62ª Reunião Anual da SBPC
E. Ciências Agrárias - 3. Recursos Florestais e Engenharia Florestal - 6. Recursos Florestais e Engenharia Florestal
DIVERSIDADE E EXTRATIVISMO DE SEMENTES FLORESTAIS PARA A CONFECÇÃO DE ARTESANATOS NA CIDADE DE RIO BRANCO, ACRE
Evandro José Linhares Ferreira 1
Luzia Barbosa de Assis 2
Christiane Ehringhaus 3
João Lopes Firmino 1
José de Ribamar Bandeira 1
João Bosco Nogueira de Queiroz 1
1. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA/Núcleo de Pesquisa do Acre
2. Herbário do Parque Zoobotânico (HPZ), Universidade Federal do Acre - UFAC
3. Center for International Forestry Research - CIFOR/Brasil
INTRODUÇÃO:
O uso de sementes florestais nativas para a elaboração de artesanatos é uma atividade típica das populações tradicionais da Amazônia. No Acre, que possui cerca de 90% de suas florestas preservadas e uma economia fortemente ligada ao extrativismo vegetal, tem-se observado nestes últimos anos um processo gradual de 'urbanização' da elaboração desses artesanatos. Esta mudança do meio rural para o meio urbano reflete o processo de profissionalização da atividade, que gradualmente tem adotado técnicas modernas de design e marketing, resultando em produtos de maior qualidade, melhores preços e, principalmente, a abertura de novos mercados. Apesar da dinâmica e do franco crescimento da atividade, alguns aspectos de sua cadeia produtiva continuam pouco conhecidos e podem impactar negativamente a sustentabilidade da mesma no longo prazo. Estes são os casos da diversidade das espécies exploradas, a intensidade da extração e coleta, bem como as práticas de armazenamento e beneficiamento preliminar das sementes correntemente utilizadas por extrativistas e artesãos envolvidos. O presente estudo aborda estes aspectos da cadeia produtiva de artesanatos elaborados com sementes de plantas nativas no mercado da cidade de Rio Branco, o maior e mais dinâmico de todo o Estado do Acre.
METODOLOGIA:
Para a determinação da diversidade de espécies utilizadas pelos artesãos foram realizadas visitas a 5 lojas e 3 oficinas de produção de artesanatos no perímetro urbano de Rio Branco (10º02'11"S; 67º47'43"W). Sementes distintas, integrantes de artesanatos à venda nas lojas ou em processo de beneficiamento nas oficinas, foram identificadas preliminarmente pelos lojistas e/ou artesãos. A identificação definitiva dessas sementes foi feita mediante consulta à coleção do Herbário do Parque Zoobotânico da Universidade Federal do Acre (HPZ) e referências bibliográficas pertinentes. As informações relativas ao sistema e intensidade de extração, coleta, armazenamento preliminar e transporte das sementes da floresta até as oficinas de artesanatos na zona urbana foram obtidas mediante a realização de entrevistas e monitoramento in loco de todo o processo junto a 4 extratores residentes às margens do rio Acre, no município de Porto Acre (09°35'18''S; 67°31'57'W). As informações sobre o sistema de armazenamento, bem como as técnicas de beneficiamento preliminar das sementes adotadas pelos artesãos, foram obtidas mediante o acompanhamento in loco do trabalho em 3 oficinas de artesanato.
RESULTADOS:
Sementes de 24 espécies são usadas na confecção de artesanatos. A maioria (58,3%) é oriunda de palmeiras nativas encontradas em áreas de florestas primárias e secundárias ou em pastagens existentes nas cercanias de Rio Branco. Sementes de açaí (Euterpe precatoria) são obtidas livremente na cidade em pontos comerciais que preparam a polpa e o 'vinho de açaí'. Sementes de sibipiruna (Caesalpinia pluviosa var. peltophoroides), cultivada como ornamental, são colhidas livremente em praças e jardins da cidade. A extração e coleta de sementes das outras espécies são realizadas sem a observação de regras mínimas de manejo sustentado pelos extrativistas. Geralmente todas as sementes com potencial comercial (70-90% dos cachos/ramos/unidades sobre o solo) são colhidas, deixando-se no local um excedente insuficiente para garantir a regeneração das plantas e a alimentação da fauna nativa. O beneficiamento no campo consiste em eliminar o excesso de umidade e o armazenamento é evitado porque a venda das sementes é feita por peso. A venda geralmente é feita por encomenda de quantia certa para entrega em data pré-determinada. Nas oficinas, as sementes são novamente secas, selecionadas, lixadas, furadas e, se for o caso, tingidas. Sementes com excesso de umidade geralmente são descartadas.
CONCLUSÃO:
A manutenção e eventual intensificação da prática do extrativismo de sementes nativas para a confecção de artesanatos em Rio Branco poderá causar o desaparecimento da maioria das populações das espécies florestais atualmente exploradas em zonas rurais adjacentes à cidade. Esta possibilidade pode ser parcialmente creditada às práticas não sustentáveis adotadas pelos extrativistas envolvidos na atividade e à crescente demanda de sementes para uso local e para a exportação. Neste último caso, a valorização comercial de muitas espécies facilmente acessíveis, como são os casos das palmeiras jarina (Phytelephas macrocarpa), paxiubinha (Socratea exhorriza) e tucumã (Astrocaryum aculeatum), tem incentivado excursões crescentes de trabalhadores urbanos à zona rural com o objetivo primordial de coletar a maior quantidade possível de sementes. Coincidentemente, as espécies citadas acima são também as mais prejudicadas, dentre todas as que foram estudadas nesta pesquisa, porque apresentam uma produção anual de sementes naturalmente baixa. Uma possível solução para minorar a pressão sobre as espécies mais vulneráveis é a realização de estudos de estrutura e de dinâmica populacional para subsidiar a determinação das práticas extrativistas sustentáveis mais adequadas para cada uma delas.
Instituição de Fomento: Projeto 'Cenários e trajetórias extrativistas'/Yale School of Forestry & Environmental Studies
Palavras-chave: sementes florestais, artesanato, extrativismo.