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G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 7. Psicologia do Ensino e da Aprendizagem
O DITO E O NÃO DITO NA EDUCAÇÃO SEXUAL: UMA PRODUÇÃO DISCURSIVA NAS ESCOLAS DE FORTALEZA
Helenira Fonseca de Alencar 1
Débora Pinho Arruda 2
Eugênia Marques de Oliveira Melo 3
Antonio Fábio Coelho Paz 4
Veriana de Fátima Rodrigues Colaço 5
(1. Graduanda do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará/UFC; 2. Graduanda do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará/UFC; 3. Graduanda do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará/UFC; 4. Graduando do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará/UFC; 5. Profa. Dra. do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará/UFC)
INTRODUÇÃO:
Este trabalho trata de uma pesquisa realizada nas disciplinas de Pesquisa em Psicologia I e II do Curso de Psicologia da Universidade Federal do Ceará – UFC – no ano de 2005. Através dele, buscamos investigar como os discursos sobre a educação sexual são produzidos nas escolas religiosas e laicas na contemporaneidade na cidade de Fortaleza, tecendo uma análise comparativa entre eles e promovendo uma articulação com as orientações presentes nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Esses parâmetros prezam por uma maior abertura sexual, apontando a prática do sexo seguro como método de prevenção de DSTs e gravidez indesejada. A relevância desse tema pode ser percebida uma vez que observamos a existência de uma discussão atual acerca da revolução sexual, a qual foi veiculada pela revista CartaCapital (2005). Essa matéria discorria sobre a reação norte-americana de ordem religiosa e governamental à abertura sexual, defendendo a preservação do corpo através do método da abstinência sexual. A revista apontava, ainda, a existência, em algumas escolas brasileiras, de tematizações acerca desses métodos, o que nos fez refletir acerca das possíveis influências dessas questões nos discursos veiculados sobre a educação sexual em algumas escolas fortalezenses. A partir do referencial de Michel Foucault, tencionamos também investigar os dispositivos de poder-saber-prazer existentes nos discursos estudados.
METODOLOGIA:
Essa pesquisa foi realizada a partir de um enfoque qualitativo, segundo o método desenvolvido por Spink (1999): análise de produção de sentidos, a qual é considerada como uma construção dialógica que visa à percepção de como se atribui sentido ao cotidiano. Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas, as quais foram registradas em um gravador, com os diretores e coordenadores pedagógicos do Ensino Fundamental II de quatro escolas de Fortaleza: duas laicas – uma pública e outra particular – e duas religiosas – uma católica filantrópica e uma protestante particular. Posteriormente, foi realizada a transcrição de cada entrevista bem como uma leitura flutuante, possibilitando, conforme o modelo metodológico utilizado, a elaboração dos mapas de associação de idéias, os quais proporcionaram uma melhor sistematização de nossa análise. Os mapas foram divididos em categorias, elaboradas a partir da articulação entre os nossos objetivos, o roteiro das entrevistas, as falas dos entrevistados e o nosso referencial teórico. Cada mapa construído referia-se a uma entrevista e tematizava uma categoria com as suas respectivas associações. A análise dos discursos foi possibilitada tendo-se como embasamento teórico as idéias foucaultianas acerca dos dispositivos de saber-poder-prazer e o conteúdo existente nos Parâmetros Curriculares Nacionais.
RESULTADOS:
Foram construídos 32 mapas, nos quais abordamos as categorias: concepção de educação sexual, espaços de veiculação, abordagem do corpo e linguagem. Quanto à concepção de educação sexual, pôde-se perceber concepções vigentes com recorrência a temas como gravidez precoce, métodos contraceptivos, DSTs e namoro dentro das escolas. Observamos uma diferenciação no tocante à forma de tratamento dos conteúdos numa perspectiva valorativa e preventiva acerca da sexualidade, sendo enfatizados nas escolas religiosas princípios morais como orientadores das práticas sexuais. Percebemos, dentro da categoria espaços de veiculação, uma tentativa de controle do saber sobre a sexualidade nas determinações de espaços próprios para inculcação desse tema, que concernem desde a sala de aula à semana cultural. Além desses espaços formais, foi-nos relatado a existência de conversas informais. O mecanismo da confissão é sutilmente utilizado, incitando os alunos a falarem sobre sua vida sexual, produzindo e controlando saberes sobre o sexo. Percebemos que todas as escolas proíbem e punem a realização de ‘concupiscências’ em seu espaço. Quanto ao corpo, observamos uma forma de abordagem semelhante ao corpo-espécie, concebido com funções naturais, sendo-lhe negado a subjetividade dos desejos. O corpo era abordado em algumas escolas como corpo-máquina com o objetivo de se formar corpos dóceis. Outra análise indicou a utilização de uma linguagem técnica científica como legitimadora do saber sobre o sexo.
CONCLUSÕES:
Observamos uma diferença de olhares concernentes à educação sexual entre as escolas religiosas e laicas. Nas primeiras, percebemos, um ascetismo assentado na moral religiosa cristã, embasando o discurso e as práticas relativos à educação sexual, havendo uma maior diretividade dessa prática na escola protestante. Observamos, também, por parte destas, uma defesa da abstinência sexual como método de prevenção das DSTs e da gravidez precoce, indo de encontro à proposta do método do sexo seguro, orientado pelos PCNs e mais acolhido nas escolas laicas, em particular na pública. Na escola laica particular, percebemos pouco interesse no tema da educação sexual, levando-nos à percepção de que esta se empenhava prioritariamente em adestrar o ‘corpo máquina’ para o mercado de trabalho em detrimento de se abordar o ‘corpo sexual’, propenso ao prazer e à reprodução da espécie. Concluímos que os ‘dispositivos de poder-saber-prazer’, os quais respondiam à formação de uma verdade sobre a educação sexual, concretizavam-se na adoção de uma linguagem técnica autorizada a falar sobre o assunto, na criação de espaços determinados de veiculação desses discursos, no mecanismo da confissão. É válido salientar que os objetivos de nossa pesquisa foram alcançados e que os sentidos aqui produzidos não se pretendem inquestionáveis, uma vez que são produtos de uma, entre as muitas possíveis desconstruções e interpretações da realidade percebida.
 
Palavras-chave: Foucault; Educação sexual; Produções discursivas.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006