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G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 2. Antropologia da Saúde

NA ENCRUZILHADA UM ENCONTRO DE DUAS MEDICINAS: BIOMEDICINA E MEDICINA TRADICIONAL

Simone Gadêlha Cavalcante  1
(1. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - CPDA)
INTRODUÇÃO:
As práticas populares de cura das rezadeiras de Maranguape foram vinculadas ao sistema público de saúde do município, com a implantação do ProgramaSoro, Raízes e Rezas” para a diminuição da mortalidade infantil. Analisando-se a possibilidade de troca de experiências e de diálogo entre os rezadores com a medicina institucional, em especial com as equipes do Programa de Saúde da Família –PSF, que atuam neste município, estuda-se quais as representações em saúde que estão sendo delineadas a partir desse contato entre os rezadores e os médicos envolvidos no Programa. Busca-se verificar se e de que modo esteencontroentre as medicinas tem produzido uma nova fronteira e novos valores, resultando numa reconfiguração das representações e práticas em saúde. Objetiva-se desse modo, contribuir com uma reflexão sobre as novas relações que se estabelecem entre os curandeiros e os profissionais médicos e os efeitos na comunidade assistida pelo Programa. Bem como também, propõe-se colocar em cena as implicações desse processo de inserção dos rezadores ao sistema público divulgado como um modelomoderno” de política pública em saúde.
METODOLOGIA:
O objeto desta pesquisa é um estudo de caso sobre a incorporação das práticas de cura das rezadeiras pelas políticas públicas no sistema público de saúde. A pesquisa está delimitada ao contexto urbano de Maranguape, zona metropolitana de Fortaleza-Ceará, situada a 26 km de Fortaleza, com 90 mil habitantes. São estudados os seguintes atores sociais: o grupo médico que participa do Programa; as rezadeiras que foram incorporadas ao Programa; e o grupo popular que utiliza os serviços do Posto de Saúde. Na pesquisa de campo foram utilizadas observação direta e entrevistas com questões abertas com os idealizadores do Programa, com médicos, com rezadeiras e com alguns usuários do Posto de Saúde. Em um segundo momento, foi analisado o material escrito para o planejamento e implantação do Programa e o material didático utilizado para capacitação das rezadeiras. Foi estabelecido o recorte temporal delimitando o espaço de tempo entre a implantação do Programa em 1998 e seus resultados alcançados até o ano de 2004, considerando a repercussão que teve na mídia e o reconhecimento pelos órgãos públicos e agências financiadoras de Projetos Sociais.
RESULTADOS:
Para a comunidade há uma nova representação sobre saúde, visto que foi construída uma noção de integralidade. Antes as pessoas recorriam às rezadeiras. Após a implantação do Programa, a rezadeira cadastrada é uma das etapas para o tratamento médico, pois, algumas pessoas escolhem as rezadeiras do Programa, e não as demais, porque estas, depois da reza, estão habilitadas a entregarem uma senha que facilita o atendimento no Posto de Saúde.
CONCLUSÕES:

A institucionalização da medicina tradicional tem sido utilizada como “barganha” política. Para as rezadeiras cadastradas, algumas-bem poucas, há uma mudança de sua auto-estima, pois passaram a ter reconhecimento de sua prática pelas Instituições Oficiais. Para outras - um número bem expressivo, entretanto, essa consciência não existe, elas apenas cumprem o que lhes foi “ensinado” pelos agentes de saúde. Do ponto de vista do poder público, a valorização das rezadeiras como agentes públicos de saúde tem permitido ampliar a capilaridade do sistema, especialmente no que diz respeito à porta de entrada para o atendimento. A incorporação das rezadeiras pelo sistema público de saúde evidencia mais uma forma de controle, pois, está vinculada aos mesmos princípios que norteiam a prática biomédica, onde a medicina funciona como um fator regulador das funções do Estado, que através de normas, intervenções e medicalização crescente resultaram, cada vez mais, no afastamento do indivíduo como objeto da medicina.

 

 

Instituição de fomento: CNPq
 
Palavras-chave: biomedicina; rezadeiras; representações em saúde.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006