61ª Reunião Anual da SBPC
A. Ciências Exatas e da Terra - 3. Física - 2. Ensino de Física
DISCURSO CIENTÍFICO X LINGUAGEM COTIDIANA: O QUE DIZEM OS ALUNOS
Heloize da Cunha Charret 1, 2
Reynaldo Lopes de Oliveira Junior 1, 3
1. Escola SESC de Ensino Médio ESEM
2. Universidade Federal Fluminense - UFF - Faculdade de Educação - Mestre
3. Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ - Instituto de Física
INTRODUÇÃO:

    O ingresso no ensino médio se constitui em uma transição por vezes turbulenta no percurso escolar dos estudantes. No que diz respeito às disciplinas ligadas as ciências naturais esta transição é ainda mais marcante dada a histórica falta de clareza a cerca da natureza da ciência.

     Para além da preocupação com a formação científica dos alunos é preciso buscar estratégias e metodologias que franqueiem a eles um espaço de manifestação da sua concepção de ciência. Mais do que isso, é preciso orientar nossos esforços a partir do alicerce montado sobre esta concepção.

    O presente trabalho se desenvolveu no cenário da Escola SESC de Ensino Médio, tendo por sujeitos alunos do primeiro ano do Ensino Médio agrupados em onze turmas de 15 alunos cada. Nossos sujeitos constituem um grupo bastante heterogêneo, já que provem de todos os estados brasileiros e de diferentes classes sociais.

    Neste trabalho analisamos o que aluno entende por texto científico e não científico a partir de dois fragmentos textuais de apoio. Nosso interesse residiu, não em observar a identificação de um dos textos como científico ou não, mas sim em analisar a argumentação de apoio usada pelo aluno para justificar sua identificação.

    Consideramos estas análises de suma relevância, pois carregam em seu bojo traços das imagens de ciência com as quais alunos tão distintos entre si ingressam no Ensino Médio.

    Acreditamos ser este um passo inicial no sentido de promover uma educação científica com formação crítica e autônoma.

           

 

METODOLOGIA:

    A proposta do trabalho foi apresentada aos alunos em meio a uma avaliação diagnóstica da disciplina de Física logo no primeiro mês de aula. A questão analisada neste trabalho consistiu na leitura de dois textos distintos sobre a extinção dos dinossauros. Pedia-se aos alunos que identificassem, justificando, qual dos textos era científico e que argumentassem por que consideravam o outro texto não-científico.

    Os alunos responderam a todas as questões da citada avaliação em aula individualmente. Anteriormente, na disciplina, trabalhou-se o debate sobre a natureza da ciência através do contato com textos de divulgação científica e temas polêmicos da fronteira científico/não científico, tais como o criacionismo, os mitos e lendas.

    A análise das questões foi orientada nesta pesquisa não apenas buscando analisar a precisão dos alunos na classificação dos textos, mas em estabelecer a imagem de ciência que norteava a argumentação dos alunos em apoio às suas respostas.

    Desta análise emergiram algumas categorias que agrupam os principais argumentos dos alunos em favor de um texto como científico ou não, são elas:

            - opinião;

            - fatos;

            - vocabulário;

            - fé.

    A análise das respostas foi feita separadamente por dois pesquisadores e o enquadramento das respostas em uma ou mais categorias foi negociado por ambos.

RESULTADOS:

    Os textos de apoio apresentados aos alunos dirigiam bastante a sua classificação, contudo nossas análises sugerem que a classificação, a primeira vista correta, realizada pelos alunos não se apóia em uma argumentação adequada.

    Grande parte dos alunos se remete ao vocabulário rebuscado para justificar sua identificação do texto científico. Outros tantos fazem menção aos fatos apresentados em um dos textos como uma indicação de seu caráter científico, no entanto não vemos tais alunos problematizarem o conceito de fato, ou fato científico.

    A questão da expressão da opinião pessoal em um dos textos foi decisiva para que muitos alunos o identificassem como texto não científico, outros tantos basearam a identificação deste texto como não científico no tema relacionado à fé.          

  

CONCLUSÃO:

    O grupo analisado demonstra em suas respostas uma imagem de ciência bastante ingênua e idealizada, como pudemos perceber pelo número de respostas indicando que apenas textos não-científicos possam conter expressões de opinião pessoal.

    A identificação do científico em um texto paira também em fatores muito superficiais, como  o vocabulário rebuscado e na presença de fatos que baseiem a argumentação textual.

    Nossas análises não chegam a surpreender, já que tratam de alunos do primeiro ano do Ensino Médio, todavia elas se revelam extremamente significativas no tocante à proposta pedagógica a ser desenvolvida para a formação científica do grupo estudado.  

    Entendendo que a pesquisa em ensino de ciências deve ser motivada prioritariamente pela superação de obstáculos encontrados no âmbito da sala de aula, o presente trabalho nos motivou a prosseguir nosso estudo com esses alunos uma questão similar à questão ora analisada, entretanto nos dois novos textos que pretendemos apresentar aos alunos, um deles terá linguajar rebuscado mas absolutamente equivocado do ponto de vista científico enquanto o outro apresentará a opinião científica de um pesquisador na defesa de uma teoria.

    Esperamos assim problematizar a questão do vocabulário e fomentar o debate a cerca da validação de uma opinião ou de um fato no âmbito da ciência.

           
Palavras-chave: Discurso científico, Linguagem cotidiana, Imagem de Ciência.