60ª Reunião Anual da SBPC




G. Ciências Humanas - 7. Educação - 8. Educação Matemática

O PENSAR ETNOMATEMÁTICO REVELADO NA ETNOMÚSICA DE INDÍGENAS NA AMAZÔNIA

Patrícia De Campos Corrêa Trindade2

2. Secretaria de Estado de Educação do Pará


INTRODUÇÃO:
Os povos indígenas do Pará conseguiram manter suas culturas e sobreviver às epidemias adquiridas pelo convívio com os não indígenas e aos conflitos gerados a partir desse convívio, isto é, a luta pelas suas terras ricas em minérios e madeiras nobres. A história do Brasil nos mostra que estando os povos indígenas em desvantagem nessa relação conflituosa com os não indígenas, os sobreviventes foram aqueles que em pequenos grupos se deslocaram para regiões de difícil acesso adentrando a mata. Deste modo, preservaram suas vidas, suas memórias tornando-se, portanto, os guardiões de seus saberes milenares. Diante desse cenário nos perguntamos quais saberes matemáticos estão guardados milenarmente? O que podemos aprender com o pensar matemático dos povos indígenas? De que forma esses saberes se revelam no contexto da cultura indígena, no cotidiano da aldeia? Inferimos que esses saberes milenarmente construídos, uma vez revelados, poderiam contribuir para o acúmulo do conhecimento etnomatemático, posto que, acreditamos que cada etnia constrói a sua etnociência no seu processo de leitura de mundo, na sua forma própria e diferenciada de explicar fenômenos complexos e atribuir significados aceitos (negociados) socialmente, que vão desde o seu surgimento até o seu estar nesse mundo.

METODOLOGIA:
A amostra consistiu em 4 alunos da etnia Suruí do povo Aikewara que cursam no Pólo Marabá-PA a primeira série do Curso Magistério Indígena da Escola Itinerante de Formação de Professores Indígenas do Pará. Esses alunos são professores indígenas em formação em nível médio que atuam em sua aldeia. Destes, 75% ensinam língua e cultura indígena e 25% ensinam Matemática. Os sujeitos da presente pesquisa são falantes da língua Tupi-guarani que além do exercício da docência praticam a caça, a pesca, a agricultura de subsistência e a coleta de frutos, sendo a castanha-do-pará a principal atividade econômica desse povo. Somando-se a isso, A escola na qual atuam está localizada na aldeia dos Suruí cuja Terra demarcada em 1983 criou uma situação de que cada indivíduo deve ajudar a tomar conta de toda sua extensão - 26.257,85 hectares com a finalidade de evitar invasões. Deste modo, temos como sujeitos de pesquisa pessoas que não são somente professores nem tampouco somente alunos do curso magistério e, por isso devem ser olhados considerando-se essa complexidade. Aplicamos um questionário com a finalidade de desvelar como o povo Aikewara aprende. Recorremos à entrevista coletiva com o propósito de entender o pensar e o comunicar matemático dos Aikewara.

RESULTADOS:
A proposta do questionário era desvendar como o povo Aikewara aprende. Obtivemos como resposta “nosso povo aprende vendo e ouvindo”. O convívio com os mais velhos - mais experientes, adicionado a tradição oral associada as rodas de conversas, as decisões coletivas, propiciam um ensinar e aprender tradicional por intermédio de observação e de histórias e cantigas. O propósito da entrevista era identificar cantigas que remetessem a um pensar matemático no contexto da cultura. Para os Aikewara a música se revela como uma prática social de caráter comunicativo fortalecedor da identidade cultural e das relações interpessoais. São acompanhadas de danças coletivas e de instrumentos de percussão. Destacamos, neste trabalho, a música intitulada Seengar tea construída com apenas uma única frase: Ipirá nara um gara se kusó. A quantidade vezes que essa mesma frase é cantada é utilizada uma entonação diferente que revela a quantidade de peixes (pirá) que a mulher viu de cima da pinguela. Deste modo, se uma mulher que saiu para a roça e, ao retornar chegou cantando essa música, ela estará comunicando a fartura daquilo que viu e estará anunciando que já é tempo de pesca trazendo alegria para seu povo. Assim, homens se preparam e partem para o rio e mulheres se preparam para receber o pescado.

CONCLUSÕES:
Essa pesquisa nos revela uma música que responde as nossas perguntas iniciais que nos motivaram a nos movimentarmos no sentido de enxergarmos que ainda temos muito que aprender com nossos alunos indígenas – professores em formação. Esse estudo revela sabres milenares que emanam do povo Aikewara, habitantes da floresta da Amazônia paraense, enfocando as práticas acordadas socialmente no contexto da aldeia. A dinâmica específica de ensinamento por meio de cantigas permite que esses conhecimentos sejam guardados e difundidos oralmente de uma geração a outra, aliados ao lúdico, uma vez que a cantiga se transforma em música acompanhada de instrumentos de percussão e dança coletiva, nos mostrando que tem relevância dos aspectos sociais e antropológicos. Ao analisarmos o pensamento que se encerra nesta etnomúsica cuja letra é constituída de rede de significados permitindo ao indígena identificar e distinguir quantidade (de peixes) e tempo (de pesca) reafirmamos o nosso pensar de que a sabedoria dos povos tradicionais precisam ser legitimadas e (re)conhecidas em sua dimensão histórica e cultural contribuindo, portanto, com o acúmulo de conhecimento no campo da etnomatemática.

Trabalho de Professor do Ensino Básico ou Técnico

Palavras-chave:  Etnomatemática, Etnomúsica, Cultura Indígena

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