62ª Reunião Anual da SBPC
H. Artes, Letras e Lingüística - 3. Literatura - 2. Literatura Comparada
LITERATURA E CONHECIMENTO DO MAR: IMAGENS MARÍTIMAS NA OBRA DA POETISA POTIGUAR ZILA MAMEDE
Carlos André Pinheiro 1
1. Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
INTRODUÇÃO:
As imagens do mar são frequentes na obra de Zila Mamede e, de certa forma, retratam a experiência de um sujeito inserido em uma cidade cercada por dunas e delineada por um litoral quase paradisíaco. Evidentemente, parte das práticas sociais desse lugar é definida em função dessas características naturais. Nesse sentido, o principal objetivo deste trabalho é mostrar como os conhecimentos do mar contribuíram para a elaboração da temática marítima na poesia de Zila Mamede. Alguns objetivos específicos também nortearam a pesquisa, proporcionando uma visão mais ampla do objeto de estudo; pretende-se indicar, por exemplo, as funções desempenhadas pelas águas do mar na obra da poetisa, bem como analisar as escolhas formais utilizadas para mimetizar a realidade desse ambiente natural. Trata-se de um trabalho verdadeiramente relevante: primeiro, porque é um estudo crítico voltado para a obra de uma autora potiguar (com ênfase em temas e aspectos característicos da realidade local), contribuindo, portanto, para a divulgação e para a solidificação da cultura do Rio Grande do Norte; depois, a temática está sendo analisada sob uma abordagem inovadora, já que não ver o mar apenas como uma projeção do eu-lírico, mas antes como uma imagem ligada a uma realidade social ampla.
METODOLOGIA:
Antes de qualquer coisa, criou-se um corpus composto por poemas de Zila Mamede em que a temática marítima aparecia como matéria de relevância. Depois, os textos foram minuciosamente analisados sob a perspectiva teórica da dialética, levando-se em consideração a composição estrutural e o condicionamento social da obra. As análises buscam mostrar como determinados componentes da sociedade são transformados em uma estrutura textual. É por esse motivo que (mesmo sendo um objeto estético com relativa autonomia) a estrutura de um texto literário pode revelar dados extrínsecos à obra. O presente trabalho pretende promover, portanto, um diálogo entre a literatura e a sociedade. Com o intuito de fundamentar a discussão, fez-se também uma revisão bibliográfica de estudos referentes ao litoral potiguar (captando peculiaridades do ambiente e analisando características que possam ter motivado a criação poética de Mamede). Em última instância, talvez seja oportuno mencionar que foram visitados alguns locais descritos na obra, pelo menos aqueles em que a referência era mais evidente; procurou-se vivenciar as experiências retratadas, flagrando de perto a forma objetiva que motivou a realidade subjetiva do texto.
RESULTADOS:
A experiência assídua de Zila Mamede com o mar lhe forneceu um conhecimento que se traduziria em formas e procedimentos poéticos. A amplitude do mar, por exemplo, pode ser sentida no alumbramento com que a autora descreveu a ambientação, gerando aquele doce encanto (tão salutar ao discurso literário) de quem ver um objeto pela primeira vez. Por outro lado, o lugar lhe causava medo em virtude do mundo desconhecido que se anunciava diante de seus olhos, resultando em uma poesia marcada por tensões e indefinições. As lendas marítimas e a cultura dos pescadores também renderam a Zila um acervo de imagens bastante expressivo. Até mesmo o tema erótico foi composto segundo as características do mar, pois Zila usou as formas ondulares, o ímpeto das águas, o gemido e o movimento das ondas para falar de relações carnais. Além da temática variada, os recursos formais também são condizentes com a realidade do mar: a excessiva repetição de termos, a obra marcada por aliterações e assonâncias e o ritmo bem pontuado são tentativas de mimetizar a fisionomia desse ambiente natural. Por fim, o mar também cumpre uma função social na lírica mamediana. Embora pareça ser a projeção de uma condição intimista, ele retrata a solidão de um sujeito cada vez mais desconectado do mundo moderno.
CONCLUSÃO:
Os conhecimentos geográficos, culturais e sociais que Zila Mamede adquiriu no litoral potiguar fizeram com que o mar se transformasse em um objeto poético vivo e dinâmico dentro de sua obra; a imagem das águas marítimas, portanto, não são meras projeções de conflitos interiores, mas são antes signos carregados de sentido e expressividade. De certo modo, a tentativa de se imitar a forma e as características do mar acabou organizando a poesia de Zila Mamede, já que a ambientação natural deu-lhe as diretrizes de como compor uma lírica coerente e marcada por uma profunda experiência de vida. Não se pode perder de vista, entretanto, que o mar delineado pela a autora é uma realidade estética com leis estruturais próprias (o que explica as imagens intimistas da obra). Mas, como reflexo de uma realidade mais ampla, o mar descrito por Zila Mamede também é um tema social; nesse sentido, as águas do litoral potiguar (diversas das águas de um açude, que traduz mais fielmente a realidade do sertão ou do semiárido) apontam para aspectos sociais característicos desse espaço, como a grandeza de uma capital, a natureza das dunas etc. Conclui-se, portanto, que o mar tem a função de promover um diálogo entre a realidade social e os componentes estruturais da lírica mamediana.
Instituição de Fomento: Programa de Apoio ao Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais - Capes-REUNI
Palavras-chave: Literatura Potiguar, Zila Mamede, Mar.