoniran Barbosa, Noel Rosa e Chico Buarque, que, por sua vez, abarcam o eixo urbano. É importante ressaltar que o objeto final de análise se configura na interpenetração e atravessamento da tríade música-compositor/intérprete-sociedade.
RESULTADOS:
A tríade analisadora música-compositor/intérprete-sociedade nos oferece um amplo campo de saberes e práticas que não costumam ser mapeáveis, visto que se constroem e desconstroem, a cada novo momento, na própria práxis. A captura oral por parte de poetas, compositores e intérpretes, traz a tona e torna possível uma perpetuação de tradições aos descendentes. Além disso, o sentido inverso também é verificado: artistas mais jovens compõem e cantam éticas diversas e que quebram muitos tabus e acabam trabalhando de uma maneira diferente os conflitos de gerações, nas festividades e encontros. É possível constatar com isso um processo autogestivo de práticas e saberes que podem ser considerados, em sentido amplo, terapêuticos ou pedagógicos. Entretanto, tais processos não são discrimináveis com facilidade, visto que misturam experiências consideradas negativas ao desenvolvimento da sociabilidade em paradigmas psicológicos clássicos, a vivências nitidamente positivas e felizes. Tal confusão não se mostra, em absoluto, como algo que atrapalhe o presente trabalho. Pelo contrário, funciona muito bem ao fazer emergir questionamentos acerca dos critérios que utilizamos na construção de padrões psicológicos que prezam certa assepsia vivencial, baseada na política de evitar conflitos.
CONCLUSÕES:
A música popular brasileira apresenta discursos que contribuem sobremaneira ao estudo da Psicologia no Brasil. Produções humanas não rotuladas como saberes psicológicos, oferecem um material que enriquece o debate tanto em História quanto no conhecimento científico da Psicologia, na realidade social brasileira. Tal processo de contextualização promove maior proximidade entre a ciência psicológica e a população e suas demandas, uma vez que se sustenta em dispositivos analisadores provenientes dos sujeitos implicados nas vivências, e não de um especialista que, pretensamente de fora, tece especulações. Além disso, a abordagem desse saber psicológico intrínseco às produções humanas traz uma Psicologia baseada na afirmação de modos, estratégias e estéticas de vida, escapando assim à comum política de terapêuticas de correção e cura de patologias e desvios de padrões de normalidade.
Instituição de fomento: CNPq e UERJ
Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: oralidade popular; Análise Institucional; História da Psicologia.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006