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C. Ciências Biológicas - 4. Botânica - 2. Botânica Aplicada

ETNOBOTÂNICA DO PÂNTANO DO SUL COM ÊNFASE EM ESPÉCIES DE RESTINGA: UTILIZAÇÃO DE ESTÍMULOS PADRONIZADOS

Victoria Duarte Lacerda  1
Sara Divina Melo da Silva 1
Flávia Camargo de Oliveira  2
Tatiana Mota Miranda  2
Natalia Hanazaki  3
(1. Acadêmica do Curso de Graduação em Ciências Biológicas, CCB/UFSC; 2. Mestranda do PPG Biologia Vegetal, CCB/UFSC; 3. Professora do Departamento de Ecologia e Zoologia (ECZ), CCB/UFSC)
INTRODUÇÃO:

A etnobotânica de pescadores artesanais da região litorânea brasileira tem sido estudada nas últimas duas décadas, principalmente. O foco deste estudo é a população do Pântano do Sul, bairro tipicamente pesqueiro de Florianópolis, no qual grande parte da população pratica atividades de pesca artesanal e mantém uma identidade cultural com o modo de vida açoriano, mas também sofre considerável influência do meio urbano. Apesar do desenvolvimento de estudos etnobotânicos no litoral brasileiro, são poucos os estudos que enfatizam áreas particularmente frágeis, como as restingas. Tal vegetação compreende principalmente formações herbáceas, subarbustivas e arbustivas, predominantes nas áreas de duna frontal e adjacências. Apresenta em geral tamanho de até 1,5 m e baixa diversidade de espécies, sendo considerado um ambiente vulnerável, mas de grande importância por fornecer abrigo à fauna local e exercer papel fundamental para a estabilização dos sedimentos e a manutenção da drenagem natural. O objetivo geral deste projeto é de analisar o conhecimento etnobotânico de uma amostra dos moradores da Praia do Pântano do Sul, com enfoque em espécies nativas de restinga. Especificamente, este trabalho visa efetuar um levantamento do conhecimento etnobotânico sobre as espécies de restinga utilizando estímulos padronizados, através de uma metodologia de entrevistas com checklist.

METODOLOGIA:

Foram escolhidas 10 espécies nativas, características da vegetação de restinga, baseado em estudos etnobotânicos efetuados em outras localidades com formações vegetais semelhantes [1-Achyrocline satureioides (Lam.) DC., Asteraceae; 2-Guapira opposita (Vell.) Reitz., Nyctaginaceae; 3-Schinus terebinthifolius Raddi, Anacardiaceae; 4-Cordia curassavica Roem. & Schult, Boraginaceae; 5-Lantana sp., Verbenaceae; 6-Spartina sp., Poaceae; 7-Chenopodium sp., Chenopodiaceae; 8-Dodonaea viscosa (L.) Jacq., Sapindaceae; 9-Ipomoea pes-caprae L. R. Br, Convolvulaceae; 10-Hydrocotyle umbellata L., Apiaceae]. As entrevistas foram baseadas em uma pergunta-chave (“Você conhece esta planta?”), mostrando a cada entrevistado uma amostra de cada espécie, sempre na mesma seqüência, acompanhada por uma foto de um exemplar com flor ou fruto. Se a resposta era afirmativa, era perguntado também se a planta tinha alguma utilização. Foram anotadas informações sócio-econômicas de cada entrevistado, tais como sexo, idade, principais atividades econômicas. As entrevistas foram efetuadas nas residências dos moradores, com um esforço amostral de 20% das famílias residentes na Praia do Pântano do Sul, com base em sorteio a partir de um mapa do bairro. Foram estabelecidos critérios para a padronização das entrevistas, tais como: entrevistar apenas moradores há pelo menos cinco anos no local; adultos (com mais de 18 anos) e apenas uma pessoa por residência.

RESULTADOS:

Somou-se um total de 43 entrevistas, sendo que 84% de pessoas entrevistadas foram mulheres e mais da metade delas trabalham em casa (do lar). A média de plantas reconhecidas por entrevistado foi 7,26 (d.p. 2,6). Das plantas mostradas, a espécie mais reconhecida pela população local foi S. terebinthifolius, aroeira, seguida por H. umbellata, pata-de-vaca e D. viscosa, vassoura. As espécies menos conhecidas pelos entrevistados foram Chenopodium sp., erva-de-santa-maria e e G.opposita, maria-mole. O critério estabelecido para identificar se a planta era reconhecida ou não pelo entrevistado foi perguntar se ele conhecia a planta mostrada, mesmo se não lembrasse ou não soubesse o nome da planta, mas afirmasse tê-la visto na restinga. Em relação ao uso mais comum das plantas pode–se citar: D. viscosa usada para varrer casa, C. curassavica, caramona, que tem frutos comestíveis, a H. umbellata, com propriedade medicinal.  Chenopodium sp. é utilizado contra a ocorrência de parasitos, G. opposita é utilizada como ração de cabra e o S. terebinthifolius é usado na alimentação de aves e como anti-séptico bucal.  Spartina sp. foi chamada capim, e é usada na fabricação artesanal de cestaria. A. satureioides foi reconhecida como macela e variantes do nome, usada para encher travesseiros com as flores. Lantana sp., denominada de bem-me-quer-mal-me-quer, possui uso lúdico. I. pes-caprae, cipó-da-praia é usada para carregar peixe e enfeitar pratos típicos da região.

CONCLUSÕES:

A grande porcentagem de mulheres na amostra deve ter sido influenciada pelo horário das entrevistas e pelas atividades relacionadas aos trabalhos domésticos. Apesar da maioria dos moradores reconhecerem elementos da vegetação de restinga, algumas pessoas não reconheceram nenhuma planta, refletindo a sua pequena interação com o ambiente natural. A maioria dos moradores não reconhecia nenhuma utilização das plantas, salvo algumas exceções, geralmente quando o entrevistado era alguém mais velho. A utilização das plantas variou desde uso medicinal, doméstico, lúdico, a artesanal, incluindo percepção quanto à função ecológica da vegetação, como no caso da Spartina sp., associada à fixação de dunas. O uso da metodologia com estímulos padronizados e aleatorização das entrevistas possibilitou um diagnóstico geral sobre o conhecimento médio da população do bairro estudado sobre alguns elementos da vegetação de restinga. O conhecimento sobre as plantas selecionadas para este estudo não é homogeneamente distribuído, pois apesar da maioria das plantas terem sido reconhecidas pela maioria dos entrevistados, nem todos os entrevistados souberam associá-las a um nome e/ou a uma utilidade. Sugere-se que seja efetuado um estudo utilizando amostragem intencional de informantes-chave, para complementar o diagnóstico sobre o conhecimento etnobotânico de espécies de restinga na região. Tais informações podem subsidiar ações de extensão visando valorizar o conhecimento etnobotânico local.

Instituição de fomento: PIBIC; FUNPESQUISA; FAPESP
Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: etnobiologia; métodos; uso de plantas.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006