60ª Reunião Anual da SBPC




H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Lingüística - 4. Sociolingüística

DICIONARIZAÇÃO DO LEGADO LINGÜÍSTICO-CULTURAL AFRICANO NO BRASIL: O CASO DA LÍNGUA ÉWÉ-FON.

Ana Lucia Golob Machado1
Maria Candida Santos e Moura1
Tacyane Lima de Menezes2
Hippolyte Brice Sogbossi3

1. CNPq / UFS / Departamento de Letras
2. CNPq / UFS / Departamento de Ciências Sociais
3. Prof. Dr. - Departamento de Ciências Sociais - UFS / CNPq - Orientador


INTRODUÇÃO:
Esta pesquisa, financiada pelo CNPQ, visa a identificar e completar os termos Mina-jeje falados em Ouro Preto, Minas Gerais, a partir do século XVIII. Para tal, foram utilizados como base A obra nova da língua Geral de Mina, de Antônio da Costa Peixoto, publicada em 1741, pela editora Agência Geral das Colônias, que forneceu o léxico básico da pesquisa, e os livros A língua Mina-jeje no Brasil, de 2002, e Falares Africanos na Bahia, de 2001, ambos da autora Yeda Pessoa de Castro, que apresentaram dados importantes sobre a cultura, a localização geográfica, a divisão etno-lingüística dos povos falantes do Éwé-fon e o tronco lingüístico a que pertence o fon. O teor sócio-antropológico-dialetológico e lingüístico da pesquisa apresentou a necessidade da utilização de bibliografia que comentasse a cultura dos falantes dessa língua, intrinsecamente ligados ao ambiente religioso, como relatado na obra de Manuel Nunes Pereira A casa das Minas, obra que também confirma a presença da língua Mina-jeje nos Terreiros de Candomblé e de Tambor de Mina do Brasil nos dias atuais. Após a finalização do compilamento em tabela e da correção dos termos em Éwé-fon, começou-se a preparação de um glossário comentado de termos e expressões, que tem por finalidade ser o mais completo recurso brasileiro na pesquisa de termos Éwé-fon utilizados no país. A importância deste trabalho explica-se pela necessidade de uma obra que contenha a dicionarização correta e completa desta língua para que possa servir de base a outras pesquisas, lingüísticas e/ou sociológicas.

METODOLOGIA:
A pesquisa tem caráter documental, que demanda leitura e elaboração de fichamentos que propiciam a discussão. Todo o léxico recolhido em Castro e Costa Peixoto foi disposto em tabelas. Com base no material de Castro, foram formadas as colunas: “Grafia Mina-jeje (Costa Peixoto)”; “Grafia Fon/Mahi/Gun (Castro)”; “Grafia Adjá-fon atual (Sogbossi)”; “Etimologia (Sogbossi)”; “Tradução de Yeda Pessoa de Castro”; “Versão atual”. A coluna “Etimologia” tem por finalidade demonstrar que as palavras Mina-jeje pertencem a uma língua aglutinante - às vezes chamada de isolante - e tonal. Já a “Versão Atual” propõe a atualização da tradução dos termos ao português. A transcrição etimológica baseia-se no adjá-fon atual e é contribuição do professor orientador Sogbossi. Em relação ao léxico recolhido em Costa Peixoto, as colunas foram “Grafia Mina-jeje”, cujos termos foram pesquisados pelo próprio autor, no século XVIII; “Etimologia (Sogbossi)”; “Tradução de Costa Peixoto” e “Tradução segundo a etimologia”. No que diz respeito à obra de Manuel Nunes Pereira, A Casa das Minas, foram elaborados fichamentos em relação ao seu conteúdo sócio-cultural.

RESULTADOS:
Um aspecto positivo alcançado no decorrer da pesquisa, foi a reunião do vocabulário contido em obras diferentes, o que contribuiu na sua visualização. Em relação à obra de Costa Peixoto, foram dispostos alguns dados fornecidos por grupos temáticos centrais, isto é, a agrupação, por parte do autor, de palavras relacionadas entre si, como partes do corpo, animais, atos. O critério de organização do material obedeceu também a outras lógicas como a ordem alfabética e a construção de diálogos em torno de um tema ou assunto. Outro aspecto positivo, foram as ponderações feitas, o que levou à correção de falhas, como erros ortográficos e de tradução. Além do conteúdo crítico e proveitoso do trabalho, o grupo de pesquisa encontrou alguns obstáculos que dificultaram a efetivação do mesmo. É o caso da presença de termos em Gun na dicionarização de Castro, que escaparam ao entendimento do orientador, impossibilitando seu destrinçamento etimológico. Sobre esses termos desconhecidos, o orientador, em recente viagem ao Benin, pesquisou os significados dessas palavras antes estranhas a seu entendimento. Totalizando por volta de duas dezenas de palavras, que se apresentavam de forma incorreta ou incompleta nas dicionarizações presentes no Brasil, agora foram corrigidas e adicionadas à compilação do presente trabalho. Esta pesquisa possibilitou, também, o aprendizado sobre a cultura dos falantes do Éwé-fon, conhecimento este, importante para a compreensão da cultura negra e sua participação no processo da construção da nacionalidade brasileira.

CONCLUSÕES:
O estudo do legado lingüístico-cultural Éwé-fon no Brasil permitiu enfrentar vários desafios ligados com a origem de alguns grupos etnolingüísticos africanos no Brasil. No caso de Minas Gerais, especificamente Ouro Preto, o léxico que serviu de base para esta pesquisa demonstra a predominância de termos e frases de origem Gun, contrariamente ao que muitas vezes foi ressaltado por pesquisadores como Yeda Pessoa de Castro, que afirmam a predominância Fon. As diferentes mudanças e fenômenos lingüísticos que se verificam no estudo contrastivo do Fon e do Gun, demonstram claramente a origem precisa do legado: os Mina-jeje de Ouro Preto, em sua maioria, eram Gun. Além disso, o trabalho teve o cuidado de revelar a etimologia de palavras, o que servirá bastante para qualquer interessado na questão, haja vista as características de uma língua que justapõe conceitos, deriva, aglutina e compõe, para dar um toque semântico particular a nomes, objetos e processos. Estas características são justamente outro importante aspecto do projeto, pois a partir delas pôde-se observar e compreender que as línguas do grupo Éwé-fon apresentam diferenças significativas do português, como o aspecto aglutinante. Além de se notar a importância de uma pesquisa como esta em relação ao auxilio aos posteriores trabalhos que poderão ser feitos por outros autores, já que propõe uma dicionarização, observa-se também a importância do estudo dos aspectos lingüístico-culturais, que são fundamentais para a compreensão e aceitação das diferenças sociais.

Instituição de fomento: CNPq / UFS

Trabalho de Iniciação Científica

Palavras-chave:  Mina-jeje, Costa Peixoto, Castro

E-mail para contato: luciagolob@yahoo.com.br