62ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 12. Educação Física e Esportes - 1. Educação Física e Esportes
A CULTURA DE MOVIMENTO E A PESCA DA LAGOSTA NO RIO GRANDE DO NORTE: REFLEXÕES SOBRE SAÚDE
Moaldecir Domingos Junior 1
Hellyson Ribeiro Costa 2
Maria Isabel Brandão de Souza Mendes 3
Jorge Eduardo Lins Oliveira 5
Sérgio de Souza Mendes 4
1. Depto. de Educação Física - UFRN
2. Depto. de Educação Física - UFRN
3. Profa. Dra./Orientadora - Depto. de Educação Física - UFRN
4. Hospital Naval de Natal
5. Prof. Dr. - Depto. de Oceanografia e Limnologia - UFRN
INTRODUÇÃO:

A cultura de movimento refere-se às relações existentes entre as formas de se movimentar e a compreensão de corpo de uma determinada sociedade, comunidade, de uma cultura (Mendes, 2002). Dessa forma, percebemos a pesca da lagosta com compressor como uma manifestação da cultura de movimento dos pescadores. Esses aventureiros do mar possuem uma forma de sistematizar o ato da pesca, uma linguagem própria e uma percepção do corpo particular. Tendo como base esse conceito de cultura de movimento, objetivamos fazer o levantamento dos acidentes de mergulho registrados no Hospital Naval de Natal, bem como identificar o perfil sócio-econômico de pescadores de lagosta, as características culturais de onde vivem e as principais doenças descompressivas, estabelecendo relações com a saúde. A importância desse estudo reside no fato de trazermos contribuições para a identificação de características da população pesqueira, com vistas a refletir sobre a realidade de uma manifestação da cultura de movimento do mar. Pretendemos ainda trazer elementos sobre o papel da Educação Física, enquanto componente curricular na escola, como espaço destinado à discussão sobre o corpo, a saúde, a natureza e a cultura.

METODOLOGIA:

No primeiro momento foi feito um estudo sobre o conceito de cultura de movimento, saúde e as principais doenças descompressivas. Posteriormente foi feita a leitura dos registros do Hospital Naval de Natal de 2003 a 2008, com base nos prontuários médicos de atendimento aos acidentados de mergulho. Em seguida, codificamos os dados desses prontuários, com a análise temática e a configuração de categorias. Depois, participamos no estudo de campo para identificar em locus as características culturais das colônias de pescadores selecionadas no estudo. Nessa parte da pesquisa, entrevistamos os pescadores no intuito de conhecer mais sobre a pesca da lagosta e os aspectos da realidade que os cercam. Utilizamos a análise de conteúdo como técnica de pesquisa para interpretar o questionário (BARDIN 1979 apud MINAYO 2009). As entrevistas foram coletadas com um aparelho reprodutor de mp3. Além das entrevistas, realizamos uma leitura da realidade a partir de observações, anotações e fotografias direcionadas as escolas, postos de saúde e espaços de lazer.

RESULTADOS:

Na análise dos registros dos acidentados de mergulho do Hospital Naval de Natal de 2003 a 2008 constatamos que houve 50 acidentes de mergulho no período investigado. Identificamos ainda a quantificação dos tipos de doença descompressiva tipo I e a do tipo II. A primeira apresenta sintomatologia como prurido no corpo e dores articulares. A segunda caracteriza-se por manifestações neurológicas podendo evoluir para colapso e morte (ELLIOTT, 1995; MUÑOZ-DELGADO; 1991). Desse total, 58% apresentaram a do tipo II e 42%, a do tipo I.  Mais da metade dos acidentados possuem entre 25 e 45 anos e residem no Rio Grande do Norte, sendo apenas 20% de outros estados tais como Ceará (8%), Paraíba (6%) e Pernambuco (6%). 88% são mergulhadores amadores e a maioria dos acidentados passaram no mínimo 90min sob a água numa profundidade que varia entre 30 a 50m. Entrevistamos 24 pescadores nos locais onde houve mais acidentes: Baia Formosa (5), Rio do Fogo (7), em Caiçara do Norte (6) e Cajueiro (6). Todos possuem ensino fundamental incompleto e vivem com uma renda mensal de aproximadamente um salário mínimo por mês. Quase todos já são casados e possuem mais de um filho e pescam lagosta há mais de 20 anos. 

CONCLUSÃO:

Diante dos resultados apresentados, notamos quanto é complexo o fenômeno da pesca da lagosta com compressor no Rio Grande do Norte e que deve envolver diferentes áreas do conhecimento (Biologia, Sociologia, Medicina, Educação Física, Serviço Social, Filosofia, etc.) na busca de soluções para essa problemática, além da participação dos próprios pescadores e do Governo. Essa manifestação cultural é considerada uma prática ilegal e está deixando vários acidentados e óbitos de pescadores e prejudicando a existência da lagosta. É uma questão de sobrevivência tanto por parte dos pescadores quanto pela lagosta. Portanto, torna-se necessário que essa manifestação da cultura de movimento seja abordada nas aulas de Educação Física nas escolas litorâneas e que se possam tecer reflexões sobre corpo, saúde e o restante da natureza, com base na realidade. Que corpos são esses que destroem sua própria fonte de renda? Que opções eles possuem? É importante ainda a realização de reflexões sobre o ensino de outras técnicas de pesca, outras formas de cultivo da lagosta, outras maneiras de trabalhar com dignidade na e para a natureza. Reflexões sobre os conceitos de saúde e doença de modo que não o compreendam como oposições, mas a partir de uma perspectiva existencial.

Instituição de Fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq
Palavras-chave: Saúde, Corpo, Natureza.