60ª Reunião Anual da SBPC




F. Ciências Sociais Aplicadas - 5. Direito - 42. Filosofia do Direito

A AUTONOMIA DAS ESFERAS JURÍDICA E POLÍTICA: A GREVE NO CÓDIGO PENAL DE 1940

Moisés Alves Soares1
Eduardo Granzotto Mello1

1. Universidade Federal de Santa Catarina


INTRODUÇÃO:
O desenvolvimento do direito de greve é marcado por uma história de avanços e recuos de conquistas/concessões das lutas do movimento operário. A greve surge como um não-direito, uma forma de manifestação eminentemente política que, como resposta do capital, num primeiro momento, começa a ser enredada pela forma jurídica em sua figuração como crime até assumir ares aprisionados de um direito fundamental. A aparição da greve no ordenamento brasileiro ocorre, efetivamente, no código penal de 1890, que, em sua redação, criminalizava quem provocasse a cessação pacífica do trabalho. Tal dispositivo não teve vida longa. O partido operário, recém fundado, pressionou politicamente ao ponto de, poucos meses depois, o governo vir a legalizar a greve exercida sem violência. Com a constituição outorgada em 1937, os ventos pareciam soprar novamente em outra direção. No entanto, os autores do código penal de 1940 elaboram um título sobre a questão, cujo nome era os crimes contra a organização do trabalho, que não retrocede na criminalização da greve em si. Analisar, especificamente no campo penal, a partir de Lukács, esse movimento do conceito legal de greve que tem seu ponto fulcral com a codificação de 1940, é o objetivo principal deste estudo.

METODOLOGIA:
O método predominantemente utilizado foi o método dialético. Mais especificamente a dialética construída por Lukács na Ontologia do Ser Social. A ontologia de Lukács é baseada na concepção de que a realidade é composta como um complexo formado por complexos. O complexo total consiste em complexos que são por sua vez complexos parciais. A realidade, desta forma, é constituída por influências recíprocas nas quais a qualidade dos complexos particulares é derivada da autonomia relativa, mas cuja direção e parâmetros são fixadas pela interação dessas estruturas como se encontravam no complexo total. É nesse sentido, aliado com uma pesquisa comparativa entre ordenamentos jurídicos latino-americanos e europeus sobre o tema e a exegese do ordenamento nacional, que se torna possível analisar a forma jurídica da greve e suas implicações nas esferas do direito e da política no contexto histórico do código penal de 1940.

RESULTADOS:
O código de 1940 foi elaborado durante o período Vargas que, ao estabelecer um novo modelo de acumulação de capital (industrial), necessitava de meios mais eficazes de regulação e controle da força de trabalho. Nesse sentido, não há dúvida, que o código penal, na esteira da CLT, vem atender a tal exigência. Desta forma, após promulgação da constituição de 1937 – que declarava a greve como recurso anti-social, nocivo ao trabalho e ao capital e incompatível com o interesse nacional -, o projeto Alcântara Machado (1938), em seu art.212, criminalizava a greve pacífica. Foi este projeto, absolutamente conservador, o marco inicial da comissão revisora. Nesta comissão dois nomes são vozes destoantes sobre o tema: Nelson Hungria e Roberto Lyra. O primeiro era conservador e defendia a inexistência de um direito de autotutela de classe e que a greve fosse enquadrada nos crimes contra liberdade individual; o segundo era socialista e teve a iniciativa de criar o título dos crimes contra a organização do trabalho e argüia que nunca criminalizou a greve só o seu excesso. Por outro lado, no campo político havia intensa repressão pela lei de segurança nacional, julgamentos por tribunal de exceção, tortura. As esferas jurídica e política, no caso da greve, há muito não andavam tão descompassadas.

CONCLUSÕES:
Ao contrário da interpretação tradicional sobre tema, não considero os crimes contra a organização do trabalho, onde se encontram os artigos sobre a greve, um marco do autoritarismo no código de 1940. O argumento do autoritarismo me parece se coadunar com o liberalismo econômico, nada mais que isso. Penso que, a partir de uma analisa concreta, se explicita o caráter contraditório do título, pois se vivia numa época de perseguições políticas e de consolidação de uma nova classe dirigente. Analisar as leis como entes atemporais é, no mínimo, um dogmatismo. Por isso, a tensão política e a própria carta constitucional levavam a crer no aumento da criminalização no campo penal do trabalho, mas não foi o que ocorreu. Ora, codificou-se o direito de greve às avessas e as penas dos excessos eram menores em relação ao código anterior. Contudo, para esfera política, o lugar da cartase, isso era insignificante. Nem tático era. Pois um código nos moldes do construído em 1940 em nada mudava a dependência do movimento a forma jurídica, apenas levemente melhorava o que tinha perspectivas de ser terrivelmente pior. Portanto, compreendo juridicamente progressista a disposição da greve na codificação de 1940, mas igualmente conservadora em termos políticos.

Instituição de fomento: PET SESu MEC



Palavras-chave:  greve, codificação, forma jurídica

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