61ª Reunião Anual da SBPC
H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Lingüística - 6. Lingüística
A FORMAÇÃO DO PROJETO TEÓRICO DE MICHEL PÊCHEUX: DE UMA TEORIA GERAL DAS IDEOLOGIAS À ANÁLISE DO DISCURSO
Claudiana Narzetti 1
Silvia Dinucci Fernandes 1
1. Programa de Pós-Graduação em Lingüística e Língua Portuguesa (UNESP/Araraquara)
INTRODUÇÃO:

Este trabalho apresenta os resultados de nossa pesquisa de Mestrado, a qual investigou a história da constituição da disciplina Análise do discurso (AD), desenvolvida por Michel Pêcheux. Partimos do pressuposto de que a AD não se iniciou com a publicação da obra Análise Automática do Discurso, de 1969; mas sim nos anos 66-68, com a publicação de artigos assinados com o pseudônimo Thomas Herbert, em que o filósofo situa o papel da AD no interior de seu projeto maior de construção de uma teoria das ideologias. Nossos objetivos eram: (a) Reconstruir o percurso do projeto teórico de Pêcheux, identificando que motivações teóricas o conduziram à construção da teoria e da análise do discurso; (b) Esclarecer qual a função que o instrumento análise do discurso desempenhava na teoria das ideologias; (c) Explicitar qual o papel particular que Materialismo Histórico, Lingüística e Psicanálise exerceram na construção da AD. A relevância da pesquisa advém do fato de que o conhecimento do campo do saber em que nos situamos passa necessariamente pelo conhecimento de sua história; sem este, o campo pode se tornar ou um dogma ou uma simples vulgata.

METODOLOGIA:

Nossa pesquisa foi desenvolvida a partir da análise e da confrontação dos artigos produzidos por Michel Pêcheux antes da publicação da assim chamada obra “inaugural” da AD, a Análise Automática do Discurso, de 1969, textos onde consideramos que o filósofo lançou as bases de seu projeto teórico. Nessa análise, buscamos não só relacionar os conceitos ali expostos com suas bases teóricas, mas, principalmente, compreender como o autor se apropriou de conceitos provenientes das três ciências acima enumeradas na construção de sua teoria e análise do discurso, bem como o papel destas no projeto pecheutiano de produção de uma teoria das ideologias. Nossa reflexão sobre o material investigado foi guiada pela perspectiva da genealogia de Nietzsche. A genealogia permite estudar o começo histórico de uma disciplina, sua proveniência e sua emergência, com a vantagem de não precisarmos entendê-la em função de uma suposta essência, ou ainda de uma teleologia. A genealogia, ao contrário, permite-nos compreender a emergência e as transformações de uma disciplina como o resultado de forças históricas em relação, ou seja, em sua historicidade radical.

RESULTADOS:

Os resultados principais de nossa pesquisa foram a contextualização histórica e epistemológica do surgimento da AD, como parte de um projeto maior de seu principal formulador, Michel Pêcheux; a reconstituição dos pressupostos epistemológicos do filósofo, principalmente sua concepção de ciência e de instrumento científico; a sistematização do que poderíamos chamar de sua “teoria da experimentação”; a discussão do seu primeiro esboço de uma teoria e de um método de análise do discurso construído sobre a base de conceitos marxistas, lingüísticos e psicanalíticos; e, ainda, uma interpretação sobre as idéias, consideradas herméticas, presentes nos primeiros textos do autor.

CONCLUSÃO:

Os resultados da pesquisa nos conduziram a algumas conclusões. A principal delas é a de que, diferentemente do que afirmam vários estudiosos, a AD não foi pensada por Pêcheux como um instrumento para analisar o discurso político. Na verdade, ela foi projetada para cumprir o papel de instrumento científico (no sentido que se dá a este termo nas ciências exatas) destinado aos cientistas sociais, instrumento este que, em última instância, permitiria abalar o sistema de garantias ideológicas em que essas ciências se sustentavam e, assim, possibilitar a produção de conhecimentos verdadeiramente científicos. Em outras palavras, a AD era parte de um projeto maior do filósofo de intervenção nas ciências sociais: como estas trabalhavam com discursos, seria necessário um instrumento de análise do discurso. Outra conclusão a ser mencionada é que, também diferentemente do que afirma uma certa vulgata da AD, a disciplina não nasceu carente de teoria; na verdade a produção de uma teoria do discurso por Pêcheux foi seu passo inicial. Uma outra conclusão é a de que a AD não se configurava, para Pêcheux, como uma disciplina de “entremeio”; ao contrário, ela tinha lugar bem definido e este lugar era o Materialismo Histórico (Marxismo). Conseqüentemente, Pêcheux fala do interior do MH e tanto os conceitos da Lingüística quanto os da Psicanálise são utilizadas para responder a uma problemática inerente ao MH: a dos discursos ideológicos.

Instituição de Fomento: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM).
Palavras-chave: Análise do discurso, História epistemológica da AD, Lingüística.