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G. Ciências Humanas - 7. Educação - 12. Ensino de Ciências

As mulheres na área tecnológica: histórias de vida, relações de poder e níveis de consciência da relação ciência, tecnologia e sociedade

Carla Giovana Cabral 1
Walter Antonio Bazzo 1
(1. Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica/PPGECT-UFSC)
INTRODUÇÃO:

Aspectos socio-históricos e epistemológicos de um coletivo de professoras do Centro Tecnológico da Universidade Federal de Santa Catarina (CTC-UFSC) têm sido investigados pela autora, que discute, como tese de doutorado, a possibilidade de construção de um conhecimento dialogicamente situado. Cabral entende que a visão de ciência e de tecnologia (CT) calcada numa pretensa neutralidade das atividades científicas e tecnológicas pode ser desmistificada a partir de uma reflexão crítica das relações entre a CT e a sociedade. Uma atitude feminista é também basilar para que se instaure um processo de transformação. Obstáculos e barreiras às atividades das professoras estão presentes: constatam-se atitudes discriminatórias no cotidiano acadêmico; a necessidade uma conciliação papéis sociais enlaçados em suas histórias de vida e a adoção de diversas estratégias. As suas percepções de CT são construídas principalmente na dinâmica das comunidades científicas. Evidenciar relações de poder desiguais enfrentadas pelo grupo de professoras-pesquisadoras, suas percepções de CT e a incorporação de valores humanistas são objetivos deste trabalho. Numa cena contemporânea em que a presença e a influência da CT são inquestionáveis, é profícuo que se reflita criticamente sobre isso e que passos mais efetivos marquem a produção de conhecimentos com características humanistas e que enlacem uma igualdade/eqüidade de gênero.

METODOLOGIA:

O método biográfico conduziu a pesquisa, em que se utilizou, basicamente a técnica de história de vida. Os relatos foram apurados a partir de um instrumento de pesquisa estruturado, com espaço, entretanto, para discussões, notadamente dos aspectos epistemológicos do trabalho, por meio de entrevistas. A autora optou pelo método biográfico porque ele permitiu (re)construir as histórias de vida das professoras, fazê-las (re)ler presente e passado. Tratou-se, também, de considerar o gênero na história da CT e verificar qual o papel que desempenham essas mulheres na construção de suas próprias histórias. Os relatos foram analisados de acordo com parâmetros definidos por referenciais teóricos como os estudos feministas da ciência e da tecnologia, o campo CTS (relação crítica entre a CT e a sociedade), níveis de consciência (Goldmann, Freire) e a teoria de valores de Lacey. Esses referenciais permitiram exames aprofundados sobre as relações de poder vinculadas às histórias de vida das professoras, de um período que inicia na graduação e se estende até o momento presente. Foi possível também verificar os níveis de consciência das professoras sobre a relação CTS e como os seus valores pessoais e sociais se incorporam ou não nas atividades de CT em que estão envolvidas. Essa pesquisa foi realizada como uma investigação preliminar (Freire), pois existe a intenção da autora de utilizá-la como fundamentação de um programa futuro de formação crítica de professoras/es da área tecnológica.

RESULTADOS:

Do total de pesquisadores nas oito grandes áreas do conhecimento, segundo o censo 2004 do CNPq, 53.162 (60,59%) são homens, e 45.143 (51,45%) mulheres. Na grande área engenharias e ciências da computação, há 13.006 pesquisadores: 9.671 homens (74,35%) e 3.299 (25,36%). É a área mais masculina. No CTC-UFSC, o maior centro de ensino, pesquisa e extensão na área tecnológica, em Santa Catarina, a média de professoras-pesquisadoras é de cerca de 10%. As histórias de vida do coletivo investigado confirmam a existência de discriminação e microdesigualdades, exigindo-lhe, entre outras estratégias, um “esforço a mais” de postura e trabalho. Por vezes afugentadas da pesquisa, deslocam seus interesses apenas para a docência. Temas que historicamente parecem ter “sobrado” na área tecnológica, como os sociais e ambientais, e novas linhas de pesquisa, foram adotados pelo grupo. Desse aspecto, a autora estuda os enfoques nos objetos de pesquisa.  As compreensões de CT das professoras representam uma dinâmica, que varia de uma consciência pouco consistente, mais consistente das relações CTS a uma postura crítica.

CONCLUSÕES:

Os resultados até aqui alcançados mostram que uma consciência um pouco mais consistente, mas tendo a visão tradicional de CT como obstáculo, bem como dificuldades de incorporar valores pessoais e sociais com características humanistas, além da existência de contradições e ou conflitos tende a estar mais presente no grupo. Como já indicado no item “resultados”, as professoras, além da conciliação de papéis que lhes é socialmente imposta, enfrentam a necessidade de mostrar mais para que sejam evidenciadas suas qualidades e competência. Foram relatados poucos casos de discriminação explícita. O que predomina são as descriminações táticas, em que a ironia tem se mostrado um artifício poderoso para mascarar a manifestação da desigualdade de fato. A autora argumenta que o aumento no número de mulheres na área tecnológica deve caminhar de forma articulada a uma transformação consciente de suas compreensões de CT e do estímulo ao desenvolvimento de uma atitude feminista, ainda pouco manifesta no grupo. Um programa de formação crítica das/os professoras/es configura-se como uma ação profícua nessa direção.

Instituição de fomento: Capes (a partir do segundo semestre de 2005)
 
Palavras-chave: Educação científica e tecnológica; Gênero, ciência e tecnologia; Epistemologia.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006