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H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Lingüística - 2. Lingüística Histórica
MUDANÇA NA POSIÇÃO DO ADJETIVO NO SN, EM DIALETOS RURAIS GOIANOS
Tânia Ferreira Rezende Santos 1
(1. Programa de Pós-Graduação em Estudos Lingüísticos/POSLIN-UFMG)
INTRODUÇÃO:
Os dialetos rurais goianos apresentam um quadro de ordenação do adjetivo no SN que parece apontar para um estágio final da mudança AN > NA, em curso na língua portuguesa (LP). Partindo dos pressupostos que a ordem mais antiga, no indo-europeu, é adjetivo+nome (AN); que no latim vulgar havia duas ordens básicas: AN para uma classe especial de adjetivos e NA para a maioria dos adjetivos; que a tendência geral das línguas românicas é a ordem NA; e tendo em vista que a LP é românica, a ordem básica ou não-marcada na LP é NA. Apesar disso, a ordem AN está presente na oralidade e na escrita, formal ou não, dos brasileiros, de forma produtiva. Por outro lado, nos dialetos rurais goianos, a ordem AN predomina em estruturas cristalizadas (EC), indicando a quase totalização da mudança AN > NA. Diante disso, meu objetivo, neste trabalho, é analisar o processo de retenção da ordem AN, nos dialetos rurais sob análise, de modo a identificar os fatores que estão influenciando no retardamento da mudança AN > NA, na LP; e examinar por que, nos dialetos rurais, a ordem AN só ocorre em EC. Essa análise poderá contribuir com o entendimento do processo de mudança AN > NA, na LP.
METODOLOGIA:
Os corpora foram organizados por meio de coleta de dados, com pesquisa de campo, através de conversação espontânea, em duas comunidades rurais, na região norte de Goiás: Pombal – remanescente de quilombo (corpus 1) – e Acaba Vida – remanescente de migrantes mineiros (corpus 2). Foram priorizados os sujeitos mais velhos das comunidades, dentre estes os não escolarizados ou com baixo grau de escolaridade; de ambos os sexos. Posteriormente, foi realizado um inventário com os SNs contendo adjetivo e nome, totalizando 357 SNs. Os dados do inventário foram quantificados e submetidos ao cálculo do Chi-square, a fim de verificar o grau de significância das variáveis AN e NA, em diferentes contextos, e com diferentes variáveis. Os resultados da quantificação dos dados de cada comunidade foram comparados e, a partir daí, passou-se a analisar o processo de mudança AN > NA, nos dialetos rurais goianos.
RESULTADOS:

Nos dialetos rurais sob análise, predomina a ordem NA, o que já era de se esperar; com ocorrência da ordem AN apenas em EC, do tipo “Santo Antônio”, “Véia Gustinha” e “boa intenção”; na anteposição, ocorrem oito (8) itens, no corpus 1, e quatro (4) itens, no corpus 2; na posposição, são trinta e nove (39) itens no corpus 1 e trinta e seis (36) itens no corpus 2; esses itens somam, no corpus 1: 69 ocorrências na anteposição e 190 na posposição, correspondendo a 26,5% (69/259) de AN e 73,4% (190/259) de NA; no corpus 2: 14 ocorrências na anteposição e 84 na posposição, o que corresponde a 18,9% (14/98) de AN e 85,8% (84/98) de NA. Todos os adjetivos antepostos ao nome, nos dois corpora, têm sentido qualificativo e formam EC. O grau de cristalização de uma estrutura pode ser aferido pela perda da gradação e da flexão de número nos adjetivos. Foi verificada a correlação entre a posição do adjetivo no SN e fatores sócio-culturais dos falantes, como grau de escolaridade, sexo e faixa etária, mas sem um resultado considerável. O grau de significância é alto quando se compara o emprego de AN nas duas comunidades: a comunidade de Acaba Vida – migrantes mineiros, da cidade de Governador Valadares, descendentes de italianos – usa mais a posposição e, conseqüentemente, menos a anteposição do que a comunidade de Pombal, em termos proporcionais. As ECs ocorrem também com adjetivos pospostos ao nome, mas em menor proporção, e com possibilidade de flexão de número.

CONCLUSÕES:

Diante desses resultados, fica claro que, no que se refere à mudança na posição do adjetivo no SN, os dialetos rurais se encontram em estágio mais avançado do que os dialetos urbanos estudados por Nobre (1989) e Müller et alii (2002); e do que a escrita estudada por Cohen (1986-1989), Nobre (1989) e Callou (2003). Se comparados os resultados desta pesquisa aos resultados de Cohen (Op. cit.) e de Nobre (Op. cit.), pode-se dizer que: (i) nos dialetos rurais estudados a ordem AN se restringe a ocorrências com EC; (ii) a retenção da ordem AN é devida ao grau de coesão entre A e N, na anteposição, embora haja EC com adjetivo posposto; (iii) devido à ocorrência de AN somente em EC, a mudança AN > NA, nos dialetos sob análise, encontra-se em seu estágio final; e que (iv) a tendência, na LP, é a conservação da ordem AN apenas em EC, como resíduo de estágios pretéritos, porque, nessas estruturas, o adjetivo perde o status de adjetivo.     

 
Palavras-chave: mudança; ordenação; adjetivo.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006