62ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 13. Serviço Social - 7. Serviço Social
FAMÍLIA, GENÊRO E VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA AS CRIANÇAS: UM ESTUDO SOBRE OS POSICIONAMENTO E VISÕES DAS MÃES DAS CRIANÇAS DO SEXO FEMININO VITIMIZADAS DE ABUSO SEXUAL DOMÉSTICO 
ALINE SOUSA SAMICO 1
1. UNIVESIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
INTRODUÇÃO:

O presente trabalho tem como tema central o abuso sexual doméstico. O objetivo foi compreender e interpretar os posicionamentos das mães de crianças do sexo feminino vitimizadas sexualmente por seu pai biológico ou padrasto. O fenômeno do abuso sexual é um problema internacional, presente em distintas épocas, países, etnias e classes sociais. Pode ser praticado por indivíduos com pouca convivência, como amigos da família ou por pessoas que não tiveram contato anterior com o (a) vitimizado (a) nos casos do abuso praticado por estranhos, configurando o abuso sexual extrafamiliar ou até mesmo por pessoas que fazem parte do convívio direto do (a) vitimizado (a) como pais, avôs, primos, tios, padrastos - no caso do abuso sexual doméstico. A realização deste estudo pode contribuir para a desprivatização dos casos de abuso sexual doméstico, o aumento de denúncia feita pelos próprios familiares e a prestação de atendimento psicossocial efetivo e de qualidade aos vitimizados e seus familiares.

METODOLOGIA:

Neste trabalho, optou-se por desenvolver uma pesquisa eminentemente qualitativa. Realizou-se pesquisa bibliográfica, documental bem como observação direta no Serviço de Atendimento Psicossocial a Crianças e Adolescentes vítimas de Violência Sexual do Espaço Aquarela do município de Fortaleza - Ce no qual foi realizado exploração de aproximadamente cento e trinta prontuários que continham diversos casos de abuso ou exploração sexual de crianças e/ou adolescentes dos quais se escolheu cinco para a realização das histórias de vida temática. As entrevistas realizadas foram norteadas por um roteiro de perguntas sobre os seguintes temas: infância, adolescência, família e gênero, significados do abuso e violência. As informações apreendidas via gravador foram estritamente confidenciais e sigilosas. O período de realização destas entrevistas foi entre os dias vinte e nove de agosto e dezoito de setembro de 2008. Dentre as cinco entrevistas realizadas, duas ocorreram na residência das mães e as demais no Serviço de Atendimento a Criança e Adolescentes Vítimas de Violência Sexual. Após a coleta dos dados ditos e não-ditos pelas mães mediante a aplicação das entrevistas, buscou-se torná-los inteligíveis através da fase analítica dos dados.

RESULTADOS:

A relação mãe/mulher - filha/vitimizada - pai/vitimizador é atravessada por sentimentos ambíguos e contraditórios. Estes sentimentos foram identificados nos discursos proferidos pelas interlocutoras da pesquisa as quais apresentaram distintos posicionamentos que variaram de acordo com a teia complexa de suas vivências, nas quais se destaca: a dependência econômica das mães em relação aos abusadores, em famílias onde a mulher é dependente economicamente do esposo e não possui vínculo com membros da família ampliada (tios, irmãos, primos e etc) o abuso sexual costuma perdurar por anos; o forte vínculo afetivo mantido com o violentador, a forma como os membros da família se relaciona e mantém sua afetividade e dependência emocional é um dos fatores que contribuem com as diversas atitudes das mães; a forma como essas mães significam o feminino e o masculino, a divisão tradicional de papéis que determina diferentes funções para o homem e a mulher; além dos significados de família, com predomínio daquelas que desconsideram ou secundarizam a proteção, e o respeito às crianças; bem como suas experiências familiares, da infância e da adolescência atravessadas por diversas modalidades de violência.

CONCLUSÃO:
As trajetórias de vida das mães foram perpassadas por outras manifestações da violência ocorridas com suas famílias ampliadas, com seus filhos e com elas próprias. Percebeu-se que nessas fases, o fenômeno da violência se alastrou de forma avassaladora nos interstícios de suas vidas domésticas de forma naturalizada, levando-as, por vezes, ao não estranhamento das práticas violentas que ocorreram no seio de suas famílias. No tocante à concepção de gênero, os sentidos de "ser homem" e do "ser mulher" aparecem atravessados por discursos que denotam de padrões de comportamentos distintos para homens e mulheres, atrelando o "ser mulher" à maternidade. A desconstrução da concepção da família como clã "sagrado" parece indispensável para que os conflitos e a violência possam se tornar visíveis e ultrapassem as barreiras do silêncio. Portanto, o processo rumo a publicização dos casos de abuso-vitimização sexual tem se dado de forma gradual e requer a atuação conjunta dos órgãos competentes através do estabelecimento de uma rede socioassistencial articulada e eficaz, bem como a realização de contínuas capacitações com os profissionais que trabalham diariamente com as crianças e adolescentes vitimizados, para que suas atuações garantam os direitos inalienáveis do público infanto-juvenil.
Palavras-chave: maternidade, genêro, abuso sexual doméstico contra crianças e adolescentes.