60ª Reunião Anual da SBPC




H. Artes, Letras e Lingüística - 1. Artes - 3. Cinema

A ANTROPOLOGIA URBANA NO DOCUMENTÁRIO O RAP DO PEQUENO PRÍNCIPE CONTRA AS ALMAS SEBOSAS

GABRIELA LOPES SALDANHA1
NUNO CESAR ABREU2

1. Programa de mestrado em Multimeios -Departamento de Cinema/ Unicamp
2. Prof. Dr. -Departamento de Cinema/Unicamp - Orientador


INTRODUÇÃO:
O trabalho aborda o documentário O Rap do Pequeno Príncipe Contra as Almas Sebosas (2000), dirigido pelos cineastas Paulo Caldas e Marcelo Luna, através de uma perspectiva analítica onde se sobressai uma narrativa estética marcada pelo Cinema Direto. A história de dois jovens, Helinho e Garnizé, moradores de uma das periferias mais pobres e violentas do país, no município de Camaragibe, em Pernambuco, é o que conduz os diretores a discutirem políticas de cultura como combate a criminalidade. Personagens se sobrepõem e são apresentados como retrato de uma antropologia urbana presente em qualquer metrópole que esconde a guerra civil de suas periferias. Esta análise utilizou como fundamento o estudo de Gilles Deleuze sobre o cinema com a função de um devir do pensamento. O objetivo do trabalho é verificar as relações de fabulação estabelecidas no documentário brasileiro contemporâneo quando torna-se impossível, em casos como o do filme analisado, discernir realidade e ficção. A escolha do tema foi estabelecida de acordo com pesquisa que vem sendo desenvolvida pela pesquisadora no mestrado, a respeito do cinema pernambucano contemporâneo, em que O Rap do Pequeno Príncipe aparece como o representante mais relevante da estilística documental.

METODOLOGIA:
O eixo do documentário está nas diferentes perspectivas adotadas pelo jovens Helinho e Garnizé, no entanto, acaba discutindo outras questões subjacentes, como a importância de políticas culturais na periferia, particularmente o rap e junto à ele o movimento Hip Hop; a atuação do poder público; a realidade dos presídios; as contradições sociais do Recife, capital do estado que lidera os índices de violência do país entre os jovens; a fé e a atuação de grupos de extermínio como balizadores da moral para as grandes favelas urbanas. Todas essas questões são tratadas no processo de análise dividindo-se o filme em oito momentos temáticos que pontuam as observações. A metodologia utilizada apóia-se na estrutura qualitativa.

RESULTADOS:
Do ponto de vista estilístico o documentário em questão inova na sua linguagem, com a utilização do grafismo, vertente do movimento Hip Hop , no qual está inserido o Rap . O recurso é utilizado constantemente para marcar o cenário cultural em que se estabelece a discussão. A música, através dos instrumentos de percussão, também está presente com forte apelo aos discursos, sendo marcas visuais recorrentes nas passagens de momentos. Do ponto de vista reflexivo, foi importante para a pesquisa relacionar O Rap do Pequeno Príncipe com outro documentário do mesmo ano, Notícias de uma Guerra Particular (2000), de João Moreira Salles. Ambos se apresentam como documentários de entrevistas, dirigidos por cineastas advindos do jornalismo com forte influência da escola americana, além de abordarem o mesmo universo, a criminalidade nas periferias brasileiras. A respeito deste ponto fica evidente na análise fílmica, no jogo da câmera – campo e extra-campo, que a conversa dos cineastas com seus “objetos” filmados deixa claro um distanciamento social de classes, indícios da problemática pertinente ao documentário brasileiro contemporâneo.

CONCLUSÕES:
Para a estilística do documentário, de acordo com Arthur Omar (1978), não há como garantir a imparcialidade dos realizadores, tal como, a precisão da realidade. “Os temas estão ali, para serem colhidos. Não há um método de reflexão sobre o nível da realidade em que o documentário vai se situar. “ (Omar 1978). A linguagem utilizada em O Rap do Pequeno Príncipe alterna entre realidade e ficção, mas ganha força através dos relatos orais que ligam todo o filme. São esses relatos responsáveis por sugerir o imaginário que permeia o pensamento de quem assiste e, quem sabe, dos realizadores da obra. As imagens reforçam as contradições latentes dos discursos, sejam eles inclusive, vazios de conteúdo, mas cheios de ilusão. O documentário sugere a fábula, tenta desconstruí-la com o discurso das diferenças sociais e da má distribuição de renda, mas acaba confirmando a ficção no mito de Helinho e Garnizé. João Moreira Salles acrescenta que do ponto de vista da recepção o “documentário é a maneira como o espectador vê o filme” (Salles, 2005). Ou seja, não é negada a sua existência, mas percebe-se que suas imagens foram pré-concebidas e ficam presas ao discurso produzido e esperado pela burguesia – reflexo, de uma certa forma, da nova produção aceita como documentário brasileiro contemporâneo.



Palavras-chave:  Cinema Pernambucano, Rap, Periferia

E-mail para contato: saldanha.gabriela@hotmail.com