61ª Reunião Anual da SBPC
D. Ciências da Saúde - 5. Farmácia - 6. Farmácia
PRESCRIÇÃO E DISPENSAÇÃO DE FÁRMACOS ANOREXÍGENOS
Priscilla Fernanda Campos Justino 1, 2
Geysa Aguiar Romeu 1
Alison Menezes Araújo Lima 2
1. Curso de Farmácia, Centro de Ciências da Saúde, Universidade de Fortaleza – Unif
2. Farmácia Pague Menos
INTRODUÇÃO:

Segundo estatísticas da Organização Mundial de Saúde - OMS, calcula-se que cerca de 25% da população mundial é obesa e que desses, 25% morrem por conseqüências diretas ou indiretas da obesidade (PASSOS, 2005). Estima-se hoje que nosso país possua quatro milhões de obesos mórbidos, aproximadamente 4% da população segundo a Associação Brasileira para Estudo da Obesidade; 30% das causas de morte no Brasil estão associadas à obesidade e a doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes, hipertensão e problemas cardíacos (OSÓRIO, 2005).

O tratamento farmacológico da obesidade está indicado na presença de Índice de Massa Corpórea (IMC) maior que 25 Kg/m² com outras doenças associadas à obesidade ou em pacientes com IMC maior que 30 Kg/m², quando da falência do tratamento não farmacológico isoladamente. Pode-se, didaticamente, dividir os fármacos para tratamento da obesidade em três grupos básicos: medicamentos anorexígenos de ação central, medicamentos termogênicos e medicamentos que afetam a absorção de nutrientes (MANCINI, 2004).

Os anorexígenos são fármacos que provocam anorexia, ou seja, redução ou perda de apetite, devendo ser utilizados apenas como adjuvantes no tratamento da obesidade. Seu emprego não é recomendado como tratamento primário para promover a perda de peso (KOROLKOVAS, 2002). A classe dos anfetamínicos é a mais conhecida dentre os anorexígenos.

O grande problema dos anorexígenos são os efeitos colaterais. Como eles também têm o poder de estimular o sistema nervoso autônomo, podem causar inúmeras outras reações. Os anfetamínicos, em particular a anfetamina e a metanfetamina, apresentam um alto potencial de abuso, propiciando o desenvolvimento de farmacodependência (HOFFMAN; LEFKOWITZ, 1996).

Do ponto de vista ético-profissional, cabe ao farmacêutico atentar se as prescrições contendo anorexígenos têm como finalidade um tratamento racional e benéfico ao paciente ou o são emitidas inadequadamente, promovendo tratamentos considerados desvantajosos. O farmacêutico tem o dever de promover a saúde e o direito de recusar a realização de atos que, embora autorizados por lei, sejam contrários aos ditames éticos, comunicado, quando for o caso, ao usuário, ao outro profissional envolvido e ao respectivo conselho.

A avaliação da prescrição e dispensação de fármacos anorexígenos é de fundamental importância, visto que, “o Brasil é um dos países onde mais cresce o consumo destes medicamentos” (JIPE, 2005). Sendo bastante relevantes as informações a respeito desses medicamentos e/ou associações que os contenham, pois o seu uso de forma indiscriminada acarreta problemas de seguridade e eficácia implicando em uma relação risco/benefício não satisfatória. 

Anfetaminas e seus derivados utilizados como anorexígeno ou no distúrbio de hiperatividade em crianças, têm sua comercialização sujeita às exigências da Portaria n°. 344 de 12 de Maio de 1998 da Secretaria da Vigilância Sanitária, recentemente atualizada pela RDC n° 58, de 5 de setembro de 2007. 

METODOLOGIA:

O estudo proposto, do tipo quantitativo, descritivo e retrospectivo foi realizado no período de agosto a novembro de 2005 em uma rede que possui 264 farmácias em todo o país. Dentre elas, 96 localizam-se no Ceará sendo 80 filiais em Fortaleza.

Analisaram-se as especificações e quantidades de medicamentos anorexígenos dispensados em seis farmácias de Fortaleza no mês de agosto de 2005; o gênero do paciente, a especialidade do profissional prescritor e as informações da prescrição segundo legislação vigente. Essas prescrições foram coletadas manualmente e os dados transcritos para formulário específico. As farmácias foram escolhidas de forma aleatória, respeitando as diversas regiões da cidade, isto é, foi selecionada uma farmácia em cada Secretaria Executiva Regional – SER de Fortaleza.

Em relação às informações contidas nos receituários analisaram-se a identificação do paciente, prescritor, fornecedor e comprador; data de emissão e dados sobre os medicamentos tais como: especificação (genérica ou comercial), concentração, forma farmacêutica, posologia e quantidade ou dose a ser dispensada.

Os dados coletados foram analisados e os resultados sistematizados sendo expressos por distribuição de freqüências absolutas e percentuais. Este estudo obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Fortaleza (Parecer nº 424/2005) e seguiu os preceitos éticos das Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisas Envolvendo Seres Humanos segundo a Resolução n° 196/96 CNS/MS.       

RESULTADOS:

Avaliaram-se 102 prescrições, através das quais foram dispensadas 124 unidades farmacêuticas, sendo que 45 (36,3%) corresponderam a anfepramona representada pelos medicamentos Dualid S®, Inibex S® e Hipofagin®; 42 (33,9%) a sibutramina (Plenty® e Reductil®) e 37 (29,8%) ao femproporex, na apresentação de Desobesi M®. O mazindol (Absten S®) não foi dispensado no período da pesquisa, nas farmácias analisadas.

Os pacientes do gênero feminino destacaram-se como os usuários de fármacos anorexígenos, sendo representados por 76 (74,5%) receitas analisadas. Quanto à especialidade médica observou-se uma prevalência de 52,9% de clínicos gerais e 16,7% de endocrinologistas. Em 4 (3,9%) prescrições, o carimbo do profissional prescritor estava ilegível não sendo possível identificar sua especialidade.

Todos os receituários informavam o nome do paciente, porém, 85 (83,3%) não continham o endereço. Os dados referentes ao fornecedor, data de emissão da prescrição, do emitente e do comprador estavam ausentes ou incompletos em 57 (55,9%), 28 (27,4%), 9 (8,8%) e 4 (3,9%) notificações, respectivamente. Das informações ausentes nos itens contendo medicamentos, 47 (46,0%) foram referentes à forma farmacêutica; 34 (33,3%) à dose a ser ingerida; 21 (20,6%) a posologia e 4 (3,9%) à quantidade a ser dispensada. Vale ressaltar que em uma mesma prescrição pode conter mais de uma informação ausente.

Analisando a dispensação desses fármacos nas diversas áreas de Fortaleza, constatou-se que as SER II e VI foram as que adquiriram maior quantidade de Plenty® e Reductil®, medicamentos considerados mais caros. Pode-se, portanto, fazer uma suposta relação entre essa aquisição e a concentração da população de Fortaleza com maior renda nessas regiões. Entretanto, o mesmo não pôde ser observado na SER III que, apesar da baixa renda da população, o medicamento Plenty® foi o mais procurado. O consumo de Desobesi-M®, Dualid-S® e Inibex-S® nas SER I, III IV e V está de acordo com o poder aquisitivo da população. A SER II também apresentou quantidade expressiva de vendas de Desobesi-M®, mas como o estudo não avaliou a profissão do consumidor, não se pode relacionar essa procura pelas pessoas de baixa renda que trabalham no local, mas é o que provavelmente pode ter ocorrido.

De acordo com legislação, é obrigatória a presença no receituário de medicamentos controlados do nome do medicamento ou da substância, prescritos sob a forma de Denominação Comum Brasileira (DCB), dosagem ou concentração, forma farmacêutica, quantidade (em algarismos arábicos e por extenso) e posologia. A farmácia ou drogaria somente poderia aviar a prescrição se todos esses itens estivessem devidamente preenchidos. Constatou-se, entretanto que na prática essa determinação não é seguida pelos profissionais prescritores nem pelos farmacêuticos no ato da dispensação, já que foram identificadas várias prescrições com ausência de informações importantes, podendo acarretar redução da adesão ao tratamento e conseqüente prejuízo ao paciente. Silveira et al. (2005) em uma drogaria em Pelotas, RS encontrou que a maior freqüência de erros na análise de notificações de medicamentos psicotrópicos ocorreu por falta de endereço completo do paciente (91,6%), ausência do nome do fármaco de acordo com a DCB (80,5%), da quantidade em algarismo arábico e por extenso (72,1%), forma farmacêutica (59,0%), posologia e data de emissão (9,0%) e em 7,4% não constavam dose ou concentração. A omissão de informações na prescrição médica dificulta o trabalho de equipe e põe em risco a vida do paciente. Os dados apresentados corroboram com a necessidade de educação continuada dos profissionais prescritores e dispensadores e adoção de outras medidas para a melhoria da qualidade da prescrição e dispensação.

CONCLUSÃO:

Os medicamentos anorexígenos, sujeitos a controle especial, em especial o femproporex, sibutramina e a anfepramona continuam sendo bastante dispensados, mesmo sem que o receituário esteja de acordo com a legislação vigente. O não cumprimento da legislação, tanto por parte dos prescritores quanto dos dispensadores é alarmante, podendo acarretar riscos à saúde pública.

É importante ressaltar que extrapolar os resultados, generalizando-os para a cidade de Fortaleza como um todo é algo arriscado, uma vez que se trabalhou com uma amostra reduzida para tais propósitos e qualquer generalização pode induzir a reprodução de dados e informações não consistentes. Contudo esses dados preliminares mostram que o consumo de anorexígenos em Fortaleza, a semelhança de outras cidades, ocorre de maneira intensa e irracional denotando a necessidade de implantar, de forma efetiva, a participação do farmacêutico na monitorização do uso de medicamentos anorexígenos e estabelecer processo de educação para prescrição, dispensação e uso racional desses medicamentos.

Palavras-chave: Prescrição de Medicamentos, Boas Práticas de Dispensação, Anorexígenos.