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H. Artes, Letras e Lingüística - 5. Semiótica - 1. Semiótica
A ambigüidade de Henrique V  em “Falstaff – O toque da Meia Noite” de Orson Welles. Uma análise semiótica, sob a isotopia psicanalítica, no discurso gestual
Sady Carlos de Souza Júnior 1
(1. FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO DA USP)
INTRODUÇÃO:

Objetivamos conferir a incidência de elementos psicológicos subtraídos de uma análise semiótica de discurso gestual apresentado no filme “Falstaff – O Toque da Meia Noite”, de Orson Welles, no que concerne a um recorte psicanalítico admissível no plano do quadro semiótico greimasiano. O filme Falstaff reúne fragmentos de diversas obras de Shakespeare, tais como Ricardo III, Henrique V e As Alegres Comadres de Windsor em torno de Sir John Falstaff. Este, um  “anti-herói”, retrata a realidade como ilusão de um ideal construído através do engano e da mentira – enredo principal da comédia shakespeareana. Temos um drama em segundo plano que resgata a história de Henrique IV e V (pai e filho), personagens dicotômicos e adversos. Propomos aqui averiguar o conteúdo manifesto numa cena que consideramos antológica da obra, tenha embora a aparência de simples casualidade gestual.

METODOLOGIA:

A historiografia inglesa, ao longo dos registros documentais, tem explorado a biografia de Henrique V atestando duas personalidades diversas: uma antes e outra após sua coroação. Nesta contraposição encontramos os metatermos semióticos do Ser, Parecer, Não-Ser, e Não-Parecer a movimentarem-se dialéticamente na tensão de contrários e contraditórios. Um investimento semântico, de conteúdo analítico, sugere o desenvolvimento discursivo extralingüístico devido a fala parecer quase sempre inverossímil comparando-a a cada comportamento atualizado. Passamos, portanto, a inferir, como metodologia, para os fatos tematizáveis, a formalização metodológica paradigmática e dedutiva (do geral para o particular), ou seja, a partir da concepção freudiana veremos no programa narrativo do filme o significante/forma necessário para atualização semântica. Senão vejamos: em cena, o Rei ao dormir, doente, depõe a coroa real ao seu lado, no lugar da rainha ausente, mãe de Henrique V. Este gesto febril fora interpretado pelo filho, recém chegado ao reino, como sinal de morte, tomando, então, para si, a coroa - objeto de desejo. A ambição em possuir a coroa transmuda-se em remorso, ao perceber o Rei acordado a procurá-la desesperadamente, para encontrá-la esquecida em sua cabeça. A surpresa aflitiva expressada por reter a coroa antes do tempo, e a conseqüente advertência paternal, aparecerá desde já numa emancipação do ideal materno para ascender à figura masculina do poder na sua final reconciliação com o Pai moribundo. A justificação sígnica edipiniana entende aqui a morte do Pai como requisito de acesso ao poder/falo, frente ao outro.

RESULTADOS:

Constatamos diferentes pontos de referências aplicativas ambigüas no discurso - sempre articuladas ao Ser inconstante. O gesto de retirar a coroa da almofada (lugar da Mãe) à direita de seu Pai enseja-nos uma oportunidade sígnica não desprezível, frente ao conjunto de entornos semióticos nos quais se reveste o caso, a ponto deste momento, onde cruzariam actantes contrários do programa narrativo, poder ser considerado o climax da história e onde se resolveriam as questões da ambigüidade inexpugnável das questões da afetividade. Desse modo, por exemplo, percebemos pontos inerentes às duas personalidades adversas em Henrique V: no tempo - diacronicamente (antes e depois da coroação)  e as adversidades psíquicas em relação ao seu Pai/Mãe - sincronicamente, que estão representados pelo comportamento dicotômico vacilante entre a justificativa de uma “anormalidade moral” - pela dor da ausência da mãe, e sua rivalidade intransigente ao pai - pela oposição a um caráter excessivamente dominador.

CONCLUSÕES:

As articulações semióticas corroboram a possibilidade identitária psicanalítica na resolução do suposto conflito edipiniano da figura de “Henrique V”. A atuação de um nobre Rei que na juventude comportava-se diversamente da “boa moral” (freqüentava tabernas, bordéis, convivia com salteadores e falsários), passou a se impor à história como detentor moral de um dos maiores líderes ingleses, contrariamente ao que temia seu Pai. Através dos meta-termos semióticos deônticos do Ser, apresentados no universo deste discurso dramatúrgico, foi-nos possível restaurar a mobilidade do conceito explicativo do homem, aparentemente ambíguo, nesta trajetória narrativa da gestualidade.

 
Palavras-chave: semiótica; gestualidade; psicanálise.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006