60ª Reunião Anual da SBPC




H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Lingüística - 4. Sociolingüística

CONTRASTES ENTRE LEXIAS ENCONTRADAS NO LITORAL NORTE E NA REGIÃO DO GRANDE ABC: UM ESTUDO SOCIOGEOLINGÜÍSTICO DE ASPECTOS SEMÂNTICO-LEXICAIS NO ESTADO DE SÃO PAULO

MÁRCIA REGINA TEIXEIRA DA ENCARNAÇÃO1
ADRIANA CRISTINA CRISTIANINI1, 2

1. Universidade de São Paulo - USP - Departamento de Lingüística
2. Universidade Bandeirante de São Paulo - UNIBAN


INTRODUÇÃO:
Todo grupo social humano elabora e constitui um universo completo de conhecimentos integrados e possui fortes ligações com o meio em que vive. Em um país pluriétnico, como é o caso do Brasil, a cultura, acumulada ao longo do tempo por determinado grupo, relaciona-se com realidades socioculturais distintas, graças à necessidade de convívio entre elas. Como resultado disso, é notória a mudança de hábitos, costumes, valores, bem como da língua. Em decorrência do crescente processo de globalização econômica e cultural por que estão passando as sociedades neste início de século XXI, percebe-se que diferentes grupos humanos acabam sofrendo mudanças que alteram, continuamente, suas características típicas. O tema deste trabalho de pesquisa justifica-se por diversas razões. Primeiro, porque é provável ocorrer o desaparecimento gradativo dos falares regionais em decorrência do crescente processo de padronização cultural. Depois, e em conseqüência disso, ocorre a aceleração do processo de nivelamento da linguagem, tendo em vista os padrões urbanos que se tornam atração constante. O objetivo geral dessa de pesquisa é a elaboração de um estudo semântico-lexical de caráter descritivo e contrastivo em comunidades situadas no litoral norte de São Paulo e no Grande ABC.

METODOLOGIA:
A elaboração deste trabalho fundamentou-se em pesquisa de campo, com a finalidade de proceder à recolha de dados. Os sujeitos eram naturais das localidades ou lá residiam há pelo menos um terço 1/3 de sua vida, quando procedentes de outra região. Em cada um dos pontos estabelecidos foram entrevistados adultos, com mais de 60 anos e que estudaram até a 4ª série do Ensino Fundamental. Seus depoimentos são de suma importância, porque conservam características específicas de um vocabulário pouco influenciado pela ação niveladora dos meios de comunicação. Para as entrevistas, usamos a versão do questionário lingüístico que consta do II Workshop de preparação de inquiridores para o Atlas Lingüístico do Brasil, realizado em Londrina de 3 a 7 de julho de 2000. Utilizamos o Questionário Semântico-Lexical – QSL, que se constitui em instrumento indicado para pesquisas dessa natureza. Segundo o Comitê realizador do Projeto ALiB – Atlas Lingüístico do Brasil, a seleção dos itens inclusos no QSL tem como objetivo documentar o registro coloquial do falante, procurando retratar as formas de emprego mais gerais, encontradas nas comunidades pesquisadas, sem priorizar regionalismos, arcaísmos ou linguagens especiais de determinados grupos.

RESULTADOS:
Ao perguntarmos: ...como se chama “a ponta roxa no cacho da banana?” a um total de 50 sujeitos, encontramos uma série de variações nas duas regiões pesquisadas. O tema sugerido pelo Projeto ALiB ‘parte terminal da inflorescência da bananeira’ não aparece nas respostas de nossos sujeitos, mas as lexias obtidas fazem referência a essa parte do cacho da banana. Em vista disso, consideramos que eles entenderam a pergunta. No litoral norte paulista não registramos nenhuma abstenção e obtivemos apenas lexias simples em todas as respostas, sendo que “umbigo” foi a de maior freqüência, atingindo 66,67%. As outras variações que aparecem na região são “engaço” (16,67%) e “taiá” (16,67%). Na região do Grande ABC, registramos 25% de abstenção e aparecem como respostas lexias simples e compostas, sendo que “coração” foi a mais freqüente, com 41,67%. Foram encontradas também as variações, “umbigo” (22,22%), “filhote” (2,78%), “ponta do cacho” (2,78%) e “rabo da banana” (2,78%). Para que se tenha uma visualização esclarecedora dos resultados obtidos, essas variações são registradas em cartas temáticas construídas com a finalidade específica de documentar a distribuição das lexias, obtidas como respostas dos sujeitos, nos pontos estudados

CONCLUSÕES:
Os estudos sociogeolingüísticos permitem-nos concluir que a língua, por estar inserida em um determinado contexto sócio-cultural, imprime aos falantes as marcas da sociedade que dela se utiliza e singulariza a maneira própria de falar em relação ao de outras comunidades lingüísticas. A língua portuguesa do Brasil, dotada de uma única unidade sistêmica, possui várias normas de uso, o que a torna tão instigadora para os pesquisadores. Esse tema da variação é fonte inesgotável para outros estudos e é necessário que se tente resgatar e registrar o mais rápido possível a riqueza lexical existente. Esses levantamentos de base lexical possibilitam um melhor conhecimento da língua falada, ao mesmo tempo em que nos propiciam o reconhecimento das diferenças culturais que compõem a realidade do país. A preocupação com as rápidas e inevitáveis modificações tem impulsionado os estudos lingüísticos e influenciado um elevado número de lingüistas, embasados no método geolingüístico, ao registro dos falares em cartas lexicais. Utilizamos esse método, pois permite que se conheça e registre as diferentes formas de falar de uma comunidade de uma forma única, baseado em um questionário padronizado que nos permite comparações precisas com outros trabalhos.



Palavras-chave:  Dialetologia, Sociolingüística, Geolingüística

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