A presente pesquisa teve por objetivo central o conhecimento das relações entre os homens de letras e a história do Piauí nas últimas décadas do século XIX e começo do século XX, utilizando como recurso metodológico a comparação entre a obra de intelectuais como Clodoaldo Freitas, e igualmente, o estudo da escrita dita popular, particularmente nas obras de literatura de cordel de Firmino Teixeira do Amaral, analisando tanto quanto possível as interfaces desse discurso popular com as temáticas presentes nos discursos literários, jornalísticos e historiográficos, ditos de feição erudita no Piauí.

Os procedimentos dessa pesquisa foram norteados pelo levantamento, leitura e fichamento da bibliografia referente à temática central do projeto, ao recorte temporal e a literatura colocada em questão, catalogando essas obras e identificando seus autores. Foram selecionados os seguintes folhetos de Firmino Teixeira do Amaral: Peleja de Cego Aderaldo com Zé Pretinho do Tucum, A Festa da bicharada, Peleja de Cego Aderaldo com Jaca Mole, O Casamento do Bode com a Raposa, A Princesa Magalona e seu amante Pierre, Peleja de João Peroba com o menino Pericó, Peleja de Cego Aderaldo com Frankalino e Desafio de Sebastião de Enedina com Zé Eusébio. Os romances e artigos de jornal também foram focalizados em Clodoaldo Freitas. As obras selecionadas foram Memórias de um Velho, Os Bandoleiros, Os Burgos, Palácio das Lágrimas e Coisas da Vida, com revisão, leitura e fichamento dessa seleção. Esses livros haviam sido publicados em vários jornais em circulação na época.

As conexões entre essas literaturas foram pensadas a partir de três variáveis principais: o espaço onde as ficções se desenrolam, a forma como os sujeitos aparecem e são construídos e representados e como cada literatura percebe a sua atuação e a da outra no mundo. Observou-se que além do intuito de divertir os leitores, há também nos dois autores a intenção de instruir seu público a relacionar as posturas tomadas pelas personagens com as atitudes das pessoas em geral. A articulação com o espaço se dá de forma particular em ambos os autores, no caso de Clodoaldo Freitas com a vivência burguesa do cotidiano campestre, enquanto em Firmino Teixeira, o mundo rural é inspirado na vida pastoril e agrícola. Os autores se aproximam principalmente na crítica aos costumes, embora façam esse movimento de forma singular. Existe certa hostilidade na forma como esses autores viam a produção um do outro, com uma clara disputa de legitimidade.

Percebe-se no decorrer da exposição as conexões entre a literatura dita erudita e a literatura de cordel, as aproximações e distanciamentos entre essas duas escritas, seja em torno da linguagem que usam ou em torno de suas visões de mundo. Ao analisar os folhetos e os romances, diferenciações clássicas como campo e cidade, não chegam a se igualar, mas categorias como cultura popular e erudita praticamente se diluem.