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F. Ciências Sociais Aplicadas - 4. Direito - 2. Direito Ambiental

CONSTITUIÇÃO DE 1988, MEIO AMBIENTE E INCLUSÃO DAS GERAÇÕES FUTURAS NA COMUNIDADE POLÍTICA

Danila Gonçalves de Almeida 1
(1. Graduanda, Faculdade de Direito, Universidade Federal de Goiás / UFG)
INTRODUÇÃO:

A ciência e a tecnologia não são suficientes para assegurar respostas satisfatórias à problemática ambiental, que, no contexto de uma “sociedade de risco”, assume proporções globais e transtemporais, desafiando as pretensões de previsão e controle de suas conseqüências. O futuro é conseqüência das decisões tomadas no presente. Contudo, aqueles que viverão no futuro e que, portanto, deveriam ser considerados os maiores interessados, não podem, eles mesmos, defender seus interesses em tais processos decisórios. Decisões tomadas de forma inconseqüente pela geração presente podem reduzir as escolhas disponíveis às gerações futuras quando tiverem que tomar suas próprias decisões e, além disso, submetê-las a um grau de risco que elas não escolheram suportar. Tendo em vista que a Constituição de 1988 institui um Estado Democrático de Direito e, no caput do art. 225, estabelece a base de justificação do princípio da eqüidade intergeracional, deve-se perguntar: seria possível uma ampliação da democracia a termos intergeracionais, de forma a garantir uma reserva da decisão à participação das gerações futuras? De que forma instituir a consideração dos interesses futuros nos processos decisórios? Partindo de uma análise da Constituição de 1988, a presente pesquisa busca verificar a possibilidade de um aprofundamento do processo de democratização, de forma a incluir não apenas a presente, mas também as futuras gerações, na tentativa de se contribuir para a superação da crise ecológica.

METODOLOGIA:

A presente pesquisa utilizou-se predominantemente do método dedutivo de abordagem.  A partir do estudo dos princípios e valores constitucionais em um plano mais geral, e por meio da análise de textos relacionados com a temática do trabalho, buscou-se examinar o alcance do princípio democrático previsto na Constituição, a fim de se verificar a possibilidade de se inserir os interesses das gerações futuras no âmbito das decisões políticas. O referencial teórico-metodológico da presente pesquisa teve como base a hermenêutica constitucional, propondo-se leituras alternativas do texto da Constituição de 1988, tendo em vista a concepção de Peter Häberle de “sociedade aberta dos intérpretes da Constituição”, que rompe com a metodologia jurídica tradicional, a qual restringe a atividade de interpretação dos textos normativos a um seleto grupo de especialistas. Partiu-se também da concepção de Hans-Georg Gadamer, segundo a qual a hermenêutica apresenta-se como um processo permanente de compreensão e autocompreensão, que exige sempre compreensões e noções prévias. Assim, a interpretação das normas constitucionais partiu de uma pré-compreensão dos princípios fundamentais que informam a Constituição. A pesquisa realizou-se no plano teórico, por meio de leitura e análise de textos relacionados com a temática do trabalho. Quanto às técnicas de pesquisa, adotou-se o processo de documentação indireta, por meio do estudo e fichamento de livros e artigos científicos sobre o tema da pesquisa.

RESULTADOS:

O princípio de eqüidade intergeracional baseia-se na idéia de igualdade e justiça entre as gerações. Pressupõe ser cada geração ao mesmo tempo depositária e usuária do patrimônio comum do planeta. Isso implica direitos e obrigações de caráter intergeracional. Embora seja possível haver obrigações sem direitos-reflexos, levar em consideração os interesses futuros por meio unicamente de obrigações em relação às gerações seguintes torna mais fácil o desvirtuamento pela geração presente do conteúdo dessas obrigações em seu próprio benefício. Impõe-se, assim, o reconhecimento dos direitos das gerações futuras. Estas, não podendo reivindicar pessoalmente os seus direitos, necessitariam, para isso, de um representante. A temporalidade como novo campo de expansão democrática implica a distinção entre o povo atual (que participa das decisões políticas do momento) e o povo perpétuo (sucessão contínua de gerações), verdadeiro titular da soberania. Disso resulta que a soberania do povo atual é limitada, de forma que ele não pode tomar decisões que atentem contra o povo transcendente. Assim, a simples possibilidade de uma decisão causar danos no futuro deve ser suficiente para que se procurem meios alternativos para se atingir os fins visados (princípio de precaução). A oposição entre interesses humanos e equilíbrio ecológico somente se apresenta quando se trata de interesses do povo atual, pois os interesses do povo transtemporal pressupõem necessariamente a manutenção desse equilíbrio.

CONCLUSÕES:

A Constituição de 1988, como instrumento fundador de uma nova sociedade, busca instituir um Estado Democrático de Direito e uma sociedade livre, justa e solidária. Porém, é evidente que seus objetivos não podem ser alcançados de forma imediata, além de não se destinarem à construção de uma sociedade limitada no tempo. Dessa forma, pode-se dizer que a Constituição foi elaborada tendo em vista o povo transtemporal, que não se limita ao presente. Assim, quando o povo atual toma uma decisão que prejudica o bem-estar das gerações futuras, ele está usurpando um poder que somente pertence ao povo transcendente. Além disso, a soberania limitada do povo atual impõe que ele deixe uma margem de flexibilidade para que o povo futuro possa tomar as suas decisões de acordo com o seu próprio sistema de valores. Essa leitura do texto constitucional cria um novo espaço para a expansão democrática, incluindo os interesses das gerações futuras. Dessa forma, importante é a atuação do juiz constitucional na defesa do meio ambiente e do interesse das futuras gerações, pois evita que uma maioria eventual e as opiniões de momento atentem contra os princípios constitucionais, que representam os interesses do povo perpétuo. Também é importante a atuação do Ministério Público, o qual deve se incumbir da defesa dos direitos das gerações futuras (pois, além de se relacionarem com a proteção do meio ambiente, compreendem-se entre os direitos difusos, cuja defesa se inclui no âmbito de atuação ministerial).

 
Palavras-chave: Constituição; ambiente; gerações futuras .
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006