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F. Ciências Sociais Aplicadas - 4. Direito - 4. Direito Constitucional

A QUESTÃO DA CIDADANIA: DEMOCRACIA E EXCLUSÃO SOCIAL NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO BRASILEIRO

Rosiane Rodrigues Vieira 1
(1. Núcleo de Estudos e Pesquisas Faculdade de Direito Universidade Federal de Goiás)
INTRODUÇÃO:

A Constituição de 1988 instituiu no Brasil um Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, caput), o qual tem por fundamentos a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, bem como o pluralismo político. Da leitura desse dispositivo constitucional, percebe-se que a Carta Magna instituiu não só um sistema democrático no Brasil, mas também lhe especificou importantes missões a serem cumpridas. Isso porque a cidadania garantida pela Constituição extrapola o âmbito dos direitos políticos abarcando também os direitos sociais, ou seja, além de ser a vinculação jurídica do indivíduo a um Estado soberano, a cidadania deve compreender, ainda, uma série de direitos e exigências relativas à garantia de um mínimo existencial. Nessa sistemática, os direitos sociais já não são compreendidos como “caridade” ou “doação gratuita estatal”, mas sim incorporados como qualificadores que permitem o efetivo exercício dos direitos fundamentais e atribuem-lhes uma dimensão necessariamente social. Destarte, nesse trabalho, buscou-se analisar como a concepção de cidadania exigida pelo Estado Democrático de Direito vem sendo exercida e como os elevados índices de exclusão social do Brasil prejudicam o fortalecimento da democracia e de um sistema constitucional que garanta efetividade aos direitos e garantias dos cidadãos.

METODOLOGIA:

Este trabalho foi elaborado utilizando, de forma preponderante, o método dedutivo, partindo-se da análise do disposto na Carta Constitucional para, em seguida, verificar a relação entre suas promessas e a realidade social no que concerne à efetivação de uma cidadania democrática. Adotou-se como principal referencial teórico a hermenêutica constitucional, considerando, para tanto, que a Constituição deve ser compreendida como um documento aberto que exige a participação de todos para a sua efetivação e que se constitui numa ferramenta que está à disposição do intérprete para que faça valer os direitos dos cidadãos. As técnicas de pesquisa utilizadas envolveram tanto a pesquisa bibliográfica, vez que se buscou apoio teórico em livros e artigos, consultando-se fontes primárias e secundárias que se relacionam às temáticas da hermenêutica constitucional, democracia, exclusão social e Estado Democrático de Direito, bem como a pesquisa documental, pois foram consultados documentos contendo estatísticas acerca dos índices de exclusão da sociedade brasileira.

RESULTADOS:

A Constituição Brasileira reserva seu Título VIII para falar sobre os direitos sociais (educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência e assistência social). Isso porque, para a construção de um Estado Democrático não basta garantir a um elevado número de cidadãos o direito ao voto e assegurar-lhes o exercício das garantias individuais. É necessário ainda que se acrescente à noção de democracia a questão da distribuição equânime dos direitos sociais, pois sem condições mínimas de sobrevivência, as liberdades individuais ficam vazias e os direitos fundamentais de liberdade se transformam em privilégios para poucos. Todavia, o sistema democrático brasileiro ainda tem muito a evoluir e a realidade denuncia que as promessas da Constituição de 1988 restam por ser cumpridas. Para se ter uma idéia, segundo dados do IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, no Brasil, em 2004, 33,57% da população - cerca de 59.430.000 (cinqüenta e nove milhões, quatrocentos e trinta mil) pessoas - viviam abaixo da linha de pobreza e 13,13% - aproximadamente 23.240.000 (vinte e três milhões, duzentos e quarenta mil) brasileiros - viviam abaixo da linha de indigência. A existência de índices de exclusão social tão elevados demonstra que para uma parcela considerável de brasileiros o acesso a bens básicos de consumo não é garantido, o que atinge diretamente a dignidade dessas pessoas e lhes impede de participar ativamente da vida política e social, exercendo sua cidadania.

CONCLUSÕES:

A consolidação de um Estado Democrático de Direito, conforme o estabelecido pela Constituição de 1988, exige não só a garantia aos cidadãos dos direitos individuais e políticos (cidadania civil), mas que se adotem medidas proativas de inclusão das parcelas populacionais pobres na sociedade, por meio de políticas sociais garantidoras de um mínimo existencial (cidadania social). Contudo essa mudança do status quo vigente depende de um esforço conjunto dos governantes, sociedade e iniciativa privada no sentido de se desenvolver ações e políticas sociais que dêem resultado na realidade, bem como de uma mudança ideológica para que a Constituição passe a ser compreendida como um diploma aberto e no qual o processo hermenêutico não reste reduzido aos órgãos estatais ou aos participantes diretos do processo, mas sim seja uma atividade que, potencialmente, diz respeito a todos. É preciso atribuir legitimidade ao texto constitucional, o que somente é possível ao conferir-lhe maior sintonia com a realidade, atribuindo-lhe efetividade. Enquanto parcelas consideráveis da população forem ceifadas do acesso aos direitos básicos para uma vida digna, não se poderá falar em sociedade justa ou igualitária nem na existência real de uma democracia participativa e pluralista no Brasil, com uma Constituição respeitada e de grande força normativa. Esse é, exatamente, o grande desafio atual da sociedade brasileira.

 
Palavras-chave: Estado; democracia; exclusão social.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006