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G. Ciências Humanas - 7. Educação - 12. Ensino de Ciências
O professor de ciências e biologia: a tarefa educadora e os problemas de saúde
Luciana Pinheiro 1
Ademar Heemann 1
(1. UFPR, Doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento)
INTRODUÇÃO:
O professor de ciências e biologia, especialmente em pequenas comunidades, é visto também como agente de saúde. Comumente são levados a ele problemas relacionados com parasitoses, dst, planejamento familiar, drogas, meio ambiente, etc. Nesse contexto da educação vinculada ao cotidiano, educadores como Frota-Pessoa, Aratangy, Toledo Filho e Hennig propõem projetos em biologia educacional que motivem a cooperação dos professores nas atividades sanitárias dos alunos mediante o entrosamento da escola com centros de saúde, difundindo noções de higiene e profilaxia. O professor pode abordar esses temas utilizando em sala de aula o método dos problemas (em que, diante de alguma dificuldade real, o aluno parte em busca de uma solução) e a técnica de projetos (que desperta curiosidade, criatividade, receptividade para novos conhecimentos, interesse comunitário, atitudes científicas). Com esses recursos, admite a potencialidade do aluno para o desenvolvimento de seu espírito científico. Para essa tarefa educadora, está ao alcance do professor uma postura compreensiva nos termos filosóficos da hermenêutica. Com o exposto acima, objetivou-se promover um encontro e debate entre duas gerações: dois olhares que precisam convergir: o do aluno, com sua realidade, suas perplexidades e indagações, e o do professor, com sua perspectiva sanitária e educacional. A partir desse referencial teórico compreensivo, fez-se um estudo de caso em sala de aula sobre um tema associado à saúde da comunidade.
METODOLOGIA:
A pesquisa, realizada em 2001, compreendeu uma parte teórica e outra de campo. Na escolha das categorias e perguntas de pesquisa foram considerados os folhetos distribuídos pela saúde pública, livros sobre a temática, artigos de jornal e os Parâmetros Curriculares Nacionais. A parte prática da pesquisa levou em conta o conhecimento tácito (oriundo do senso comum) dos alunos. Eles foram inquiridos quanto à sua opinião a respeito da importância do uso de métodos anticoncepcionais, bem como seu background relativo ao tema. Em entrevista aberta, perguntou-se: 1) Você acha importante o uso de anticoncepcionais? Por quê?; 2) Você conhece os diversos métodos anticoncepcionais? Se os conhece, cite-os; 3) O que atrapalha no uso dos métodos anticoncepcionais?; 4) Você já usou, usa ou usaria algum método anticoncepcional. Qual? Se você não usou, mas usaria, explique em que situação (quando e por quê). A partir das respostas, elaborou-se um questionário fechado a fim de se ouvir a opinião direta de um número maior de estudantes: 51 alunos do período noturno de uma turma de 4ª fase (10 do gênero feminino e 12 do gênero masculino) e duas turmas da 6ª fase (17 do gênero feminino e 12 do gênero masculino) do ensino médio de uma escola estadual da periferia da cidade. Na organização dos dados, as respostas foram agrupadas em classes segundo série escolar, gênero, idade, renda familiar e religião. A partir dos gráficos e tabelas resultantes, procedeu-se a análise e interpretação dos dados.
RESULTADOS:
Quanto à faixa etária, os alunos entrevistados mostravam o seguinte perfil: tinham entre 15 a 37 anos, com predomínio de 15 e 17 anos (55%), e entre 18 e 20 anos (33%). 86% eram católicos, 6% evangélicos e 2% testemunha de Jeová; 6% não mencionaram a filiação religiosa. A renda familiar mensal variou de R$200,00 a R$2.000,00, predominando a renda entre R$ 600,00 e R$900,00. Perguntas relativas à percepção dos alunos sobre anticoncepção e sua importância revelaram, em suas respostas, que 96% acham importante e 4% afirmaram ser desnecessária a preocupação com isso. Indagados dos motivos, dentre as alternativas propostas, a maioria citou a prevenção de gravidez indesejada (86%) e de risco de gravidez (59%). 96% alunos responderam conhecer os diversos métodos anticoncepcionais. As alternativas mais citadas desses métodos foram: preservativo masculino (96%), pílula anticoncepcional (76%) e laqueadura (72%). Sobre fatores que atrapalhariam o uso dos métodos anticoncepcionais, destacaram-se as respostas "nada atrapalha", "falta de informação" e "ter problemas com hormônios". Dos 51 depoentes, 45% afirmaram que ainda não usaram, 27% usam, 20% já usaram algum método anticonceptivo e 8% não responderam. Os resultados aqui apresentados ilustram uma realidade específica (uma escola, numa determinada época): um assunto atrelado à informação e, portanto, extremamente dinâmico.
CONCLUSÕES:
O presente estudo, baseado em categorias hermenêuticas para encarar o diálogo professor-aluno sobre esse delicado assunto, esclareceu algumas questões sobre o tema anticoncepção e planejamento familiar, destacando o fato de que os alunos já possuem razoável informação sobre o discurso da saúde pública no que diz respeito à utilização de métodos anticonceptivos. As respostas dos sujeitos da pesquisa mostraram que eles conhecem o discurso das campanhas da saúde pública em prol do uso de anticonceptivos. Outrossim, as análises dos dados suscitaram diferentes indagações a serem consideradas em futuras pesquisas, como as que seguem. Como os professores de ciências e de biologia, pais e alunos lidam com a grade curricular, em se tratando do tema da orientação sexual? Qual o significado e relevância desse tema e como isso afeta suas vidas? Conhecer as campanhas do setor da saúde pública basta para elas atingirem efetivamente as metas governamentais? Qual a distância entre o discurso formal e a realidade? Ao concluir-se esta exposição, entendida como exemplo metodológico de uma pesquisa introdutória, convém salientar que o professor se lembre da concepção de ciência de Rubem Alves. Para ele, a ciência se faz em qualquer lugar, com objetos e situações cotidianas, ensinando o educando a ver e a pensar as coisas da natureza. Numa fusão com a perspectiva poética do astrofísico Marcelo Gleiser, trata-se de "ver a ciência com os olhos do poeta e fazer do mistério a luz que ilumina a razão”.
 
Palavras-chave: ensino de ciências; problemas de saúde; tarefa educadora.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006