62ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 7. Educação - 11. Ensino-Aprendizagem
DA INTERDISCIPLINARIDADE ENTRE O ENSINO DE LÍNGUA INGLESA E A LINGUAGEM TÉCNICA DE PROGRAMAÇÃO
Italo Bruno de Souza Silva 1
Antônio José Rodrigues Xavier 1
Dackson Erik da Silva 1
1. FACET / CESMAC
INTRODUÇÃO:
A presente pesquisa trata da Interdisciplinaridade que ocorre entre as disciplinas de Linguagem Técnica de Programação e Inglês Instrumental, ambas trabalhadas a partir da matriz curricular dos cursos de Análise de Sistemas. Pretende-se demonstrar a ocorrência dessa prática e as razões pelas quais essas se dão tão timidamente nas Instituições de Ensino Superior (IES) em Maceió. A pergunta de partida aqui é: em que perspectiva se dá o processo da Interdisciplinaridade entre as disciplinas Inglês Instrumental e Linguagem Técnica de Programação nos cursos de Sistemas de Informação? Para tal análise foram usadas as perspectivas teóricas de Heloísa Lück (1994) e Ivani Fazenda (1993), que entendem Interdisciplinaridade como o diálogo ocorrido entre dois ou mais domínios disciplinares capazes de responderem mais dinamicamente às demandas da complexa sociedade contemporânea. Inicialmente, ainda na fase projetiva dessa proposta, partiu-se do pressuposto que tal diálogo é quase nulo em função da tradição instrucionista e positivista da práxis pedagógica adotada pelas IES. A partir dos resultados obtidos através da execução dessa pesquisa, verificou-se a presença dessa perspectiva didático-metodológica, isto é, a instrucionista e a positivista, porém, percebeu-se que a nulidade da práxis interdisciplinar é relativa. Tal relatividade foi observada a partir da compreensão de que a realidade, no final do século XX e no início do século XXI, passa a ser reconhecida por seus atores sociais, nas IES em Maceió, como complexa e repleta de contradições. Nessa perspectiva, perceberam-se algumas ações que abrigavam pulsões interdisciplinares, porém, naquilo que diz respeito à gestão pedagógica participativa, tais pulsões permaneceram fechadas em seu próprio domínio disciplinar, atendendo ao paradigma positivista . A metodologia adotada na presente proposta é de natureza qualitativa, recorrendo em alguns momentos à quantitativa. Como instrumentos para compor os corpora foram utilizados questionários, entrevistas e observação de eventos da gestão pedagógica nas IES. Diante disso confirmou-se a importância de maiores empreendimentos em pesquisa a respeito dos processos interdisciplinares que estão ocorrendo nas IES locais. Primeiro, para se compreender os significados construídos pela práxis adotada por essas IES, respondendo às demandas feitas pela cultura da sociedade do conhecimento que aos poucos está se instalando em nosso meio. Tal empreendimento implica uma melhor compreensão da construção das identidades, do fluxo de seus imaginários, da preparação desses sujeitos para a vida pública e para a manutenção dos bens culturais e materiais desses sujeitos politicamente organizados, nos termos de A. I. Pérez Gómez (2000). Segundo, para perceber como o processo ensino-aprendizagem tem realizado a construção de determinadas competências desde sua formação básica, até sua passagem pela formação acadêmica superior e suas respectivas projeções profissionais e éticas na sociedade. Por último, para verificar a ocorrência de certa resistência à quebra de paradigmas na gestão educacional das IES em questão, tendo a Interdisciplinaridade como uma das pulsões responsáveis por esse movimento de ruptura.
METODOLOGIA:
O presente trabalho, como dimensão metodológica qualitativa, fez emergir aspectos subjetivos e intersubjetivos no que diz respeito à adoção da interdisciplinaridade em sua gestão pedagógica nas IES. Nessa perspectiva, há o entendimento que está sendo buscada a natureza geral da interdisciplinaridade e, nessa medida, abrir espaço para a interpretação da práxis pedagógica adotada pelas IES. Através de tais procedimentos metodológicos, foram feitas leituras das Diretrizes Curriculares dos Cursos de Computação e Informática, de seus respectivos Projetos Político-Pedagógicos e Planos de Ensino e de Aula desses. Em seguida, utilizou-se essa leitura como base para aplicação de questionários e análise de aula nas IEs envolvidas. Foi aplicado um questionário entre os professores e os coordenadores de curso para melhor perceber que leituras são feitas por esses gestores pedagógicos com relação ao conceito de Interdisciplinaridade e das predisposições das IES em assumir a interdisciplinaridade como práxis em sua gestão pedagógica. Três perguntas centrais foram propostas para todos; a saber: 1. Você acha que a Interdisciplinaridade é importante para o processo ensino aprendizagem? (perceber dimensão valorativa); 2. Nas reuniões pedagógicas há pautas específicas para a prática da Interdisciplinaridade? (perceber dimensão operacional e política); 3. Ao planejar sua ação pedagógica você pensa na Interdisciplinaridade? (perceber dimensão pedagógica). Em sua dimensão metodológica quantitativa, foram verificados aspectos recorrentes a tais qualidades. Assim sendo, através de aplicações de questionários construiu-se um diagnóstico e mapeamento da maturidade e conhecimento prévio de seus atores sociais para a consolidação dessa práxis. Diante disso, encontram-se listados a seguir os tópicos elencados nos questionários e a razão pela qual foram escolhidos: 1. Idade (localizar a perspectiva espaço-tempo para melhor situar sua historicidade); 2. Renda Familiar (verificar a projeção socioeconômica dos atores sociais sobre a historicidade mencionada no tópico 1); 3. Trabalha / Em quê? (estabelecer relações entre os domínios disciplinares, conhecimento prévio, projetos individuais e disponibilidade para formação); 4. Turno em quê estuda (confirmar a expectativa da gestão de que os alunos dos cursos noturnos possuem menos condições para a formação pretendida do que os demais, implicando, sobretudo, a baixa disponibilidade para atividades extra-classes, em uma perspectiva interdisciplinar, como projetos de pesquisa e extensão acadêmica); 5. Estudou em escola pública (estabelecer relações entre a historicidade dos alunos oriundos da escola pública e privada, posto que haja uma leitura, mesmo que no senso comum, de que as instituições educacionais de natureza privada conferem melhores condições para o desenvolvimento da estrutura cognitiva do aluno, sobretudo, no que diz respeito à construção do conhecimento); 6. Projetos em que você está (esteve) envolvido (complementar o item 4 e verificar seu perfil acadêmico); 7. Você já fez algum Curso na área de Informática? (verificar conhecimentos prévios específicos nas áreas investigadas); 8. Você já fez algum Curso de Inglês? (idem item 7); 9. Situações que fez/faz uso da Língua Inglesa (relacionar o conhecimento prévio dos alunos a sua área de aplicação); 10. Você se acha competente no uso da língua Inglesa para o curso de Análise de Sistemas? (idem item 7).
RESULTADOS:
1. Interdisciplinaridade: da gestão pedagógica à construção do conhecimento Interdisciplinaridade é, antes de tudo, um diálogo entre domínios disciplinares. Recorrendo à morfologia do termo, a palavra é formada a partir do prefixo latino inter que quer dizer "posição intermediária, reciprocidade" e o substantivo feminino "disciplina", do latim disciplina, que quer dizer "qualquer ramo do conhecimento (artístico, científico, histórico, etc)" ou "ensino, instrução, educação" . A palavra interdisciplinaridade, aqui, estará sendo usada como atividade comum a duas ou mais disciplinas ou ramos de conhecimento. Segundo Fazenda (1993, p. 15): o pensar interdisciplinar parte da premissa de que nenhuma forma de conhecimento é em si mesma exaustiva. Tenta, pois, o diálogo com outras fontes do saber, deixando-se irrigar por elas. A prática da interdisciplinaridade advém da necessidade de se romper com a visão fragmentada e fragmentária da produção do conhecimento. Tal necessidade, com relação à prática pedagógica, se faz através da busca de uma unidade desfragmentada e desfragmentadora da práxis. Entende-se como práxis a aproximação teórico-prática capaz de transformar uma dada realidade. Nessa perspectiva, afirmamos que a ação Interdisciplinar entende que toda prática pedagógica é uma prática política, posto que ela rompa com o paradigma da tradição que oferece "ao aluno apenas um acúmulo de informações pouco ou nada relevantes para sua vida profissional" (FAZENDA, 1993, p. 15). O conceito de "disciplina" ou "disciplinaridade" resulta do paradigma positivista; hegemônico na consolidação dos sistemas de ensino no Brasil hoje - adotados tanto em sua perspectiva organizacional como curricular -; e é fruto da construção estanque de corpos de conhecimentos específicos e objetos de análise, sobretudo, a partir dos pressupostos teóricos dos trabalhos de Descartes e Newton. Diante disso afirma Lück (2005, p. 54): A superação da fragmentação, linearidade e artificialização, tanto do processo de produção do conhecimento, como do ensino, bem como o distanciamento de ambos em relação à realidade, é vista como sendo possível, a partir de uma prática interdisciplinar. É interessante notar que a proposição de interdisciplinaridade surge, sobremodo, no contexto de instituições de ensino, onde se pratica o ensino e a pesquisa. Nessa perspectiva, estando o conceito de disciplina fundamentado a partir do enfoque epistemológico - "uma ciência (atividade de investigação) [...] cada um dos ramos do conhecimento" (LÜCK, 2005, p. 37) - e a partir do enfoque pedagógico - "atividade do ensino ou o ensino de uma área da ciência [...] ordem e organização do comportamento" (LÜCK, 2005, p. 38), a não adoção do caminho da interdisciplinaridade manterá uma visão linear, atomizadora e isolada sobre si mesma, impedindo uma resposta mais significativa às demandas da sociedade do conhecimento. 1.1 - Interdisciplinaridade: dos (des)caminhos da disciplinaridade à (re)organização da autonomia dos sujeitos na produção do conhecimento A função social de uma instituição, que se predispõe a abrigar o processo ensino-aprendizagem, circula entre dois eixos fundamentais: 1. a preparação para a vida pública e, nessa perspectiva, destaca-se uma aprendizagem que integre a construção de sujeitos críticos para assumirem o processo de desencadeamento da existência e da convivência socio-política e cultural entre esses; 2. a preparação desses sujeitos para realizarem o trabalho de manutenção e/ou transformação de seus bens materiais e culturais. A visão reducionista que a perspectiva disciplinar adota como paradigma tem mantido os sujeitos em formação submetidos à ação cartorial, combatida radicalmente por Paulo Freire, reproduzindo o conhecimento em parcelas isoladas. A superação desse estado seccionado de visão sobre a realidade permite ao sujeito-aprendente um lançar-se compromissado e responsável sobre a construção dessa realidade, sobretudo, como idéia-força gerada a partir dos movimentos civilizatórios e de humanização (LÜCK, 2005, p. 13). Produtora de contradições e ambiguidades A necessidade de superação das dificuldades já expostas cresce em importância para a sociedade e a educação. No entanto, na busca da solução e seus problemas, ambas podem agir (como em geral, infelizmente, vem agindo) de modo a reforçar a ótica do homem-máquina e a visão simplificada do mundo. Para que supere tal ótica, a própria educação deve assumir um paradigma teórico-metodológico que admita contradições, ambiguidades (sobretudo e a partir do contexto imediato e próprio), que aceite conviver com a incerteza e seus mistérios, que consiga ordenar e fazer sentido do caos e da complexidade, sem tirar-lhe a dinâmica, sem artificializa-la e simplifica-la. (LÜCK, 2005, p. 30-31) Nessa perspectiva, cabe o reconhecimento de que tais dificuldades possuem sua historicidade e acompanha as mudanças paradigmáticas sofridas pela sociedade. Para tanto cabe lançar um olhar sobre a teoria de Kuhn (1962), explicando as mudanças de paradigmas na evolução do pensamento científico. Tais mudanças produziram a evolução dos sistemas de produção do artesanal, passou pelo sistema de produção em massa e, atualmente, pela produção enxuta. O meio de produção artesanal usa trabalhadores com grande habilidade e ferramentas flexíveis. O custo dessa produção é alto - muitas vezes o próprio artesão não faz uso de sua produção -, mas a qualidade é excelente. Produção para uma minoria. Com o crescimento urbano e, posteriormente, o evento da Revolução Industrial, inaugura-se o sistema de produção em massa. Destaque seja dado para o "fordismo", tentativa da Ford em baratear os custos e democratizar o acesso aos carros para a grande massa da população. O movimento que prevalece nesse sistema de produção é o push: "o planejamento da produção é "empurrado" para os operários, que empurram as subpartes na linha de montagem e o produto final é empurrado para o cliente, que deve ser convencido a consumi-lo" (VALENTE, 1997, P.33). Alguns problemas surgem com esse sistema de produção: ineficiente, desperdício de matéria-prima, tempo e mão-de-obra. Na tentativa de superar tais dificuldades, foi elaborado pelo sistema de produção japonesa, a produção enxuta. O cliente puxa a cadeia de produção, que ainda é feita em massa. Trata-se da associação do sistema artesanal ao sistema de produção em massa. Diante desse processo histórico de transformações das formas de produção, a sociedade responde ao movimento e começa a demandar novas posições para a prática educacional. De acordo com o paradigma artesanal, a educação era trabalhada pelos mentores e poucos tinham acesso a esse serviço, apenas uma camada mais privilegiada era beneficiada. Com o sistema de produção em massa e com o advento do fordismo, a escola passa a reproduzir o sistema de produção em massa, o aluno passa a ser o produto que está sendo montado e os professores passam a ser os montadores, que adicionam informação ao produto. Ênfase na disciplinaridade, alto sistema de controle e baixa autonomia dos sujeitos envolvidos no processo que respondem a métodos, currículo e disciplinas supervisionadas e dirigidas. No entanto, o paradigma de educação em massa não tem respondido às demandas da sociedade com os significados que essa almeja. Primeiro, porque esse desperdiça o que há de fundamental no homem que é sua capacidade de pensar e de criar, negligenciando sua formação em processo e sua autonomia para contribuir com o resultado final. Segundo, desperdiça com recursos humanos para o processo de policiamento da produção quando, na verdade, deveria estar agregando valor ao processo de produção. Por último, desperdiça tempo e recursos materiais disponibilizando para a sociedade um produto que não é exatamente o que está sendo esperado. A educação, a partir do paradigma da produção em massa, não tem formado profissionais com as competências que a "sociedade do conhecimento" esperava. Em grande parte, entendendo a prática pedagógica como prática política, o modelo de educação para as massas, com o intuito de manter o poder doutrinário e regulador do comportamento, fragmenta e precariza a constituição do homem como sujeito de sua história e essa fragmentação leva a pessoa ao ponto em que, de tanto ver a realidade pela visão de mundo-máquina, de mundo-objeto, defronta-se com o fato de que se transforma nessa mesma máquina, num objeto manipulável externamente e, portanto, sem consciência de sua própria individualidade como ser humano. (LÜCK, 2005, p. 27). Nessa perspectiva, está por nascer a educação que atenda ao sistema de produção enxuta. Como característica fundamental, baseada em projeções teóricas, esse paradigma suscitará a construção da autonomia de pensar e agir dos sujeitos, passar-se-á do "instrucionismo" para o "construcionismo" como paradigma da práxis pedagógica e, antes de tudo, adotar-se-á a interdisciplinaridade rumo a transdisciplinaridade como caminho para realizar a gestão pedagógica. Em Maceió, nas IES, percebe-se alguma ação isolada, mas que não altera significativamente, pois Torna-se necessário e possível, nesse quadro da realidade, trabalhar a interdisciplinaridade como um processo que leva em consideração a cultura vigente e a sua transformação, como condição fundamental para que promova os princípios interdisciplinares. Em primeiro lugar, é necessário que se dê importância a esses princípios, como orientadores da prática e não como parte de um corpo conceitual que se deve integrar logicamente (como acontece na disciplinaridade). [...] Em continuidade, é necessário que se dê atenção ao estágio em que o corpo docente de uma escola se encontra, em relação ao processo interdisciplinar, e motiva-lo a expressar e discutir em conjunto os problemas principais do ensino e seus esforços, sob a ótica da elaboração globalizadora do conhecimento. (LÜCK, 2005, p. 33-34). Assim sendo, fica evidente a necessidade de se transpor os modelos administrativos vigentes no paradigma da educação para as massas, para o conceito de gestão educacional que implicam uma gestão administrativa e uma gestão pedagógica de forma dialógica. Nessa medida, as instituições de ensino passam a ser núcleos aprendentes dos próprios esquemas e articulações que desencadeiam e, sobretudo, quando assumem a perspectiva democrático-crítica que o paradigma participativo propõe. O conhecimento é algo a ser construindo coletivamente, portanto, não aceita estar submetido às hierarquizações, às centralizações e às verticalizações. A partir desse movimento, o processo de construção do conhecimento passa a ser consciente e com energia para: a. reorganizar o modo de produção desestabilizando seus domínios disciplinares rumo à transdisciplinaridade; b. diminuir a distância entre o homem e o conhecimento que produz; c. enfatizar o aprender a aprender, além do aprender a fazer; d. assumir o processo pedagógico como prática social e cultural; e. promover o processo pedagógico como dinâmico, aberto e interativo; f. compreender o conflito como possibilidades de encadeamento de desafios e superações de dificuldades. 1.2 - Interdisciplinaridade: por uma gestão pedagógica democrático-crítica As instituições constantes na organização dos corpora aqui em relevo, devido sua própria natureza e nível de ensino, deveriam estar praticando, segundo essa perspectiva, mais efetivamente a interdisciplinaridade. No entanto, devido à concepção de gestão praticada por essas - e assim se pode constatar -, a interdisciplinaridade não se insere como fundamento que alimenta a prática. Ao referir-se aqui à concepção de gestão, destaque-se aquela nomeada por Libâneo (2003, p. 323) como técnico-científica onde: Prevalece uma visão burocrática e tecnicista de escola. A direção é centralizada em uma pessoa, as decisões vêm de cima para baixo e basta cumprir um plano previamente elaborado, sem a participação de professores, especialistas, alunos e funcionários. A organização escolar é tomada como uma realidade objetiva, neutra, técnica, que funciona racionalmente e por isso, pode ser planejada, organizada e controlada, a fim de alcançar maiores índices de eficácia e eficiência. [...] Este é o modelo mais comum de organização escolar que encontramos na realidade educacional brasileira, embora já existam experiências bem sucedidas de adoção de modelos alternativos, em uma perspectiva progressista. Diante disso, constata-se que os paradigmas de gestão pedagógica sustentados por uma práxis dialética conferem, à interdisciplinaridade, um lugar de realização mais efetivo. Acrescente-se que a compreensão de gestão pedagógica, aqui, refere-se ao comprometimento de todos os sujeitos que integram o processo pedagógico e o empenho necessário para alcançar os objetivos educacionais. Nessa perspectiva, a interdisciplinaridade demanda a autonomia da gestão pedagógica na medida em que, combatendo os movimentos hierarquizadores e verticalizadores das ações individuais sobre as coletivas (próprios dos modelos tecnicistas), desfragmenta a práxis e democratiza a construção do conhecimento em sua dimensão global. Assim sendo, é importante ressaltar que, a partir da gestão pedagógica em uma perspectiva interdisciplinar, os atores sociais envolvidos no processo constroem o conhecimento a partir da prática (movimento coletivo) e não da ação (movimento individual). Nessa perspectiva, foram selecionados dois cursos: um em uma IES pública e outra em uma IES privada. Tal escolha se deu a partir dos seguintes critérios: 1. A diferença entre a natureza institucional (pública ou privada), considerando-se a origem de seus recursos financeiros, suas finalidades (lucrativas ou não), as relações de trabalho, a escolha dos alunos e suas respectivas formas de acesso e manutenção; 2. A equivalência dos cursos de computação como atividade meio e, nessa medida, poder se tornar alvo de análise de forma análoga. Segundo as Diretrizes Curriculares dos Cursos de Computação e Informática, sua estrutura curricular abstrata divide-se em quatro áreas, a saber: a de formação básica, a de formação tecnológica, a de formação complementar e a de formação humanística. Os cursos da área de Computação e Informática podem ser divididos em quatro categorias: os cursos que têm a computação como atividade fim, os cursos que têm a computação como atividade meio, os cursos de Licenciatura em Computação e os cursos de Tecnologia (cursos seqüenciais). A presente pesquisa limita-se aos cursos que têm a computação como atividade meio, portanto, "que visam à formação de recursos humanos para a automação dos sistemas de informação das organizações" (Diretrizes Curriculares para os cursos de Computação e Informática, 1998, p. 19). O recorte que aqui está sendo apresentado investiga a ação interdisciplinar entre o ensino de Língua Inglesa em abordagem instrumental e o ensino de Linguagem Técnica de Programação. Verificou-se, na matriz curricular das referidas IES, a presença de tais domínios disciplinares. Trabalharemos com informações obtidas através de um questionário cujo objetivo é diagnosticar de forma ampla o campo. Esse questionário foi aplicado em professores e coordenador de curso, porém manteremos suas identidades em sigilo e doravante denominaremos "Professor 1", "Professor 2", "Professor 3", "Professor 4", "Professor 5" e "Coordenador". 1. Perfil dos Entrevistados: 1.1. Professor 1 IES privada, professor de Linguagem Técnica de Programação, mestre; 1.2. Professor 2 IES privada, professor de Inglês Instrumental, mestre e doutorando; 1.3. Professor 3 IES privada, professor de Linguagem Técnica de Programação, especialista; 1.4. Professor 4 IES privada, professor de Linguagem Técnica de Programação, especialista e mestrando; 1.5. Professor 5 IES pública, professor de Inglês Instrumental, mestre; 1.6. Professor 6 IES pública, professora de Inglês Instrumental, doutoranda; 1.7. Professor 7 IES pública, professor de Linguagem Técnica de Programação, mestre; 1.8. Professor e Coordenador (1) IES pública, professor de Linguagem Técnica de Programação e Coordenador de Curso; 1.9. Professor e Coordenador (2) IES privada, Professor e Coordenador de Curso, mestre. Inicialmente, de acordo com os dados coletados através de questionários aplicados aos professores e aos coordenadores, percebeu-se que 100% dos entrevistados entendem que a interdisciplinaridade é um fator importante no processo ensino-aprendizagem. Houve algumas observações adicionais: Professor 2: "Aponto tanto para a resistência à mudança por conta dos docentes, como para as instituições que não estão sensíveis a causa, portanto, resistem a um empreendimento efetivo na quebra de paradigma da gestão educacional. Afirmo que a ação interdisciplinar é quase nula e isso tem comprometido a qualidade do processo e a efetiva construção das competências planejadas" Professor 3: "Se a interdisciplinaridade fosse totalmente difundida, os conhecimentos de diversas disciplinas, mesmo em áreas diferentes, seriam melhor assimilados. Desta forma a união dos professores seria de maior efeito do que cada esforço docente individual". Professor 4: (não preencheu o questionário, alegou não haver tempo disponível e pediu que passasse posteriormente. Foi procurado outras vezes e não houve resposta.) Professor 5: "No ensino de Língua Inglesa Instrumental, são consideradas duas redes de conhecimento: (1) Conhecimento prévio de Língua Estrangeira e (2) Conhecimentos específicos à área estudada, adquiridos ou já experimentados e a "combinação" destas redes." Professor 6: Acredito que o processo de relacionar conhecimentos é enriquecedor tanto para os próprios conhecimentos que se multiplicam quanto pelo próprio processo cognitivo no ato de relacionar informações diversas. Professor e Coordenador (1): (afirmou a importância da interdisciplinaridade, porém não acrescentou nenhuma reflexão). Professor e Coordenador (2): (afirmou a importância da interdisciplinaridade, porém não acrescentou nenhuma reflexão). Pode ser constatado que os professores destacados - salvo o Professor 4, 5 e 6 - defendem a posição de que se houvesse maior empreendimento por conta da gestão, essa prática se tornaria mais freqüente e essa freqüência incidiria diretamente na qualidade do curso. Constata-se também que os referidos professores trabalham disciplinas de áreas do conhecimento diferentes. Apesar de nenhum deles destacar esse fato, percebe-se que ambos compreendem que a presença do diálogo disciplinar é de fundamental importância. Na aplicação dos questionários, foram observadas algumas reações: a. o Professor 4 não abriu espaço para tecer considerações sobre a pauta e foi enfático, sobretudo, na falta de tempo. O referido professor presta assessoria à iniciativa privada e, nessa medida, estava sobrecarregado de trabalho burocrático; b. o Professor e Coordenador (1), a partir de observação feita in presentia pelos entrevistadores dessa pesquisa, tratou-os com certa resistência à colaborar com este trabalho, negando a aplicação do questionário nas suas aulas e respectivas gravações. O Professor 5 preferiu destacar o ensino de Língua Inglesa em abordagem Instrumental - conceito e operacionalidade. Em um segundo momento, outro aspecto foi observado, ainda sobre o empreendimento da gestão pedagógica na ação interdisciplinar, dois professores afirmam que em reuniões com a coordenação houve pautas específicas sobre a Interdisciplinaridade, porém nunca deram continuidade ao assunto: Professor 1: "Houve discussões sobre este assunto quando foi discutida a nova grade do curso, mas em geral as discussões somente ocorrem em grupos específicos de disciplinas como programação dos primeiros períodos"; Professor 3: "Este assunto é mencionado em reuniões, mas não surgem propostas concretas, nem são disponibilizados horários (departamento) na qual professores de disciplinas diferentes possam fazer juntos um planejamento."; Segundo a afirmação do Professor 1 - "Houve discussões sobre este assunto quando foi discutida a grade do curso" -, evidencia-se o fato que quando a comunidade de docentes, em reunião pedagógica, discutiu a matriz curricular, percebeu que há uma clara relação entre currículo e interdisciplinaridade. Esse fato denota que, na formação pedagógica desses docentes, tal questão foi trabalhada e eles a vêem de forma positiva. Com relação às disciplinas, que a partir de agora os professores começam a observar, o Professor 1 faz alusão a "grupos específicos de disciplinas", por conta da discussão sobre a matriz curricular, e o Professor 3 levanta a questão de que "professores de disciplinas diferentes possam fazer juntos um planejamento". Destaque-se o fato de apenas um professor considerar as diferentes disciplinas do curso. Em seguida, observe-se que o Professor 2, o Professor 5 e o Coordenador confirmam que nas reuniões não tem sido inserido uma pauta específica para que seja discutida a prática da interdisciplinaridade. Vejamos os depoimentos de cada um deles: Professor 2: "Por serem práticas extremamente sustentadas pela cultura pedagógica da tradição, as reuniões pedagógicas tornam-se mais propícias para uma revisão de regras já estabelecidas, do que propriamente a construção de olhares sobre outros paradigmas. Sinto que as IES só modificam suas práticas quando são obrigadas a isso por força da Lei ou pressão do mercado."; Professor 5: "Embora não haja uma pauta específica, os professores do módulo vigente fazem reuniões formais ou não (colegiado) nas quais sinalizam com possíveis trabalhos integradores. Os mesmos são comunicados aos alunos no início do semestre letivo."; Coordenador de Curso: "Aconteceu uma ação para cobrar dos professores o mapeamento das ações e conteúdos interdisciplinares, mas não foi dado prosseguimento.". Tanto o Professor 2 como o Coordenador de Curso trabalham para a iniciativa privada e concordam que de alguma forma as ações interdisciplinares são abortadas. O Professor 2, que também trabalha para a iniciativa privada, destaca o fato de uma "cultura pedagógica da tradição", onde podemos observar a cristalização de uma postura estanque, compartimentada e fragmentária. Ele também atenta para as relações de poder fazendo um levante sobre os "legalismos" e a economia de mercado, característica das tendências neoliberais. Observando a fala do Professor 5, ele sinaliza para uma ação colegiada - destaque-se seu trabalho em uma IES pública - e para "possíveis trabalhos integradores". Apesar dessa ação ainda está condicionada ao "módulo vigente" - instância relativamente fragmentada - ele já assume uma perspectiva interdisciplinar. Fazendo uso do posto por Lück (2005, p. 61 e 62), a ênfase encontra-se aqui quando adota aspectos processuais -"busca de interação de duas ou mais disciplinas"-, aspectos técnicos -"uma ferramenta utilizada para produzir novos conhecimentos, pela integração dos já produzidos"- e aspectos de resultados -"síntese de duas ou mais disciplinas, da modo a estabelecer um novo nível de representação da realidade, mais abrangente, de que resulta o estabelecimento de novas relações". Por fim, sobre a questão do planejamento de sua ação pedagógica tendo como fundamento a interdisciplinaridade, obteve-se uma resposta 100% positiva com relação à importância da interdisciplinaridade para a construção das competências prescritas pelas Diretrizes Curriculares e uma qualidade pretendida pela práxis pedagógica. Os professores falaram o seguinte, sobre isto: Professor 1: "As discussões com os demais professores são importantes para tal planejamento."; Professor 2: "Como trabalho com língua e entendo essa como um fenômeno social e político, não posso deixar de admitir essa necessidade, mas destaco que trabalho mais a intertextualidade do que a interdisciplinaridade. Andei observando que os alunos fazem mais uso do léxico da língua do que da língua como fenômeno comunicacional."; Professor 3: "Penso na interdisciplinaridade quando faço meus planos de aula, não existe forma de fugir disso, já que a linguagem de programação está diretamente ligada a uma língua estrangeira, porém não entro a fundo na questão, por não haver tempo hábil para planejamento em conjunto."; Professor 5: "Faço inicialmente uma coletânea de textos relacionados à área e estabeleço espaços específicos no plano da disciplina que permita a interação com outras unidades curriculares que estejam sendo ofertadas paralelamente.". Dentre todos os depoimentos, destaque-se o fato de apenas o Professor 3 ter evidenciado a importante relação entre o ensino de Linguagem Técnica de Programação e de Língua Inglesa e o Professor 5 ter se referido ao seu procedimento metodológico com relação ao ensino de Língua Inglesa em abordagem instrumental. O Professor 4, quando procurado para entregar o questionário, informou que ainda não havia terminado de preenche-la. Essa pesquisa encontra-se ainda em processo, com o avançar dela serão empreendidos mais esforços na interdisciplinaridade entre o ensino de Língua Inglesa e a Linguagem Técnica de Programação. Até o presente momento, o presente trabalho debruçou-se na organização do diagnóstico do campo e na construção do arcabouço teórico. Finalmente, a Interdisciplinaridade, desestabilizando os domínios disciplinares através de seus diálogos, exige: a. uma gestão educacional descentralizada e descentralizadora que confira ao processo ensino-aprendizagem deflagrado maior autonomia para se alcançar os objetivos educacionais; b. a construção de uma instituição educacional aprendente, isto é, capaz de aprender com a própria prática, posto que reconheça o valor de se trabalhar os objetos em estudo em uma perspectiva crítico-reflexiva, a partir de uma visão mais global e não compartimentada da realidade, conforme demanda a sociedade do conhecimento; c. a passagem do "instrucionismo" para o "construcionismo", fato esse que, de antemão, implica uma quebra de paradigma com relação às práticas adotadas pelas IES brasileiras na contemporaneidade; d. um efetivo empreendimento em pesquisa e na conseqüente formação contínua dos professores; e. uma definição clara das relações de trabalho, implicando a assunção entre as partes da ruptura com a concepção de que o trabalho do professor se resume à sua ação em sala de aula e, portanto, deve se estender a outros espaços e dimensões, com direito a remuneração. 2. Descrição da Categoria dos Cursos como atividade meio baseado nas Diretrizes Curriculares para os cursos de Computação e Informática 3. Análise dos materiais Após revisão do projeto inicial, foram selecionados dois cursos, um em uma IES pública e outro em uma IES privada. Tal escolha se deu a partir dos seguintes critérios: 3. A diferença entre a natureza institucional (pública ou privada), considerando-se a origem de seus recursos financeiros, suas finalidades (lucrativas ou não), as relações de trabalho, a escolha dos alunos e suas respectivas formas de acesso e manutenção; 4. A equivalência dos cursos de computação como atividade meio e, nessa medida, poder se tornar alvo de análise de forma análoga. O recorte que aqui está sendo apresentado investiga a ação interdisciplinar entre o ensino de Língua Inglesa em abordagem instrumental e o ensino de Linguagem Técnica de Programação. Verificou-se, na matriz curricular das referidas IES, a presença de tais domínios disciplinares. Foram também utilizados questionários voltados para a parte docente do curso, com intuito de detectar se houveram pautas específicas sobre a Interdisciplinaridade, o que a parte pensa sobre a importância da Interdisciplinaridade no processo ensino-aprendizagem e saber se Interdisciplinaridade é usada na preparação de seu conteúdo didático. Para finalizar, foram executadas gravações de áudio nas aulas das disciplinas tratadas (Inglês Instrumental e Linguagem técnica de programação), para verificação da interação entre a parte discente e a parte docente. O método utilizado nesta pesquisa é o qualitativo, porém, com algumas recorrências ao quantitativo.
CONCLUSÃO:
A presente pesquisa tornou-se apenas um passo no sentido de investigar os procedimentos interdisciplinares entre a disciplina "Inglês Instrumental" e "Linguagem Técnica de Programação". Na verdade, ao investigar o campo, foi percebido que a prática interdisciplinar não era prioridade da gestão pedagógica e não estava sendo levada a termo. Em seu lugar adotavam-se os procedimentos intertextuais crendo se tratarem de interdisciplinaridade, portanto, tal fato dificultou um empreendimento mais efetivo no objetivo traçado. Sugere-se, em um futuro próximo, através da pesquisa-ação como metodologia, novo investimento nessa perspectiva. Porém, fica registrado que: 1. A prática interdisciplinar não tem sido assumida por conta da herança positivista e racionalista da disciplinaridade que as instiuições de ensino, de forma em geral, não conseguem superar; 2. A cultura gestora (administrativa e pedagógica) não tem, em função da predominância do modelo técnico-científico, se empenhado em quebra de paradigmas e investimentos na interdisciplinaridade; seja por questões culturais e circunstanciais, como os tradicionalismos vigentes, seja por questões pedagógicas, como a predominância do instrucionismo sobre o construcionismo; Novos empreendimentos devem ser realizados para conhecer os caminhos da interdisciplinaridade e transdisciplinaridade e, nessa medida, verificar que contribuições potencializariam o melhor cumprimento da função social que as IES devem cumprir.
Instituição de Fomento: CESMAC
Palavras-chave: Interdisciplinaridade, Ensino-Aprendizagem, Gestão Pedagógica.