61ª Reunião Anual da SBPC
D. Ciências da Saúde - 9. Ergonomia - 1. Ergonomia
ESTUDO ERGONÔMICO DO PROCESSO PRODUTIVO DA CASTANHA-DO-BRASIL NA TRIBO KAXARARI EM RONDÔNIA.
Janne Cavalcante Monteiro 1
Ronaldo Sawada Viegas 2
Ari Miguel Teixeira Ott 1
Marcos Melo Barroso 1
Thiago Ferreira Siqueira de Sá 1
1. Fundação Universidade Federal de Rondônia
2. Fundação de Apoio a Ciência e Tecnologia - FUNATEC/RO
INTRODUÇÃO:

Os Kaxarari habitam uma região limítrofe entre os estados de Rondônia e Acre, ocupando uma área aproximada de 145.000 hectares, com uma população de 260 indivíduos, distribuídos em cinco aldeias. Em todas se desenvolvem a coleta da castanha-do-brasil como principal fonte de rendimento, além de autoconsumo para a subsistência do povo.  Mesmo assim, não há um trabalho coletivo, sendo que cada família trabalha individualmente e vende a produção aos atravessadores a preços baixos. Sem alternativas na reserva, muitos índios estão saindo à procura de trabalho em fazendas, passando a compor o exército de mão-de-obra barata dos fazendeiros. O objetivo desta pesquisa é realizar um estudo ergonômico sobre o modo de organização do trabalho e o manejo da Castanha-do-brasil entre os índios da tribo Kaxarari, visando apoiar a sustentabilidade do processo produtivo, através de um diagnóstico da situação de trabalho, identificação de normas regulamentadoras e de sanidade sobre o manejo da castanha-do-brasil, comparando-as com o modo de produção entre o povo Kaxarari e propondo capacitação para atender o manejo adequado. Este estudo mostra a necessidade de implementações de melhorias, procurando não descaracterizar o modo de vida indígena mas contribuir para o desenvolvimento com sustentabilidade em nível micro e macro, incentivando melhorias para a permanência na aldeia com dignidade e minimizando o empobrecimento físico e cultural, processo em franco desenvolvimento na aldeia. 

METODOLOGIA:

Este estudo caracteriza-se como Estudo de Caso utilizando-se a Metodologia da Análise Ergonômica do Trabalho (AET) que permite a abordagem da realidade sistêmica de uma situação de trabalho, através da rastreabilidade do processo produtivo desde a concepção do trabalho até a etapa final. Essa metodologia é participativa, porém, sem interferir no processo produtivo, buscando entender o mesmo através das observações in loco e resgate dos saberes dos sujeitos. Participaram do estudo 45 componentes de 2 aldeias. Para a condução ocorreu: contato inicial com a liderança indígena para a aceitação na participação do estudo e prévia seleção das aldeias; contato com a comunidade indígena das aldeias selecionadas para esclarecimento sobre a pesquisa e aceite/autorização da comunidade; acompanhamento do processo laboral através de visitas técnicas, totalizando 10 visitas para acompanhar o processo produtivo, visto que o ciclo de produção da castanha é anual e o entendimento do processo só pode ocorrer após esgotar-se o ciclo. Foram utilizados: questionários sobre a relação de trabalho e sobre a atividade de trabalho; observações sistemáticas, registros fotográficos das atividades e registro das falas dos sujeitos, freqüentes inquéritos e preenchimento de formulários. Os dados foram tratados através da estatística descritiva e análise qualitativa.

RESULTADOS:

A maioria dos sujeitos (n=34) é do sexo masculino; predomina a faixa etária entre 20-39 anos; a maioria (n=34) sobrevive da produção da castanha ou outros produtos da floresta. A jornada de trabalho é de 11,8 a 12 horas em atividades agrícolas/extrativistas. A produção por família é de 350 a 600 latas de castanha (capacidade de transporte).  Alguns castanhais estão praticamente dentro das aldeias e outros a cerca de 18 km, com 3 horas de caminhada. Os meses de coleta da castanha correspondem ao inverno amazônico, tornando mais difícil o acesso. Nem todos os sujeitos dispõem de animais para transporte do castanhal até a aldeia e alugam animais, muitas vezes dos próprios membros da aldeia que cobram R$2,00 a lata (cada animal carrega 10 latas).  O valor de venda conseguido por lata é em média R$10,00. Há a pré-venda paga pelos “marreteiros” antes da coleta, o que não garante o lucro do índio, pois aceita esses acordos por falta de opção e para suprir necessidades imediatas, não podendo negociar preço. A infra-estrutura disponível para o processo de coleta e armazenamento é precária.Os sujeitos realizam posturas inadequadas e mantidas por muito tempo na quebra da castanha (agachamento e flexão de tronco) nas atividades de quebra e seleção primária, havendo relato de cansaço físico extremo durante toda a atividade de coleta da castanha. A análise de amostra aleatória de castanha-do- brasil de um dos lotes de uma aldeia mostrou que: a classe foi considerada pequena, 7% de castanha defeituosa e/ou danificada, há 2% de impurezas.

CONCLUSÃO:

Observou-se que há uma inserção na cadeia produtiva da castanha-do-brasil nas suas etapas iniciais, ocorrendo informalmente através da utilização de saberes próprios passados de geração em geração, o que nem sempre está de acordo com a normatização. Entretanto, existem práticas que mesmo sem o conhecimento normativo são obedecidas, como é o caso do armazenamento primário longe do alcance dos roedores, ainda na floresta, evitando-se o contato com o solo e a maior proliferação de fungos nos frutos. Essa inserção somente nas etapas iniciais mostra a dificuldade enfrentada advinda dos ínfimos recursos instrumentais e da escassez de subsídios. Verifica-se um aumento de carga de trabalho através do uso do corpo como instrumento de trabalho (e de suporte de carga) para dar conta de cumprir as tarefas e prover subsistência. Esses dados mostram a necessidade urgente de subsídios no processo laboral da castanha junto ao povo Kaxarari, tanto no sentido instrumental, organizacional e financeiro, visto que não se pode descartar o interesse e a vontade desse povo tem em dar conta do trabalho, pois mesmo com todas as problemáticas presentes que enfrentam a cada safra, ainda assim, se mantém dentro da cadeia e produzindo o que a capacidade física lhes permite. Pode-se inferir que haverá uma capacidade de produção maior com apoio tecnológico, mesmo respeitando os limites da floresta, que lhes permita uma melhor inserção no mercado, oferecendo um produto de melhor qualidade e de comercialização.

Instituição de Fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq
Palavras-chave: ergonomia, castanha-do-brasil, povos indígenas .