62ª Reunião Anual da SBPC
F. Ciências Sociais Aplicadas - 5. Direito - 4. Direito Constitucional
FUNDAMENTOS DA JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA NO BRASIL: AS MUDANÇAS NO DESENHO INSTITUCIONAL DO PODER JUDICIÁRIO NO CONTEXTO DA REDEMOCRATIZAÇÃO.
Marcio Camargo Cunha Filho 1
Luciano da Ros 2, 3
Eduardo Kroeff Machado Carrion 1, 3
1. Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2. University of Chicago/CAPES Fulbright
3. Orientador
INTRODUÇÃO:
O fenômeno da judicialização da política, entendido como a expansão das atribuições do Poder Judiciário com potencial capacidade de intervenção sobre as instituições legislativas (Vallinder, 1995, p. 13), tem suscitado relevante debate nos âmbitos acadêmico e político de nosso país. Por um lado, argumenta-se que os tribunais estariam usurpando a competência de outros poderes, pois, atuando como legislador constitucional positivo, estariam rompendo com o princípio da separação dos poderes, criando um ilegítimo "governo dos juízes" (Duarte e Pozzolo, 2006, p. 100). Por outro lado, o Judiciário também é visto como uma instituição estatal ainda mais representativa que o Legislativo (Cappelletti, 1993, p. 92), sendo-lhe plenamente lícito tomar decisões de natureza política. Inserida nesse debate, esta pesquisa objetiva investigar os fundamentos da judicialização da política no Brasil contemporâneo, analisando especificamente suas origens. Partindo-se do pressuposto de que o incremento das atribuições do Judiciário foi vastamente instigado pela Constituição de 1988, nossa meta é compreender, analisando o contexto histórico da redemocratização, as razões que conduziram o legislador constituinte a incrementar de forma tão significativa as prerrogativas do Poder Judiciário pátrio.
METODOLOGIA:
A metodologia de trabalho foi, em um primeiro momento, a revisão de bibliografia sobre o tema central deste trabalho, particularmente no que se refere à identificação das rupturas e continuidades do sistema de judicial review brasileiro. Neste sentido, a pesquisa teve um caráter claramente interdisciplinar, analisando-se livros e artigos nacionais e estrangeiros tanto na área de Direito Constitucional quanto na área da Ciência Política. Para além da pesquisa puramente bibliográfica, lançamos mão de análise documental dos anais da Assembléia Nacional Constituinte de 1987-1988, o que nos forneceu uma ferramenta poderosa para entender os motivos que levaram o legislador constituinte a incrementar as prerrogativas do Poder Judiciário. Como forma de complementar essa abordagem, também se buscou realizar uma abordagem qualitativa do objeto por meio da realização de entrevistas com alguns dos legisladores constituintes que atuaram no período e que nos forneceram pistas a respeito do conjunto de forças políticas que acabou determinando a adoção do atual formato do Poder Judiciário.
RESULTADOS:
Diversos eventos são apontados como causas do incremento das prerrogativas do Judiciário. Werneck Vianna et alli (1997, p. 16 e ss.), por exemplo, indica que uma delas seria a necessidade de introduzir elementos de ética e de justiça no ordenamento jurídico, a qual não esteve presente nas nossas Constituições anteriores. Já Vieira (2009, p. 442) noticia que muitos analistas acreditam ser o fortalecimento do Judiciário uma exigência do sistema de mercado, que procura nos juízes a estabilidade e segurança que o legislador não os fornece. Por fim, uma influente corrente sustenta que o impressionante poder do Judiciário na Constituição de 1988, bem como em outras Constituições contemporâneas, é consequência de uma mudança de paradigma advinda das guerras mundiais, pois após esses eventos percebeu-se que era necessário consolidar Constituições que possuíssem um núcleo-duro de valores que somente poderiam ser protegidos por órgãos de natureza judicial, alheios aos tradicionais foros representativos. Nesse contexto, a discussão principal do presente trabalho é justamente a investigação de qual ou quais das causas acima teve maior influência para determinar a decisão do constituinte em aumentar consideravelmente os poderes dos juízes brasileiros, em especial dos magistrados do STF.
CONCLUSÃO:
Alguns fatores são apontados como as principais causas que levaram o constituinte a incrementar as prerrogativas do Judiciário pátrio, dando início a um amplo processo de judicialização da política no país. Primeiramente, esteve presente no Brasil, assim como nos países europeus, a necessidade de proteger determinados princípios fundamentais, proteção que somente poderia ser levada a cabo por juízes fortalecidos. No entanto, o episódio traumático que deu origem a tal necessidade não foi a segunda guerra mundial, mas sim a ditadura militar, que influenciou fortemente o constituinte no sentido de criar um judiciário forte o suficiente para amparar os direitos das minorias e as instituições democráticas. Outro fator de singular relevância foi espírito otimista, quase utópico, do constituinte, o qual refletia o sentimento geral da sociedade brasileira ao final da ditadura. Impregnado desse otimismo, o constituinte sentiu-se confiante para realizar dezenas de promessas através da Constituição, as quais, entretanto, dificilmente poderiam ser cumpridas pelos órgãos representativos tradicionais. Assim, o constituinte transferiu parte de sua responsabilidade política ao Judiciário, tornando este órgão o exemplo máximo da figura do "Guardião de Promessas", na expressão de Garapon (1996).
Palavras-chave: Origens da judicialização da política no, Assembléia Constituintes de 1987/1988, Aumento das prerrogativas do Poder Judic.