IMPRIMIR VOLTAR
G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 7. Psicologia do Ensino e da Aprendizagem
INTERDISCIPLINARIDADE NA CONVERGÊNCIA ENTRE ARTE E PSICOLOGIA: REFLEXÕES SOBRE UM PROCESSO CRIATIVO

 

Regina Lara Silveira Mello 1
(1. Universidade Presbiteriana Mackenzie)
INTRODUÇÃO:

Muitas pesquisas convergindo arte e psicologia ressaltam notadamente as possibilidades terapêuticas decorrentes desta união. Neste estudo pretendemos refletir quanto às formas de pensar e criar de um artista plástico, uma designer gráfica e um arquiteto que fizeram trabalhos específicos resultando num único produto criativo. Acreditamos que o estudo da criatividade pode ser uma forma de encontro entre a arte e a psicologia, para além da arte-terapia. Por muito tempo a criatividade foi entendida como loucura, dom divino ou exclusividade de artistas e gênios. Estudos psicológicos enquadraram o pensamento criador como uma atividade mental comum, acessível a todo ser humano e aplicável em todos os domínios. Neste caso é demonstrado um processo criativo interdisciplinar que uniu profissionais de áreas distintas com linguagens e procedimentos próprios, porém situadas em campos epistemológicos próximos: arte, design e arquitetura. Transpareceram características comuns apontadas por estudiosos da criatividade como a capacidade de criação e exploração de imagens de longo alcance, o rabiscar pensando com as mãos, a disponibilidade para o acaso além das relações entre palavra e imagem, tema recorrente no estudo da arte e da psicologia. Baseamos-nos na criação do Memorial Rezende Barbosa (Assis), planejado e implantado pelo arquiteto Paulo Barbosa que convidou a designer Margarete Takeda para criar a identidade visual e o artista Arnaldo Battaglini para criar uma escultura.

 

METODOLOGIA:

O estudo realizado insere-se dentro de uma abordagem qualitativa de pesquisa, onde realizamos entrevistas à designer, ao artista e ao arquiteto com questões abertas que nos permitiram revelar os processos criativos pela visão de cada criador.  Filmadas com uma câmera Mini DV e fotografadas em alta resolução, as imagens mostram desde projetos e rascunhos até a obra completa. Iniciamos na serralheria onde foi feita a escultura, em São Paulo (maio e junho/2005). Ali o artista revelou dificuldades, observações e decisões que geraram mudanças imediatas de procedimento, conforme a matéria, ferro, assim o exigia. Acompanhamos o transporte e a instalação da escultura em Assis e fizemos mais duas entrevistas ao artista em seu ateliê, conhecendo sua obra, o que nos permitiu estabelecer relações formais e aproximações temáticas com este trabalho. A designer atendeu-nos por duas vezes em seu estúdio (maio/2005), apresentou a equipe, mostrou as imagens e as palavras-chave que fundamentaram a criação da marca, explicando detalhadamente o processo criativo. Em entrevista em seu escritório, o arquiteto comentou o planejamento e implantação do memorial, o relacionamento com a família Rezende Barbosa, a definição das etapas para sua consolidação e a criação de uma praça. Filmamos também alguns diálogos do artista com serralheiro, da designer e suas assistentes e do arquiteto com o artista na busca de soluções ao projeto do memorial.

RESULTADOS:

Renato Rezende Barbosa chegou à região de Assis em 1947, conhecida produtora de café a noroeste do estado de São Paulo. Após sucessivas geadas e a desvalorização do café, ele decidiu mudar o plantio para cana de açúcar e construiu imenso patrimônio, liderado pela Usina Nova América. No desejo de preservar e compartilhar suas memórias, a família cria o Memorial Rezende Barbosa. O arquiteto criou um espaço na cidade para abrigar o Centro de Documentação e o Salão de Exposições, de fácil acesso a população; dentro da Usina Nova América, a 30 km de distância, construiu uma praça com uma escultura para marcar o lócus dos principais acontecimentos desta história. Enquanto se reformava uma antiga casa da família, 9000 documentos como fotos, cartas e mapas foram catalogados e preparados para consulta pública. A designer gráfica criou a marca Memorial Rezende Barbosa que seria sua identidade visual em placas, em papeis e no futuro site do memorial. A escultura foi encomendada ao artista plástico como uma releitura desta marca (termo de uso freqüente no campo das artes plásticas). O arquiteto projetou uma praça no centro da Usina, situada entre a igreja e a sede administrativa, como um espaço de convivência e também uma base à escultura. O material fotográfico da pesquisa e um filme de 14 min realizado com imagens das entrevistas foram reunidos na exposição “O jogo da Memória”, que inaugura o Memorial Rezende Barbosa, revelando ao público as etapas de seu processo criativo.

CONCLUSÕES:

O trabalho revelou significativas particularidades nos processos criativos dos três profissionais. A visão do arquiteto que planeja, anda pelos espaços acompanhando o antes e o depois, estabelecendo a comunicação entre cliente e criadores. E também capaz de pensar sutilezas como construir a praça a partir dos caminhos marcados na grama amassada pela circulação de pedestres e ao mesmo tempo organizar a ampla rede de diferentes agentes, mantendo o rumo do processo. A designer baseou a criação da marca em palavras-chave escolhidas em sessões de brainstorm (tempestade de idéias), técnica utilizada para estimular o pensamento divergente. Somou raciocínio lógico, convergindo idéias soltas em conceitos, e intuição para manter os caminhos possíveis à criação. Escolhida entre três desenhos com cinco palavras-chave cada, a marca Memorial Rezende Barbosa é mostrada pelo arquiteto ao artista plástico, convidado a pensar uma escultura. O artista rabisca a forma ancorada em seu repertório artístico criativo e faz maquetes de plástico para mostrar representações tridimensionais da escultura ao cliente. Decide fazê-la em metal, reconhecendo o conteúdo simbólico e estético presente neste material, valioso e tradicional em esculturas desde os tempos mais remotos, além de contemplar a dimensão monumental necessária a sua colocação em uma praça. A exposição inaugural articulou estas diversas linguagens explicando o processo e convidando a comunidade a participar da construção desta memória.

 
Palavras-chave: criatividade; arte; psicologia.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006