62ª Reunião Anual da SBPC
C. Ciências Biológicas - 2. Biologia - 1. Biologia da Conservação
EFEITOS DE RUÍDOS SUBAQUÁTICOS NO COMPORTAMENTO ACÚSTICO DE Sotalia guianensis NA REGIÃO NORDESTE DO BRASIL.
Dalila Teles Leão Martins 1
Marcos Rossi Santos 1, 2
Flávio José de Lima Silva 1, 3
1. Programa de Pós Graduação em Psicobiologia, Departamento de Fisiologia - UFRN
2. Instituto Baleia Jubarte, Praia do Forte, BA
3. Departamento de Turismo, UERN - Natal/RN
INTRODUÇÃO:

Nos últimos anos, a poluição sonora causada por embarcações de turismo começam a causar sérios danos a vida marinha e alguns trabalhos relatam mudanças nas emissões sonoras de golfinhos devido os ruídos dos barcos.

O Sotalia guianensis (família Delphinidae), também conhecido como Boto-cinza, apresenta distribuição mundial desde Honduras até o estado de Santa Catarina. Por ser uma espécie de hábitats costeiros torna-se alvo de embarcações para turismo de observação e alguns trabalhos tem demonstrado o impacto sofrido por essa espécie na costa brasileira.

Esse estudo teve como objetivo caracterizar os parâmetros dos sons produzidos pelas embarcações, examinar se existe influência da presença desses ruídos sobre os sons dos botos e ainda, verificar se os ruídos antropogênicos alteram de forma diferenciada os sons emitidos pelos botos.

            Esse estudo visa então, identificar os impactos causado por embarcações de turismo sob o repertório acústico de Sotalia guianensis e propor possíveis soluções para a mitigação ou para a prevenção de danos causados aos botos, contribuindo para sua conservação, particularmente em áreas que utilizam-se dos boto-cinzas como atração turística.
METODOLOGIA:

O estudo foi realizado nas enseadas do Madeiro e Curral, pertencentes ao distrito de Pipa à aproximadamente 90Km de Natal-RN. O clima da região é tropical chuvoso com temperaturas entre 21ºC e 32ºC.

            As gravações dos sons dos botos e das embarcações ocorreram entre os meses de abril a junho de 2009. As gravações foram realizadas utilizando-se um hidrofone HTI SSQ 94 e um gravador digital M-Audio, Microtrack II Professional com taxa de amostragem de até 96kHz.    

As sessões de gravações iniciavam-se quando fosse detectada a presença de botos na área e as gravações dos ruídos das embarcações ocorriam simultaneamente aos sons dos botos. 

As gravações foram analisadas com o programa RAVEM ® 1.4. Os parâmetros calculados das emissões sonoras dos botos gritos e estalos foram frequência mínima (FMI), frequência máxima (FMA), frequência delta (FD), duração(D) e intensidade (I); para assobios verificaram-se as mesmas freqüências acima incluindo frequência inicial (FI) e frequência final (FF) e das embarcações foram FMI, FMA, FD e I.

Com o programa Statistic 7, o teste t de Student foi utilizado para examinar se existe influência dos ruídos das embarcações e a ANOVA Kruskal-Wallis para avaliar se a influência varia de acordo com o tipo do produtor do ruído.
RESULTADOS:

Os veículos utilizados para o turismo são lanchas e escunas que produzem muitos ruídos. Além desses sons, o ruído de uma bomba d'água foi registrado na área e as faixas de frequência desses ruídos sobrepõem a faixa utilizada pelos botos.

Neste estudo, foi possível verificar que as atividades com embarcações causam modificações na vocalização, com aumento considerável no número de assobios e redução dos estalos, provavelmente devido a diminuição do estado de alimentação nesses momentos. Ocorrem alterações de alguns parâmetros dos assobios (FI: t=2,42, p=0,015; FF: t= -2,22, p=0,025), gritos  (FMI: t= -3,13, p=0,001; FMA: t= -3,49, p=0,0005; FD: t= -2,21, p=0,027; D: t=2,89, p=0,004) e estalos (D: t= -3,85, p=0,0001; I: t= -5,32, p=0,0001) em presença dos ruídos. Essas modificações podem ser uma estratégia que os botos estão desenvolvendo para vencer a barreira dos sons.

Dentre os três ruídos analisados não se pode afirmar qual causa maior impacto, pois todos parecem ter a mesma parcela de importância na modificação dos assobios, mas a bomba d'água parece afetar mais durante os estalos e as embarcações durante os gritos.

Pouco se sabe sobre a sensibilidade auditiva dessa espécie, mas exposições diárias aos ruídos podem trazer danos e essa espécie pode apresentar residência.
CONCLUSÃO:

De modo geral, as faixas de frequência das embarcações são similares as faixas utilizadas pelos botos e a presença de ruídos nas áreas em que os botos permanecem influenciaram o aumento dos valores de alguns parâmetros calculados nas três categorias sonoras.

Não é possível generalizar qual o ruído causa mais impacto nos padrões de sonoros dos botos em Pipa, pois esses pareceram muito similares entre sim. Entretanto, independente da fonte, a presença desses ruídos modificam os parâmetros sonoros.

Medidas para mitigação, como normas de controle das embarcações e educação ambiental da comunidade local, barqueiros e turistas são necessárias para a conservação da espécie, visto que a população já aparenta sofrer com danos como diminuição do tempo de permanência e número de indivíduos que entram na enseada, além da aparente diminuição do forrageio.

Este trabalho contribui para o conhecimento da ecologia de Sotalia guianensis, principalmente para populações pouco estudadas quando se trata de bioacústica e suas associações comportamentais, além de revelar alguns dos impactos que as embarcações de turismo da região de Pipa têm trazido para essa população visando a conservação da espécie na região Nordeste do país.
Instituição de Fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
Palavras-chave: Sotalia guianensis, ruídos antropogênicos, Pipa/RN.