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G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 11. Psicologia Social
PRISÃO X PRISIONEIROS: EMBATE DE DISCURSOS
Débora Pinho Arruda 1
Helenira Fonseca de Alencar 2
Eugênia Marques de Oliveira Melo 3
Ana Caroline Costa 4
Tiago de Oliveira Magalhães 5
Ângela de Alencar Araripe Pinheiro 6
(1. Graduanda do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará/UFC; 2. Graduanda do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará/UFC; 3. Graduanda do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará/UFC; 4. Graduanda do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará/UFC; 5. Graduando do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará/UFC; 6. Profa. Dra. do Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Ceará/UFC)
INTRODUÇÃO:
Este trabalho foi realizado na disciplina de Psicologia Social II do curso de Psicologia da Universidade Federal do Ceará, no semestre de 2004.2. Através dele, realizamos uma comparação entre o que é proposto pelo Regimento Interno do Instituto Penal Paulo Sarasate (IPPS) e os discursos dos egressos, o que nos possibilitou entrar em contato com os relatos destes acerca do tratamento recebido nessa instituição. Além disso, utilizamos também a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Conjunto de Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão como forma de enriquecer nossa análise. Dessa maneira, buscamos problematizar o papel atribuído às penitenciárias pela sociedade e questionar suas conseqüências na manutenção de um estado de desigualdade social, problematizando, ainda, o papel do psicólogo nessas instituições. Ademais, tencionamos efetuar um breve percurso histórico acerca das prisões, compreendendo os mecanismos disciplinares presentes nela a partir de uma perspectiva foucaultiana.
METODOLOGIA:
A metodologia utilizada teve uma perspectiva qualitativa, na qual se fez uso de entrevistas estruturadas, as quais foram registradas em áudio, com quatro egressos oriundos do Instituto Penal Paulo Sarasate (IPPS), localizado em Fortaleza. As entrevistas foram realizadas na Secretaria de Justiça do Ceará, sendo os critérios utilizados para escolha dos entrevistados o tempo de reclusão de 1 a 4 anos; sexo masculino e ser ex-presidiário do IPPS. Prosseguiu-se com a transcrição das gravações e com a leitura flutuante do material obtido. Depois, comparamos o que propõe o Regimento Interno do IPPS, a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Conjunto de Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas Sujeitas a Qualquer Forma de Detenção ou Prisão (Resolução 43/173 da Assembléia Geral da ONU de 9 de dezembro de 1988) com as falas dos egressos, a fim de avaliarmos divergências e convergências dos conteúdos. Para tanto, construímos algumas categorias que nos auxiliaram no processo de análise. Estabelecemos, também, um diálogo com alguns autores (Foucault, Sawaia, Baró) que já tematizaram acerca de questões concernentes à prisão e às principais conseqüências desta na sociedade, como a delinqüência e a exclusão. Por fim, abrimos espaço para uma reflexão acerca das possibilidades de atuação dos psicólogos nesse contexto de desigualdade, sabendo-o historicamente construído e, portanto, passível de uma analise crítica sobre os processos que lhe edificam e sustentam.
RESULTADOS:
As categorias construídas no decorrer de nossa análise foram: Trabalho Interno; Separação dos Presos; Lazer; Tratamento dispensado aos Presos; Possibilidade de Emprego após a Prisão e Função da Prisão. Nos documentos investigados, consta que o trabalho é um direito de todo homem, possuindo uma função educativa. Em contrapartida, os egressos mencionaram que não tinham oferta de trabalho, ficando com a maior parte de seu tempo ocioso. O IPPS instituiu alguns critérios de divisão dos presos nas celas. No entanto, foi-nos relatado que tal separação não ocorre. O regimento prevê a realização de atividades esportivas e culturais para os presidiários com finalidade de lazer, o qual é compreendido pelos entrevistados como insuficiente, mencionando-se inclusive a “mesmice” do cotidiano. Os egressos relatam que são mal tratados, apontando o uso de violência contra eles, o que vai de encontro ao conteúdo dos documentos investigados. Apesar de o IPPS se propor a facilitar o retorno dos presos à sociedade em condições satisfatórias, os entrevistados mencionam imensa dificuldade em conseguir um emprego, ressaltando o preconceito e a discriminação que sofrem. O Regimento do IPPS aponta que as principais funções da prisão são assegurar o cumprimento da pena e possibilitar a ressocialização os presos. Observamos que alguns egressos concordam com essa visão e que outros, no entanto, afirmam que a prisão não possui serventia alguma, denunciando que se trata de uma escola de marginalidade.
CONCLUSÕES:
O discurso dos egressos obtidos através das entrevistas revela uma realidade que costumamos não ver. Por mais que sejamos constantemente invadidos pela mídia sensacionalista, que presenciemos em jornais ou televisões a face cruel dessa realidade, nada é mais impactante que presenciá-la diretamente, escutando as histórias de vida de pessoas que costumam aparecer para a sociedade apenas como números de alguma estatística. A imensa disparidade entre a palavra da lei e a sua aplicação, exemplificada por meio de comparações entre as propostas escritas e a realidade vivenciada nas penitenciárias, parece afastar qualquer perspectiva de um melhor horizonte para aqueles marcados pela insígnia infame da prisão. Já não basta, portanto, procurar soluções paliativas para a situação do sistema prisional, é preciso refletir sobre a sua própria função social e seu papel (não-declarado) na produção da exclusão via fabricação da delinqüência. Neste ponto, a crítica de Michel Foucault pode servir como guia para uma reflexão mais aprofundada. Compreendemos, ainda, que cabe ao psicólogo atuante nas prisões colaborar para a reinserção do ex-preso à sociedade, reivindicar políticas públicas e outras ações que visem a resguardar o direito à dignidade humana dentro dessas instituições, bem como lutar por iniciativas que previnam a criminalidade, ou seja, políticas de emprego, educação, saúde, moradia e lazer.
 
Palavras-chave: Foucault; Sistema prisional; Embate de discursos.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006