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H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Lingüística - 1. Lingüística Aplicada

A aprendizagem como um componente da prática de leitura do artigo científico no meio acadêmico: ESTUDO DE CASO COM TRÊS SUJEITOS EM FASE DE DISSERTAÇÃO

Maria Sirlene Pereira Schlickmann 1
Adair Bonini 1
(1. UNISUL)
INTRODUÇÃO:

A leitura só faz sentido como descoberta, como deslocamento em direção ao (pelo menos relativamente) desconhecido e, nesse sentido, é um processo de transformação do sujeito leitor e de seu conhecimento. Em uma perspectiva de cognição dinâmica (oposta à computacional), leitura pode ser pensada como um processo em constante mutação que se constrói dinamicamente, e que reconfigura os conteúdos (esquemas) mentais. Entendendo a leitura como prática social que ocorre na interação ativa entre leitor, texto/enunciador, o meio circundante, a presente pesquisa discute a interferência da aprendizagem prévia na compreensão leitora e a dinâmica das relações leitura/aprendizagem. Procurou observar como o sujeito leitor considera o seu processo de leitura, em função dos conhecimentos que regem esta prática na comunidade discursiva acadêmica e em função dos conhecimentos novos que estão sendo construídos durante o ato de leitura. Ou seja, procurou investigar como o leitor acadêmico gerencia (e/ou é gerenciado por) aquilo que já sabe e o que se apresenta com novidade na leitura nesta condição específica (o meio acadêmico). Os resultados aqui expostos podem ser úteis principalmente no que tange ao ensino. Em termos aplicados, esta pesquisa pode contribuir tanto ao ensino de leitura quanto ao ensino de um modo geral, uma vez que a leitura é um elemento fundante do processo ensino-aprendizagem.

METODOLOGIA:

Para considerar essa problemática, o processo de leitura do gênero artigo científico foi investigado através de experimento ou experiência em que se utilizou a metodologia introspectiva e a técnica de protocolo verbal. O estudo foi realizado com 3 sujeitos/estudantes de mestrado, em fase de dissertação, e a eles foi solicitado que lessem um artigo de sua escolha pessoal, pois se queria observar o processo de leitura da forma mais natural possível (sem a artificialidade da situação de laboratório). Considerando toda a subjetividade que está em jogo em pesquisa desta natureza, os dados foram analisados qualitativamente. Por se tratar de um projeto amplo e complexo, esta pesquisa visa ser apenas uma varredura inicial.

RESULTADOS:

Sem a pretensão de fechar a discussão, pode-se dizer a partir dos dados que os aspectos da aprendizagem que intervêm no processo de leitura do leitor do meio acadêmico estão bastante relacionados aos seus objetivos de leitura e, nos três sujeitos aqui estudados, estes também estavam conectados com os objetivos de aprendizagem. Porém, durante os episódios de leitura percebeu-se que o resultado da interação leitor/ texto diferiu entre os leitores e, conseqüentemente, a compreensão e a aprendizagem. E aí, penso, entra o papel da aprendizagem. Ou seja: os leitores que já tinham maior conhecimento sobre o conteúdo do texto, que em certo grau já adentraram naquela comunidade discursiva, como foi o caso do S2 e S3, esses aproveitaram mais a leitura, chegando a compreensão e aprendizagem, tanto no plano central como periférico do texto lido, interna e externamente. O mesmo não aconteceu no episódio de leitura do S1. Este leitor teve apenas compreensão e aprendizagem periférica do texto lido, isto olhando-se internamente para o seu episódio de leitura. O S1 inclusive se posiciona sobre esse aspecto: “eu cheguei a uma compreensão superficial do texto, não houve uma compreensão mais profunda”. Na análise desse episódio de leitura detectou-se que este leitor, externamente, não adentrou no mundo do escritor.

CONCLUSÕES:
Os resultados apontam que quando o leitor trouxe na sua memória enciclopédica, conhecimentos que possibilitaram gerar conexões entre o que sabia e a novidade trazida pelo escritor, isso contribuiu para uma maior interação entre os dois mundos (do leitor e do escritor), e conseqüentemente para gerar sua compreensão e ampliar a aprendizagem. Porém, quando o leitor demonstrou não possuir âncora (conhecimentos anteriores, quando não adentrou ainda na comunidade discursiva, cf. Swales) para sustentar a reflexão/interação, promover a compreensão e aprendizagem, esta não aconteceu e o leitor permaneceu em situação de desacoplamento estrutural e ontogênico em relação ao meio-artigo. Em termos conclusivos, pode-se afirmar, a partir da presente pesquisa, que não é possível entender como se desenvolvem os processos de leitura e aprendizagem no meio acadêmico sem considerar todos os contextos que envolvem esse processo (tanto do mundo do leitor quanto do escritor). Tais discussões, na atualidade, precisam estar pautadas na abordagem dinâmica e sistêmica que considera o ser vivo como totalidade. Também é importante dizer que embora tenhamos realizado esta pesquisa com sujeitos com maior grau de proficiência, ficou a pretensão de, a posteriori, estudar como esse fenômeno ocorre em leitores ainda mais experientes, com maior grau de proficiência (por exemplo, os professores da pós-graduação stricto sensu).         
 
Palavras-chave: Leitura; Cognição; Artigo científico.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006