A maturidade do Ensino de Ciências como corpo de conhecimento especifico, dotado de historicidade, teoria e metodologia próprias, é hoje plenamente reconhecida. No entanto, a par de tendências por vezes revolucionárias na abordagem deste ensino, também são notáveis as dificuldades em identificar, na prática diária, ao menos sinais destes avanços nas formas de ensinar e de aprender.

O presente estudo foi desenvolvido como parte da disciplina Transversalidade e o Ensino de Ciências, oferecida pelo Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências na Amazônia da Universidade do Estado do Amazonas. A pesquisa objetivou conhecer a percepção e a prática da transversalidade dos professores de Ciências das escolas estaduais do município de Manaus que ministram a disciplina de Ciências Naturais no 3º e 4º ciclos do ensino fundamental. O interesse em conhecer de forma mais ampla a percepção e a prática da transversalidade dos professores de Ciências que atuam nas escolas públicas estaduais de Manaus é, principalmente, para estabelecer as tendências e as contradições que sejam positivas para a difusão de um pensamento científico mais espontâneo e crítico do Ensino de Ciências no contexto local.

O presente estudo se caracteriza como qualitativo, já que se deu em escolas (ambientes naturais) como fonte direta de dados e tem o pesquisador como seu principal instrumento (LÜDKE e ANDRÉ, 1996), e também descritivo, por considerar apenas o registro e a descrição dos fatos observados pelo pesquisador sem necessidade da interferência dele (GONÇALVES, 2005).

Para a pesquisa foi elaborado um instrumento de sondagem composto de perguntas semi-abertas divididas em três seções: na primeira, a caracterização da escola; na segunda, as características dos entrevistados; na terceira, percepções sobre Transversalidade, Temas Transversais (TT) e a contribuição do Ensino de Ciências para a prática da transversalidade.Tal instrumento foi aplicado a professores das escolas escolhidas segundo os seguintes critérios: uma escola por bairro; público de alunos dos 3º e 4º ciclos do ensino fundamental e escolas com número maior de alunos que correspondessem no mínimo a 10% do total de escolas da zona escolhida. Para a pesquisa foram visitadas 14 escolas (31% do total) da Zona Sul, distribuídas em 11 bairros diferentes (ou 61% dos 18 bairros da Zona Sul). A pesquisa foi realizada no período de outubro a dezembro de 2006, nas escolas estaduais da Zona Sul de Manaus.

Neste estudo, percebeu-se, entre os professores entrevistados, que a concepção de transversalidade está alinhada com o que é preconizado nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que “pressupõe um tratamento integrado das áreas e um compromisso com as relações interpessoais no âmbito da escola” (MEC,1998, p. 65), já que 95% responderam que transversalidade é a “integração ao currículo de um conjunto de temas, buscando um tratamento didático pelas diferentes áreas do conhecimento”. Mas deve-se enfatizar que nem sempre é o que é posto em prática nas escolas.

O estudo mostrou que 41% dos entrevistados trabalharam o meio ambiente como TT; 38% abordaram os temas entre cidadania e saúde, educação sexual, drogas, saúde e lixo, família, racismo, queimada, educação ambiental; e 21% não trabalharam os TT. De modo geral, os temas trabalhados estão entre os TT sugeridos pelos PCN’s.

Na opinião da maioria dos professores (83%) o ensino de Ciências contribui de maneira efetiva para a implementação dos TT quando coloca seus conteúdos a serviço dos mesmos, incluindo conceitos, procedimentos e atitudes, o que é importante para o desenvolvimento intelectual e social do aluno, como preconizado nos PCN’s.

Os problemas que dificultam um trabalho mais efetivo nas escolas em relação à implementação da transversalidade, estão a sua definição e o modo de trabalhá-la. Tais questionamentos surgiram com as sugestões trazidas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), criados em 1996, e que trouxeram como grande contribuição à abordagem em torno dos Temas Transversais, que exigia, por exemplo, que os conteúdos das disciplinas tradicionais, entre elas Ciências Naturais, deveriam ser consideradas como meios para atingir outros fins, em harmonia com os desafios contemporâneos.

A análise dos dados desta pesquisa na zona sul de Manaus sugerem que, apesar da noção de transversalidade ser bem percebida pelos entrevistados, assim como sua importância na prática e planejamento pedagógicos, também pesam muito, as dificuldades para implementá-la, devendo ser levados em conta obstáculos comumente referidos na área da educação em geral, como a falta de suporte material para e realização de atividades, a falta de capacitação continua dos professores e  a dificuldade de integrar os professores de diferentes áreas num projeto comum.