IMPRIMIR VOLTAR
G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 7. Psicologia do Ensino e da Aprendizagem

O MOVIMENTO DOS SENTIDOS DE SI E DE OUTROS MEDIADOS PELA DANÇA

Alice Casanova dos Reis 1
Andréa Vieira Zanella 2
(1. Pós-graduação em Psicologia Universidade Federal de Santa Catarina/ UFSC; 2. Prof. Pós-graduação em Psicologia Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC)
INTRODUÇÃO:

O objetivo desta pesquisa foi investigar o modo como aprendizes de dança do ventre significam a si mesmas como bailarinas. A reflexão pautou-se na concepção marxista de que o ser humano é um sujeito histórico e social, que se constitui enquanto tal a partir de sua relação com os outros, considerando que essa relação é semioticamente mediada. Signos mediam essas relações que, uma vez apropriadas, (re)produzem sujeitos em sua singularidade. A qualidade dessas relações, por sua vez, é condição para se auferir as relações que o sujeito estabelece consigo mesmo, e a dança se apresenta nesse processo como mediação que possibilita o estabelecimento de relações estéticas. Deste modo, situada na interface entre a Psicologia e a Arte, esta pesquisa contribuiu para o desenvolvimento teórico e prático de uma visão de homem como ser criador, o que foi possível com o diálogo polifônico que se procurou estabelecer entre as falas das aprendizes e os aportes teóricos da psicologia histórico-cultural (Vygotski) e da dança (Dantas).

METODOLOGIA:

Para investigar os sentidos que permeiam a relação entre social e singular, mediada pela dança, elegemos como sujeitos 14 meninas entre sete e doze anos de idade, alunas na atividade extracurricular de dança do ventre desenvolvida pela autora principal em uma escola privada de ensino fundamental de Caxias do Sul (RS), no ano letivo de 2005. As falas das aprendizes foram coletadas através de três instrumentos metodológicos: um questionário, que as alunas responderam por escrito logo após o primeiro semestre de aulas, um portfólio (registro em forma plástica e textual) produzido após a apresentação do grupo, realizada em um evento cultural do colégio na metade do segundo semestre, e o depoimento das alunas no encerramento da atividade, registrado em fita VHS e posteriormente transcrito. Em cada um desses instrumentos e a partir de diferentes aspectos, cada uma das pequenas bailarinas falou sobre si a partir do seu dançar. Os dados foram analisados a partir da interdiscursividade entre as diferentes vozes, buscando uma compreensão a partir de um contexto dialógico (Bakhtin).

RESULTADOS:

Nas falas das aprendizes, encontramos uma compreensão da dança como expressão de uma subjetividade que se objetiva no corpo, pelos movimentos: “Para mim, a dança do ventre é o modo de uma bailarina se expressar através de seus movimentos” (Carolina). Essa expressão não se dá no vazio, mas sempre em um contexto relacional, para um auditório social, composto pelos muitos outros (público, professora, colegas), em cuja presença são engendrados múltiplos  sentidos que, uma vez apropriados por elas, num processo permeado pelas emoções, contribuem para que se reconheçam como bailarinas. Essa compreensão desenvolveu-se na direção apontada pelas falas das aprendizes acerca da apresentação do seu dançar: “A apresentação da dança foi muito emocionante, o resultado da dança foi positivo...  O grupo colaborou e a dança ficou ótima, no começo fiquei envergonhada, mas no meio fiquei ansiosa. Minha mãe disse bem assim: Parabéns filha, sua dança foi a melhor. Fiquei contente pelo elogio. Todas ficaram bonitas e fizemos muito sucesso no colégio e todos assobiaram e bateram palmas, foi o melhor dia da minha vida, por isso adoro a dança do ventre!” (Letícia).

CONCLUSÕES:

Entendemos, partindo da análise realizada, que o dançar, enquanto atividade mediadora na constituição do sujeito engendra, a partir de uma experiência sensível que ocorre em um contexto relacional de ordem estética, múltiplos sentidos. Esses sentidos “atravessam” o corpo, se exteriorizam no próprio movimento corporal e são multiplicados ao serem percebidos pelos outros que o ad-miram, retornando por esta ponte que o dançar lança entre eu e o outro, e sendo apropriados pelas aprendizes num processo de (re)significação de si, a partir do qual se reconhecem como bailarinas. No dançar, portanto, encontramos uma relação estética específica, estabelecida não entre um sujeito estético e um objeto estético, mas entre sujeitos envolvidos em um contexto de significações que passam pelo corpo e que permitem que os sentidos inscritos nas formas assumidas por este corpo no dançar, ao serem percebidos por ambos a partir de um olhar estético, (trans)formem em bailarina o sujeito em cujo corpo essas formas se desenvolvem.

 
Palavras-chave: dançar; constituição do sujeito; relação estética.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006