IMPRIMIR VOLTAR
G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 8. Psicologia do Trabalho e Organizacional

O SOFRIMENTO PSIQUICO EM PORTADORES DE LESOES POR ESFORÇOS REPETITIVOS RELACIONADAS AO TRABALHO (LER/DORT) NA INDÚSTRIA DO CALÇADO EM CAMPINA GRANDE-PB

Keila Kaionara Medeiros de Oliveira 1
Edil Ferreira da Silva 1
Kalyana Cristina Fernandes de Queiroz 1
Natércia Janine Dantas da Silveira 1
(1. DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA, UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA/UEPB)
INTRODUÇÃO:

A liberação do homem dos esforços físicos e dos constrangimentos do trabalho não se concretizou com o advento da automação, das novas tecnologias e as novas formas de gestão. O número crescente das perturbações físicas, somáticas e psíquicas evidencia a manutenção de um modelo de acumulação predador da força de trabalho. As indústrias de calçados instaladas na Paraíba, setor alvo de nossa pesquisa, estão inseridas no circuito internacional de exportação e a atividade dos trabalhadores deste ramo produtivo, é realizado sobre condições extremamente adversas. A repetição dos movimentos, a cronometragem do tempo, maior produtividade em menor espaço de tempo, as pressões dos superiores, tudo isso têm causado ônus à saúde física e mental do trabalhador. A sinergia destes fatores tem produzido as Lesões por esforços Repetitivos (LER) que são entendidas hoje como uma “síndrome clínica” caracterizada por dor crônica, inchaço, perda da resistência muscular, do controle dos movimentos, acompanhada ou não por alterações objetivas e que se manifesta principalmente nos membros superiores em decorrência do trabalho. Esta pesquisa tem como foco a problemática dos portadores de LER/DORT que trabalham na Indústria do Calçado em Campina Grande-PB. Busca analisar a relação das condições e organização do trabalho com a saúde física e mental dos trabalhadores, a forma como eles adoecem, porque adoecem e as defesas individuais e coletivas no enfrentamento da doença.

METODOLOGIA:

A presente pesquisa é do tipo transversal, descritiva e analítica, pautou-se por uma abordagem metodológica quali-quantitativa, com o intuito de melhor apreender a complexidade do tema em análise. A partir desta direção metodológica consta a realização de entrevistas individuais semi-estruturada com uso de um roteiro e a aplicação de 02 tipos de questionários sobre saúde e trabalho, aplicados em 10 trabalhadores(as) portadores de LER/DORT, que foram atendidos no setor de Fisioterapia em uma Clínica particular de Ortopedia e Trauma no município. O uso dos questionários visou obter um número significativo de informações, tanto das condições e organização do trabalho, como da saúde, para analisar os diversos fatores presente na atividade destes trabalhadores(as) e suas conseqüências no processo saúde-doença. Complementarmente foi feito um levantamento das Comunicações de Acidentes de Trabalho (CAT) de LER/DORT enviadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ao Centro de Referência Regional em Saúde do Trabalhador de Campina Grande (CEREST-CG). Os dados foram cruzados com os da clinica particular para se averiguar o nível do problema em Campina Grande e ainda serviram para dar uma visão macro de como se encontram os numerosos casos de LER/DORT no município. Os dados das entrevistas foram analisados de acordo com a abordagem da análise de conteúdos, a partir da análise temática (MINAYO, 1996). Os dados dos questionários foram tabulados através do SPSS.  

RESULTADOS:

De acordo com os dados obtidos podemos traçar um perfil dos trabalhadores entrevistados: a faixa etária mais atingida é dos 26 aos 35 anos; sexo masculino; a maioria concluiu apenas o ensino fundamental e trabalha nos setores de acabamento; membros mais atingidos são os ombros e punhos; as síndromes mais comuns são as tendinites e tenossinovites; período de afastamento do trabalho para fazer tratamento varia de 15 dias a 02 anos; as exigências incluem uma produção que varia de 44 a 50 caixas (com 12 pares cada) por hora, o que equivale a uma média de 09 pares de calçado por minuto. Conforme o depoimento, a maioria passa um longo período sentindo dores até procurarem um médico e um dos motivos que justificam esta atitude é a perda da possibilidade de receber um prêmio dado pela empresa, pois só concorrem ao prêmio os trabalhadores que não apresentam atestados com mais de 03 dias no ano. Além do aspecto econômico tem também uma justificativa psíquica, a supressão pulsional. A queixa principal e sempre relatada nas entrevistas gira em torno da cobrança quanto à produtividade e o ritmo de produção acelerado. O presente estudo levantou as estratégias coletivas e individuais utilizadas pelos portadores de LER/DORT: a negação da doença, ou não querer pensar acerca do problema, para que assim eles possam continuar trabalhando. A auto-aceleração é outra estratégia de defesa empreendida pelos(as) trabalhadores(as) em face das normas de produtividade.

CONCLUSÕES:

As LER/DORT têm se tornado um problema de saúde pública, uma vez, que os serviços do SUS acabam sendo procurados pelos trabalhadores doentes, para se estabelecer o nexo causal dos agravos, e pelos crescentes gastos da Previdência Social com auxilio doença. É também um problema social, trazendo conseqüências para a vida familiar. Alguns deles saíam de casa para não ter que brigar com os filhos quando não suportavam mais a dor física. O processo e organização do trabalho empreendido na empresa, não levam em consideração o bem estar dos trabalhadores. Os prêmios por produtividade, a competição existente entre as células e a coação que se impõe sobre os trabalhadores impelem a auto-aceleração do trabalho, cujos efeitos somente serão percebidos posteriormente. Existe um medo gerado no trabalho em não se conseguir dar conta da produção e o receio de perder o emprego. Encontramos trabalhadores nas mais diversas situações: os que não conseguem mais trabalhar no mesmo processo produtivo, que na maioria das vezes são obrigados a largarem seus empregos, outros negam a dor para continuar trabalhando e não perder seus empregos e outra parte não conseguindo mais suprimir a dor acaba no SUS ou nas clinicas particulares usando o plano de saúde pago pela empresa para tratar dos problemas relacionados ao trabalho. A esperança desses portadores é poderem voltar a trabalhar. Fica então o enigma: é possível se produzir com este processo e organização do trabalho e não adoecer?

Instituição de fomento: PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA - PIBIC/CNPq
Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: LER/DORT; SOFRIMENTO PSÍQUICO; SAÚDE DO TRABALHADOR.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006