62ª Reunião Anual da SBPC
C. Ciências Biológicas - 5. Ecologia - 1. Ecologia Aplicada
PLANTAS ENFERMEIRAS E SEU POTENCIAL PARA RESTAURAÇÃO ECOLÓGICA DA CAATINGA
Gustavo Brant de Carvalho Paterno 1
Gislene Ganade 1
José Alves Siqueira Filho 2
1. Departamento de Botânica, Ecologia e Zoologia, Centro de Biociências / UFRN
2. Centro de Recuperação de Áreas Degradadas (CRAD) / Univasf
INTRODUÇÃO:
A Caatinga é um bioma que ocorre no semi-árido brasileiro, ocupando cerca de 750.000 Km², cobrindo 70% da região do nordeste e abrigando mais de 25 milhões de habitantes. Apesar de ter sido menosprezada no que diz respeito à sua biodiversidade, estudos recentes mostraram que esse bioma possui alto endemismo (380 espécies só de plantas) e uma enorme variedade fitofisionômica, comportando mais de 13 tipos vegetacionais. Por esses motivos, a biodiversidade da Caatinga se destaca quando comparada a outras regiões semi-áridas do mundo. O atual estado de conservação da Caatinga é precário, estando esta entre os três biomas mais degradados do país. Este bioma possui mais de 50% de sua área sob efeitos antrópicos e menos de 2% de sua área protegida por unidades de conservação de proteção integral, sendo que suas áreas preservadas se encontram na forma de fragmentos, geralmente menores que 10.000 Km² e isolados em ilhas. Essas características fazem da Caatinga um ecossistema extremamente ameaçado, sendo, portanto, prioritário o desenvolvimento de estudos e ações que visem sua restauração. O objetivo deste estudo foi testar a importância de interações positivas, entre espécies arbóreas, como ferramenta para a restauração ecológica de áreas degradadas da Caatinga.
METODOLOGIA:
O estudo foi conduzido no Centro de Recuperação de Áreas Degradadas (CRAD), município de Petrolina, PE. O CRAD é uma unidade de pesquisa da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF). O clima da região é semi-árido, com período chuvoso de novembro a abril e período seco de maio a outubro. Foi realizado um experimento fatorial em blocos com três tratamentos: Facilitação (perto e longe da árvore enfermeira); Espécie enfermeira (Mimosa tenuiflora, Poincianella microphylla e Cnidoscolus quercifolius) e Espécie alvo a ser facilitada (Myracrodrum urundeuva, Aspidosperma pyrifolium, Poincianella pyramidalis, Amburana cearensis e Eritrina velutina). O estudo ocorreu durante o período chuvoso, em uma parcela de 0,5 ha, com Caatinga degradada. Foram selecionados 8 indivíduos de cada espécie enfermeira e 8 áreas adjacentes com solo sem vegetação arbórea, totalizando 48 áreas. Nestas áreas foram delimitados parcelas de 3x3m com 5 subplots de 40x50cm onde foram colocadas 25 sementes de cada espécie alvo, totalizando 6000 sementes (1200 de cada espécie). Durante o período de janeiro a março foram registradas semanalmente a germinação (emissão de radícula) e o estabelecimento das plântulas (emissão de folhas). Os resultados foram analisados por ANOVA multifatorial "split-plot".
RESULTADOS:
As espécies enfermeiras tiveram um efeito extremamente significativo e positivo sobre a média de sementes germinadas e estabelecidas. Para M. tenuiflora, P. microphylla e C. quercifolius a média de sementes germinadas foi superior próximo às plantas enfermeiras do que em parcelas sem vegetação arbórea (F=10.4, p=0.014, r²=0.80; F=30.1, p=0.001, r²=0.63; F=19.3, p=0.003, r²=0.73, respectivamente, gl=1,7 para todos os testes) e o número de plântulas estabelecidas também (F=22.5, p=0.002, r²=0.82; F=7.9, p=0.026, r²=0.70 e F=53.7, p<0.001, r²=0,88, respectivamente, gl=1,7 para todos os testes). Entre as cinco espécies alvo, houve diferença significativa na germinação e no estabelecimento de plântulas (13.4 > F < 60.3, gl=4,63, p<0.001 em todos os casos), tendo P. pyramidalis apresentado germinação e estabelecimento mais expressivos, enquanto as outras espécies alvo não apresentaram diferenças entre si. Além disso, foi detectada uma interação significativa entre as espécies alvo e os níveis de facilitação (3.7> F <44.3, gl=4,63, p<0.002 para todos os casos). A interação entre esses fatores revelou que as espécies alvo respondem de forma diferenciada quando estão sob a influência de uma determinada planta enfermeira.
CONCLUSÃO:
Os resultados apresentados mostraram que as espécies M. tenuiflora, P. microphylla e C. quercifolius são plantas facilitadoras (enfermeiras) e apresentam grande potencial para a recuperação de áreas degradadas da Caatinga. Além disso, por essas espécies serem comuns em áreas degradas, seu potencial como aceleradoras do processo sucessional e de restauração ecológica se torna mais relevante e significativo. A interação sinérgica entre as espécies alvo e os níveis de facilitação demonstrou que as espécies podem responder de forma diferenciada ao efeito da facilitação. Neste sentido, a P. pyramidalis se destacou das demais por ter sido mais beneficiada pelo efeito das plantas enfermeiras. De uma maneira geral, este estudo inédito para a Caatinga, demonstrou que a restauração ecológica a partir de sementes apresenta um grande potencial e pode trazer resultados promissores e extremamente econômicos. Quando se leva em conta o preço, o tempo para produção de mudas e o gasto com água, que nas regiões semi-áridas é um recurso escasso, o uso de sementes demonstrou ser uma técnica eficiente. Futuros projetos de restauração de Caatinga utitlizando sementes devem ser desenvolvidos para que se avance o conhecimento teórico-prático de uma restauração ecológica mais barata e eficaz nesse bioma.
Instituição de Fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - Cnpq
Palavras-chave: Plantas enfermeiras, germinação, interações positivas.