60ª Reunião Anual da SBPC




A. Ciências Exatas e da Terra - 4. Química - 1. Físico-Química

ESTUDO CINÉTICO E TERMODINÂMICO DO FENÔMENO DE MUTARROTAÇÃO DA D-GLICOSE

Pedro Luiz Onófrio Volpe1
Carlos Eduardo Perles1
Heitor Fernando Nunes de Oliveira1

1. Universidade Estadual de Campinas - Instituto de Química - Depto. Físico Química


INTRODUÇÃO:
Glicose é o carboidrato mais importante e abundante na natureza, extremamente utilizado como a principal fonte de energia pelos organismos vivos e, também, como substrato para a biossíntese de compostos importantes. A molécula de glicose, assim como outros poli-hidroxi aldeídos e poli-hidroxi cetonas, quando em solução adquirem uma forma cíclica, com uma quantidade desprezível da forma acíclica (0,01%). Monossacarídeos redutores, como a glicose, quando em solução de solventes próticos, como a água, sofrem uma reação de isomerização conhecida como mutarrotação, fenômeno observado pela primeira vez em 1846, porém, somente compreendido após a descoberta da ciclização dos carboidratos em solução. A mutarrotação é um processo dinâmico resultante de uma reação química que promove a interconversão entre as formas α e β-D-glicose em solução, apresentando cinética de pseudo-primeira ordem. Acontece pela formação e hidrólise de um hemiacetal, por catálise ácida, passando por um intermediário aldeído acíclico. Também é conhecido que, no equilíbrio, a forma beta prevalece sobre a forma alpha, o que se deve a estabilização relativa das formas anoméricas na estrutura tridimensional dos clusters de água.

METODOLOGIA:
Foram preparadas soluções D-glicose (Synth) nas concentrações de 100g L-1 e 72g L-1, para os estudos polarimétricos e calorimetrico/densitometrico, respectivamente. Os experimentos polarimétricos foram realizados em polarímetro automatizado (Perkin Elmer 341) utilizando uma cela polarimétrica termostatizada (caminho óptico 0,1 dm) e lâmpada de sódio (589 nm). A variação da densidade foi acompanhada ao longo do processo de mutarrotação. Preencheu-se a cela do densímetro DMA-450 (Anton Paar) com, aproximadamente, 1mL de solução de glicose recém preparada. A solução foi mantida dentro da cela do densímetro, a temperatura de 298,15K, durante todo o tempo do experimento e os valores de densidade foram periodicamente registrados. Os experimentos microcalorimétricos foram realizados em um calorímetro isotérmico (Thermometric 2277–TAM) equipado com cela de fluxo contínuo confeccionada em ouro, com volume nominal de 0,600 ml. A cela de fluxo foi preenchida com uma solução de glicose recém preparada e o fluxo foi interrompido após o preenchimento da cela. Antes da realização dos experimentos, o canal de fluxo do microcalorímetro, preenchido com água, foi eletricamente calibrado num fundo de escala de 100 μW.

RESULTADOS:
A partir dos experimentos calorimétricos, obteve-se uma variação de entalpia, para a mutarrotação da D-glicose, de -0,58 kJ.mol-1. No equilíbrio termodinâmico obteve-se a razão percentual 36:64 (α/β), de onde foi obtida a constante de equilíbrio (K) para a reação a 298,15K (K = 0,56). Com os valores de K e DH, determinou-se os valores de DG e DS para a reação, utilizando-se as equações termodinâmicas clássicas para energia livre. Os valores obtidos foram: DG = -1,43 kJ.mol-1 e DS = +2,85 mJ.K-1.mol-1, ambos favoráveis à espontaneidade do processo. O termo –TDS (-0,85 kJ.mol-1) nos dá a real magnitude e importância do termo entrópico para a espontaneidade, sendo superior ao valor de entalpia. Esta predominância do efeito entrópico se dá essencialmente pelo novo arranjo estrutural e do sistema água-glicose, teoria que foi reforçada pela observação do aumento de volume molar ao longo da reação. As constantes de velocidade (k) foram obtidas das curvas polarimétricas linearizadas, para 5 temperaturas diferentes: 0.09.10-3 s-1 (283,15K); 0.26.10-3 s-1 (293,15K); 0.41.10-3 s-1 (298,15K); 0.76.10-3 s-1 (303,15K) e 1.79 . 10-3 s-1 (309,15 K). Dos valores de k e T, utilizando a equação de Arrhenius obtivemos a energia de ativação a reação: EA = 72 kJ.mol-1.

CONCLUSÕES:
Utilizando as técnicas de polarimetria, densitometria e calorimetria isotérmica foi possível estudar os parâmetros termodinâmicos envolvidos no processo espontâneo de mutarrotação da D-glicose em solução aquosa. Os parâmetros termodinâmicos obtidos (DH e DS) mostraram que a contribuição entropica para a espontaneidade da reação é mais significativa do que a variação de entalpia. Através do monitoramento, em tempo real, da variação da densidade da solução foi possível constatar que o anômero β-D-glicose apresenta volume molar maior. Embora esta informação experimental seja um indicativo de uma mudança no arranjo espacial água-glicose, fato este reforçado pelo valor de TDS, um conhecimento mais aprofundado deste efeito será em breve investigado utilizando-se cálculos teóricos. Os dados polarimétricos permitiram obter as constantes de velocidade do processo de mutarrotação em diferentes temperaturas assim como a sua energia de ativação.

Instituição de fomento: FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

Trabalho de Iniciação Científica

Palavras-chave:  D-Glicose, Mutarrotação

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