60ª Reunião Anual da SBPC




G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 5. Antropologia Urbana

MUSEU AFRO-BRASILEIRO: ANÁLISE ANTROPOLÓGICA DO DISCURSO MUSEOGRÁFICO

Marina Cavalcante Vieira1
Frank Marcon2

1. Departamento de Ciências Sociais/UFS
2. Departamento de Ciências Sociais/UFS - Orientador Prof. Dr.


INTRODUÇÃO:
Laranjeiras é uma cidade localizada no Vale do Cotinguiba, região do estado de Sergipe caracterizada pela tradicional cultura da cana-de-açúcar e que no passado representou a principal região escravocrata do estado. A cidade de Laranjeiras abriga quatro museus, Casa de Cultura João Ribeiro, Museu de Arte Sacra de Laranjeiras, Casa do Folclore Zé Candunga e Museu Afro-Brasileiro. Este artigo se debruça sobre o Museu Afro-Brasileiro de Sergipe, analisando a importância deste enquanto referência para a cultura local, uma vez que o museu em questão se propõe a contar a história do negro, desde sua escravidão até as contribuições do negro para a cultura brasileira. Nosso objetivo é a análise do discurso construído pelo museu, já que todo museu elege um discurso que pode ser observado através dos discursos oficiais da instituição, assim como através da análise dos objetos, composição do espaço e disposição dos objetos nesse espaço.

METODOLOGIA:
Esta pesquisa foi desenvolvida ao longo da disciplina Etnologia Brasileira II, ministrada pelo Prof. Dr. Frank Marcon, na Universidade Federal de Sergipe, que tem como ementa a vertente antropológica sobre o negro no Brasil, a herança cultural africana, relações e formas de organização do negro. A pesquisa mantém uma forte ligação com a bibliografia trabalhada por essa disciplina, além de abranger a temática da museografia e patrimônio cultural. Para tanto, faz-se uma atualização da literatura acerca destes temas. A análise do contexto de criação do museu, inaugurado em 1976, foi feita em diálogo com a atualização do estado da arte sobre os temas do negro, museus e patrimônio cultural no Brasil. A próxima etapa da pesquisa foi a análise dos discursos sobre o museu retirados de sítios virtuais: a tentativa aqui foi perceber como se constroem os discursos sobre o museu, tanto por pessoas de fora como por meios oficiais da própria instituição. As fontes utilizadas são tomadas como “informantes” que têm uma certa concepção do que seria o Museu e que legitimam suas perspectivas e discursos. A última etapa da pesquisa consistiu na análise etnográfica do acervo do Museu Afro-Brasileiro, assim como uma análise do discurso museográfico composto por essas peças.

RESULTADOS:
A ação de memória, sejam elas as de preservação do patrimônio ou de constituição de acervos museográficos, está relacionada com a construção de identidades e com a ação política de representar um grupo, étnico, nacional ou específico de uma camada social. Durante décadas, as práticas de preservação do patrimônio e os discursos museográficos estiveram voltados para a construção de uma integridade nacional. É somente na década de 1970 que se intensificam as discussões acerca da democratização dessas áreas no Brasil, mas o Iphan, de fato somente processa essas mudanças quando Aloísio Magalhães assume a sua diretoria em 1979. A inauguração do Museu Afro-Brasileiro representou uma ação pioneira no estado de Sergipe, em um momento em que ainda estava-se começando a discutir a democratização do patrimônio cultural e dos museus. Este museu foi instalado em um edifício de arquitetura eclética de inspiração neo-clássica de fins do século XIX, conservado em sua estrutura original, portanto, o seu acervo está exposto de acordo a organização do que seriam as salas e quartos desse imóvel. O acervo do museu dispõe desde peças de tortura e instrumentos de trabalho usados pelos escravos nas usinas, até receitas de comidas de origem africana e peças que representam a religiosidade afro-brasileira.

CONCLUSÕES:
No primeiro pavimento do Museu Afro-Brasileiro ficam expostas as peças que do período da escravidão, que remetem desde a economia açucareira e práticas de tortura ao que seria a cozinha da casa-grande, ambiente que na obra de Gilberte Freyre (Casa-Grande e Senzala) representa o espaço de fluxo entre a casa-grande e a senzala. O acervo exposto na cozinha se remete ao mito da democracia racial fomentado por este autor. No segundo pavimento do museu fica o acervo religioso, folclórico e culinário, tratados como legado do negro à cultura brasileira. Podemos perceber que apesar de se propor a ser um museu étnico, o seu discurso se constrói com base nas contribuições deixadas pelas populações africanas e afro-descendentes para a cultura nacional, sendo um discurso ainda permeado pela idéia de integridade nacional.



Palavras-chave:  negros, patrimônio cultural, museus

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