Este estudo procura promover uma reavaliação histórica da cidade de Campos dos Goytacazes (RJ), identificando elementos constitutivos da formação de uma cultura e identidade regional perante a trajetória do município no “ciclo do açúcar”, visto que essa atividade agroindustrial foi a principal alavanca econômica da região desde o seu processo de colonização. Neste contexto, os complexos usineiros do Norte Fluminense, mais especificamente aqueles localizados em Campos, emergem na paisagem local como um valioso e complexo objeto-problema, possuindo significações múltiplas e de enorme herança cultural para a história e memória social da região.

A metodologia de pesquisa adotada no presente estudo está fundamentada na reconstituição histórica da atividade açucareira vivenciada pela comunidade campista ao longo do século XX, sendo as balizas para o levantamento dos dados e a decodificação das informações, a busca por registros históricos e fontes textuais e visuais, além de visitas de campo às antigas usinas e suas respectivas vila de operários.

Uma dessas visitas à campo resultou no encontro de dois álbuns de fotografia constituídos por 392 registros fotográficos da época onde a produção do açúcar no Norte Fluminense estava em pulsante produção. Todos as fotos pertencem a Usina Cambaíba e, provavelmente, foram encomendadas pelo usineiro a um fotógrafo profissional que registrou diversos aspectos constitutivos da experiência desse complexo usineiro na esfera de produção açucareira nacional na década de 1950.

Neste sentido, as fotografias atuam como fontes documentais primárias, dispondo de uma grande força contextualizadora e descritiva da cena passada. Desse modo, o registro fotográfico pode ser tomado neste estudo como uma ferramenta de fundamental importância na recuperação também da “história visual” do “ciclo do açúcar” no Norte Fluminense. Assumindo funções reguladoras, compensatórias, legitimadoras e pedagógicas entendidas como indispensáveis na organização e reprodução da vida sócio-cultural e econômica da atividade açucareira em Campos dos Goytacazes.

O levantamento de documentos históricos, incluindo os registros visuais fotográficos, demonstram o traço socioeconômico e cultural de uma sociedade fortemente marcada pela hierarquia, onde a figura do “Senhor de Engenho” ou também conhecido, posteriormente, como “usineiro” era quem ditava as regras do seu “pequeno feudo” representado materialmente pela estrutura física do complexo açucareiro, a usina. O usineiro tinha o poder de mando, atuando como delegado, prefeito e juiz, dessa forma, interferindo nas decisões no campo político, econômico, social e cultural.  O que pode ser constatado ao analisar os registros fotográficos do complexo açucareiro Cambaíba, onde encontram-se fotos da escola da usina, do armazém, das casas construídas pelo usineiro para seus empregados, da igreja localizada em frente ao portão central do complexo açucareiro, etc.

A cultura e as relações sociais oriundas da atividade agroindustrial açucareira nos remete a um resultado inicial reflexivo acerca da cultura multissecular de senhores e peões que se materializou no universo estudado.

A consideração do caso das relações, sobretudo de poder, existente entre usineiros e empregados ainda continuam fortemente presentes na realidade da população campista, de modo a, ainda permanecer o traço socioeconômico de desigualdade e da hierarquia. Em suma, é o caso de enfatizar que o universo da cana-de-açúcar, embora decadente na região, continua fortemente presente na realidade local, através das poucas usinas que ainda operam, dos canaviais que ainda se incendeiam e dos bóias-frias que continuam trabalhando em regime de semiescravidão.