O cientista faz uso do discurso científico para divulgar suas pesquisas através da elaboração de artigos a serem publicados em periódicos ou revistas especializadas. Com a utilização de uma linguagem que visa à objetividade, o texto de divulgação científica permite a aproximação entre leitor e texto. Um gênero textual como o artigo científico utiliza vários recursos para organizar as informações que veicula. Com esta pesquisa, pretendemos observar a forma como os autores organizam as informações em artigos científicos, na área de Letras, tendo como principal objetivo analisar os processos de referenciação anafórica utilizados nesses textos. Discutimos dois conceitos fundamentais para o processo de referenciação: informação dada e informação nova. Partimos de uma concepção interacional da língua, que compreende o texto como o próprio lugar da interação, uma vez que o sentido é construído na interação texto-sujeitos, de forma processual. Definimos nossas categorias de análise, classificando as anáforas em dois principais grupos: anáforas com retomada de antecedentes textuais (correferenciais) e anáforas sem retomadas de antecedentes textuais (não-correferenciais).

Tivemos como bases teóricas os estudos de Tomlinn et al. (2000), Koch (2002, 2004), entre outros. A pesquisa caracteriza-se como uma pesquisa documental, com objetivos descritivos e exploratórios, uma vez que, a partir de uma fundamentação teórica e da seleção de categorias de descrição da referenciação, faremos observações, registros, análises, classificações e interpretações dos dados, sem interferir sobre eles. Quanto à forma de abordagem, esta pesquisa mostra-se de cunho qualitativo, pois visa a interpretar os fenômenos e atribuir-lhes significados. Apresentaremos, também, algumas quantificações de maneira a organizar os dados a serem interpretados a partir de suas regularidades. O <i>corpus<i> da pesquisa é constituído de cinco artigos científicos publicados na revista DELTA (Documentação de Estudos em Lingüística Teórica e Aplicada), extraídos de três números especiais. A seleção dos artigos focalizou aqueles escritos por autores brasileiros reconhecidos no campo da lingüística, e que, após uma primeira triagem, nos pareceram exemplificar melhor o assunto abordado. A metodologia de análise seguirá os seguintes passos: identificação das ocorrências de referenciação anafórica; quantificação destas ocorrências e a interpretação das regularidades identificadas.

Ao analisarmos os processos de referenciação utilizados nos textos selecionados, pudemos observar, num primeiro momento, que o tipo de anáfora mais utilizado nos artigos em análise foi a anáfora rotuladora (do grupo das anáforas não-correferenciais), correspondendo a 31,8% das referenciações anafóricas encontradas nos textos. Esse tipo de anáfora caracteriza-se pelo uso de uma forma nominal para recategorizar termos precedentes do contexto, encapsulando-os sob um determinado rótulo, ou seja, as formas utilizadas resumem e retomam conteúdos já introduzidos no texto. Destacamos, ainda, que as anáforas por repetição total e por repetição parcial foram utilizadas numa regularidade quase que equivalente, correspondendo, respectivamente, a 28,6% e 26,9% das ocorrências identificadas no artigo.

Com os resultados, comprovamos que os processos de referenciação são indispensáveis às práticas não só de um gênero como o artigo científico, como também a toda e qualquer produção da linguagem, uma vez que contribuem para o encadeamento das informações veiculadas nesses textos. Acreditamos que os resultados obtidos devem-se à própria caracterização do artigo científico, como um gênero que reúne informações de várias fontes, tendo que se utilizar de tais recursos para melhor organizar os dados que veicula. Acreditamos que a presente pesquisa possa contribuir para uma melhor descrição dos mecanismos lingüísticos utilizados no artigo científico e, do ponto de vista prático, para o ensino de técnicas de leitura direcionadas para esse gênero textual.