60ª Reunião Anual da SBPC




H. Artes, Letras e Lingüística - 3. Literatura - 1. Literatura Brasileira

NO ENCALÇO DA CONTEMPORANEIDADE: UM OLHAR PARA A NARRATIVA BRASILEIRA DA DÉCADA DE 90

Marcela Ferreira da Silva1
Rejane Cristina Rocha2

1. Bolsista PIBIC/CNPq - UEG
2. Profa. Dra. Letras - UEG - Orientadora


INTRODUÇÃO:
A crítica que se dedica ao estudo da produção literária contemporânea em prosa deve enfrentar uma primeira dificuldade que é identificar, na multiplicidade de temas e procedimentos narrativos, aqueles que, pela sua recorrência e elaboração, possam ser chamados a caracterizá-la. Diante desse desafio, é necessário que se leve em consideração que a prosa literária brasileira dos últimos vinte anos tem apresentado, no nível temático, uma crescente desideologização que esmaece as tonalidades eminentemente políticas da ficção que dialogava, entre os anos 60 e 80, com a repressão do regime ditatorial que assolou o país nessas décadas. No plano expressivo, é possível identificar a assimilação de técnicas e recursos provenientes dos meios de comunicação em massa, sobretudo a televisão, que desde os anos 70 direcionam o olhar dos leitores, cada vez mais afeitos às montagens, à fragmentação e aos procedimentos que imprimem, no texto, a simultaneidade típica do universo imagético. A fim de discutir de que forma tais aspectos desdobram-se na materialidade do texto ficcional, propõe-se a leitura de uma antologia de contos que reúne a produção de duas dezenas de escritores que começaram a publicar na década de 90: Geração 90: manuscritos de computador, de 2001.

METODOLOGIA:
Para atingir os objetivos propostos, o trabalho iniciou-se pela revisão bibliográfica da crítica sobre a literatura brasileira contemporânea, a fim de mapear os aspectos temático-formais que podem caracterizá-la. Aspectos como a oposição entre hipermimetismo e hipermediação, a crise de escala, que acomete as artes e a literatura na atualidade, a transcodificação das imagens em linguagem verbal, por meio da fragmentação e da simultaneidade, a experiência subjetiva empobrecida, narrada por narradores sem experiência, a inextricável relação da literatura contemporânea com a indústria cultural, a ausência de ideologia e a diluição do tom de protesto, entre outros, foram, então, discutidos no âmbito das reuniões quinzenais do Grupo de Pesquisa “Estudos de narrativa brasileira contemporânea”, liderado pela orientadora da pesquisa, e serviram de via de acesso aos 49 contos, que foram analisados horizontalmente, em um primeiro momento, a fim que se pudesse ter uma visada panorâmica de seu conjunto. A próxima etapa da pesquisa prevê a seleção dos contos que, dada a sua qualidade, serão analisados aprofundadamente.

RESULTADOS:
Na antologia em questão, graças à variedade de contos e de autores que a compõem, podem ser observadas as principais linhas de força da narrativa brasileira atual: uma prosa afeita ao realismo, muitas vezes de contornos brutais, deixa entrever o dia-a-dia nas grandes cidades. O espaço urbano surge não só como pano de fundo de relações humanas esgarçadas, mas também como tema nos contos em que se expõem as cisões sócio-econômicas do país. A opção, na maioria das vezes, recai nos narradores autodiegéticos que, embora narrem a sua própria história, não escapam da superficialidade que faz com que seus relatos assemelhem-se às imagens estereotipadas veiculadas pela mídia; suas histórias passam ao largo da subjetividade e, em alguns momentos assemelham-se a relatórios não de uma experiência do narrador-personagem, mas apenas do que ele tomou conhecimento como espectador. A elipse é recurso largamente utilizado nos contos, freqüentemente miniaturizados, e pode ser identificada no tratamento ligeiro dos personagens e no delineamento superficial dos enredos. A fragmentação é recorrente, seja nas orações incompletas que tentam imprimir uma simultaneidade aos acontecimentos narrados, seja na divisão em episódios quase completamente autônomos que marcam a estrutura de alguns dos contos.

CONCLUSÕES:
Como se vê, a tentativa de delimitação dos principais traços do que se entende por contemporaneidade literária, no Brasil, esbarra na multiplicação de questionamentos que vão além da circunscrição cronológica, temática e estrutural e dizem respeito, também, às reflexões acerca do que seja a literatura em tempos de livro como objeto de consumo, escritor como produtor e leitor como consumidor. Na materialidade do texto literário é possível identificar aspectos que dialogam com os modernos meios de comunicação, com a cultura de massa e com o mercado. Assim, tem-se na narrativa contemporânea um paradoxo: o impulso realista, desdobrado em histórias banais, relacionado à vida precária na grande cidade é mediado por técnicas narrativas tomadas aos meios de comunicação em massa, sobretudo a televisão e o cinema. O real aparece, então, na maioria dos textos que compõem a antologia Geração 90: manuscritos de computador por meio da reiteração de imagens muitas vezes estereotipadas pelas mídias eletrônicas. O efeito de real se estabelece, mas o resultado é a construção do simulacro, não a percepção subjetivada e aprofundada dos dramas humanos no ambiente urbano.

Instituição de fomento: PIBIC/CNPq

Trabalho de Iniciação Científica

Palavras-chave:  Literatura brasileira, Prosa, Contemporaneidade

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