62ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 7. Educação - 18. Educação
O HEROÍSMO DO BANDEIRANTE NOS LIVROS DIDÁTICOS: DO FINAL DO SÉCULO XIX AO INÍCIO DO SÉCULO XXI
Manuel Pacheco Neto 1
1. Universidade Federal da Grande Dourados
INTRODUÇÃO:
O bandeirante paulista é um personagem histórico avultado. A concepção heróica deste personagem foi amplamente disseminada pelos livros didáticos ou pelos manuais escolares. Sobre o bandeirante nos livros escolares, escreveu Monteiro: "Desbravador dos sertões incultos [...] conquistador de povos selvagens, esta figura heróica marca presença [...] nos manuais de história..." (2000, p. 105). Sobre essa mesma questão, escreveu Volpato: "Os livros didáticos, na verdade, reproduzem uma visão mítica do bandeirante" (1985, p. 17). Também acerca da figura do bandeirante herói, escreveu Moog: "... houve uma imagem que foi promovida a símbolo e isto é sumamente importante. Uma vez idealizada uma imagem e convertida em símbolo, será muito difícil deslocá-la ou substituí-la" (1985, p. 173). Sobre a dimensão deste mito, asseverou Monteiro: "Dentre os diversos mitos sobre a formação da nacionalidade brasileira, o bandeirante certamente ocupa um lugar de destaque" (1998, p. 105). Este lugar de destaque foi conferido ao bandeirante, em grande medida, pelos livros escolares. Esta pesquisa teve como objetivo investigar como a figura do bandeirante foi trabalhada pelos livros didáticos, entre 1894 e 2006, visando a averiguar as mudanças que foram ocorrendo nas abordagens, ao longo do tempo.
METODOLOGIA:
Para que levássemos a cabo este estudo que privilegia a bibliografia escolar, empreendemos uma investigação anterior, que privilegiou a leitura não apenas da ampla bibliografia - não didática - que trata do bandeirismo, como também de uma extensa documentação primária, no caso as Actas da Camara da Villa de S. Paulo, volumes I, II, III, IV e V - e o Registo Geral da Camara Municipal de S. Paulo, volumes I, II e III. Este programa de leituras formou a base elementar para a escrita dos capítulos I e II da tese, intitulados respectivamente Os primórdios de São Paulo de Piratininga e As entradas do sertão: índios, sertanistas e jesuítas. À luz destes dois capítulos iniciais, empreendemos a análise dos livros didáticos publicados entre 1894 e 2006, que configurou-se como o Capítulo III e fundamental do trabalho, intitulado O Bandeirante nos livros didáticos: de 1894 a 2006, que subdividiu-se em três partes, respectivamente intituladas O Bandeirante nos livros didáticos: de 1894 ao final da década de 1940;, O Bandeirante nos livros didáticos: da década de 1950 ao ano de 2006 e O Bandeirante: a compreensão que sobre ele ficou.
RESULTADOS:
Nos livros didáticos analisados, encontramos uma significativa quantidade de equívocos, erros e omissões respeitantes a datas, conceitos e contextos. Com o decorrer do tempo, estas ocorrências foram se tornando menos freqüentes, porém não cessaram por completo. É perceptível, por exemplo, a raridade das menções sobre o aproveitamento dos escravos índios no próprio planalto de São Paulo, configurando-se, portanto, como uma característica marcante das abordagens sobre os bandeirantes nos livros didáticos. Algumas obras nem sequer mencionam a caça ao índio com fins comerciais, restringindo-se a apontar a motivação ao desbravamento na perspectiva de encontro de minérios valiosos, bem como nas propaladas virtudes de coragem, patriotismo e heroísmo dos paulistas, que teriam adentrado o continente buscando expandir as terras da coroa portuguesa. Ao confrontar as obras didáticas com a documentação primária - Actas e Registros da Câmara dos séculos XVI e XVII - constatamos que o principal fator que impelia os Bandeirantes para o sertão era a caça ao índio, num contexto em que a mão-de-obra do homem natural da terra era considerada o remédio para a pobreza de São Paulo.
CONCLUSÃO:
A apologia ao bandeirante nos livros didáticos ocorreu desde os primeiros tempos da Proclamação da República, até o limiar do século XXI, tendo sido reiterada, sucessivamente, através das décadas que medeiam esta temporalidade. A figura do bandeirante-herói, depois de tanto tempo corroborada nas instituições escolares - pelos livros didáticos -, acabou por espraiar-se amplamente no imaginário coletivo da sociedade brasileira, estabelecendo-se no senso comum, de maneira significativa e facilmente perceptível. Mogg (1985, p. 137) escreveu: "[...] a verdade é que, a despeito [...] das imagens novas que procuram destruir as antigas, as imagens romantizadas do pioneiro e do bandeirante ainda continuam a vigorar por toda parte [...]". Após o prorromper do século XXI, imagens novas sobre os bandeirantes passaram a predominar nos livros didáticos de história. Porém, este é um processo ainda muito recente, que ainda não suplantou as imagens antigas, disseminadas na escola sobre a figura do sertanista paulista, durante mais de um século. A figura do bandeirante herói ainda continua pairando como um paradigma histórico. Os conteúdos dos arcaicos livros didáticos de capa dura, cujas páginas amarelecidas estão corroídas por traças, continuam atuais para a grande maioria dos brasileiros.
Palavras-chave: Livros didáticos, Bandeirante, Brasil Colonial.